Brenda Machado
04/01/2021 11:31
Mato Grosso do Sul encerrou o ano com outro dado preocupante. De 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2020, o Estado registrou 39 casos de feminicídio.
O número representa a maior alta desde 2016, primeiro ano completo em que o crime de homicídio contra mulheres em situação de violência doméstica passou a ser contabilizado pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) de forma separada dos outros assassinatos.
A lei é de março de 2015, então não há dados desde janeiro daquele ano.
Em um período de quatro anos, o Estado já somou 163 casos de feminicídio. O segundo pior ano foi justamente 2016, quando 34 mulheres morreram vítimas de violência de gênero, e a comparação espantosa continua quando Campo Grande entra em pauta.
Em 2020, a Capital registrou o pior índice da série histórica, foram 11 feminicídios – um número correspondente a mais que o dobro de 2019.
A juíza da 3ª Vara da Violência Doméstica e Familiar de Campo Grande, Jacqueline Machado, disse que o aumento pode ser atribuído à pandemia da Covid-19, que afetou o número de casos em todo o mundo.
“Entre os motivos, estão: a falta no início [da situação de violência] de acesso à Justiça, isso quer dizer, a diminuição do transporte, a situação dos filhos estarem em casa e a dificuldade de fazer as denúncias”.
De acordo com a jurista, a alta de feminicídios também pode estar ligada à propagação dos discursos de ódio, que nasceram como resultado de todos os problemas somados da pandemia. Quando o homem sente que sua masculinidade está sendo colocada à prova, a reação tende a ser mais dura.
“Sendo o feminicídio um crime de ódio, esse discurso auxilia para que esse homem se coloque na situação de macho, já que nós falamos muito de machismo e patriarcado”.
Ainda sobre os dados, a delegada titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher de Campo Grande, Fernanda Félix, ressaltou que a morte é a consequência de uma série de “pequenos” fatores vivenciados dentro de uma relação abusiva, mas que é possível evitar que o pior aconteça agindo desde os primeiros sinais.
“O fim do ciclo é o feminicídio, o qual é plenamente evitável desde que se busque ajuda”, frisou.
Concordando, Jacqueline reforçou que, para evitar a escalada da violência, as mulheres precisam entender a importância de ir até a delegacia denunciar, inclusive, quando se trata de descumprimento de medida protetiva.
“A gente precisa dessa informação, saber como isso coloca em risco a vida da mulher, para aí tomar as outras atitudes – ou colocar a tornozeleira ou decretar a prisão preventiva. Então é preciso que [as mulheres] fiquem atentas, elas precisam ir na audiência de instrução, elas têm de prestar o depoimento, tudo para que esse homem possa vir a ser condenado pelo crime que cometeu”.
Porém, na contramão dos pedidos de socorro, a onda da Covid-19 acabou potencializando a violência doméstica em muitos casos, e o reflexo pode ser observado com base nos meses mais críticos para o número de feminicídios.
Para Campo Grande, o momento de maior alerta foi abril, mês subsequente ao começo da pandemia. Nesse intervalo, de janeiro a abril, o acumulado da Capital ficou em 3 casos. Já em relação a Mato Grosso do Sul, a taxa mais preocupante ocorreu em dezembro, período em que a pandemia atingiu o pico, com mais de mil confirmações diárias da doença.
No mês em questão, o Estado registrou 6 mortes por feminicídio.
Diante da triste realidade, o histórico de cada caso aponta que na maioria das vezes os agressores são ex-esposos, namorados ou companheiros da vítima e sempre com a mesma motivação: ciúmes ou recusa em aceitar o fim do relacionamento.
Fernanda Félix reforça que “homens e mulheres devem respeitar as vontades um do outro. Se trata de uma quebra do paradigma do machismo”.