Cidades

Questão indígena

'Não queremos o Brasil inteiro como terra indígena', diz kaiowá de MS que foi ao Parlamento Europeu

Inayê Lopes Kaiowa e Josiel Machado Gurani estiveram no Parlamento Europeu: "Os senadores não aceitam nem respeitam os povos originários, mas vão ter de nos engolir porque não vamos parar de lutar", disse Inayê

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Há dez dias na Europa para denunciar omissões do Estado brasileiro em relação aos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, a kaiowá Inayê Lopes e o guarani Josiel Machado assistiram a uma reviravolta em relação à principal bandeira dos povos originários hoje no país: a questão do marco temporal.

“Violência, desmatamento, ataque, massacre, demarcação de terra, despejo”, enumerou Inayê ao microfone diante de eurodeputados, em Bruxelas (Bélgica), sobre a situação em Mato Grosso do Sul, pouco antes de se emocionar com a votação no STF (Supremo Tribunal Federal) que rejeitou a tese do marco temporal, considerada inconstitucional por 9 dos 11 ministros da corte.

A tese determina que as terras indígenas devem se restringir a áreas ocupadas pelos povos quando a Constituição de 1988 foi promulgada.

“Acompanhamos a votação de longe e ficamos muito felizes de vencer a primeira batalha”, conta Inayê. “Mas, infelizmente, a comemoração foi em vão porque, do outro lado [no Senado], ressuscitaram o marco temporal, que é um projeto genocida para os povos indígenas. Fiquei indignada com os senadores”, desabafa ela, já em Genebra.

“Não queremos o Brasil inteiro como terra indígena. Queremos apenas nossos territórios tradicionais porque já estávamos aqui quando os colonizadores chegaram e estamos há 523 anos lutando para sobreviver”, afirma Inayê.

Na última quarta-feira (27), mesmo dia em que o STF concluiu o julgamento do marco temporal, o Senado aprovou, em votação expressa, o texto-base da proposta do marco temporal das terras indígenas por 43 votos a 21, numa reação dos senadores ao julgamento no Supremo.

“Os políticos só pensam na economia e no dinheiro, não pensam em bem-estar. Eu, que sou historiadora e nasci junto com a Constituição, fico indignada. A Constituição garantiu, em seus artigos 231 e 232, nosso direito aos territórios tradicionais, mas isso nunca foi cumprido”, avalia Inayê.

Apesar de ter comemorado a decisão do Supremo, a kaiowá é crítica à proposta de indenização dos latifundiários por terras indígenas supostamente adquiridas de boa fé. “A gente se pergunta porque indenizar quem enriqueceu com o nosso território sem indenizar famílias que tiveram gente assassinada por fazendeiros nunca punidos”, questiona.

Ela se refere aos 795 assassinatos de indígenas ocorridos nos últimos quatro anos, segundo levantamento do Cimi (Conselho Indígena Missionário), em contexto de conflitos fundiários em torno de terras indígenas no país. Os povos guarani e kaiowá de Mato Grosso do Sul estão entre as principais vítimas dessas mortes, e o estado também concentra as maiores taxas de suicídio entre indígenas do país.

Atualmente no Brasil, 62% das terras indígenas e reivindicações territoriais existentes estão pendentes de regularização administrativa, ou seja, de demarcação e sua homologação.

Para buscar pacificar os conflitos por terras e proteger os indígenas de Mato Grosso do Sul, o Ministério dos Povos Indígenas criou nesta semana um gabinete de crise dedicado aos povos guarani e kaiowá do estado.

Os encontros das lideranças guarani e kaiowá com integrantes do Parlamento Europeu teve o objetivo de exigir da União Europeia (UE) coerência entre as ações de política externa e de política comercial do bloco, em especial no âmbito do acordo entre a UE e o Mercosul. “Eles [europeus] não podem comprar o que é produzido em terras indígenas invadidas”, afirma a líder kaiowá, que é vereadora na cidade de Antônio João (MS).

Aos eurodeputados ela denunciou também os danos causados pelo intenso uso de agrotóxicos produzidos por empresas europeias, mas proibidos de serem utilizados na própria UE.

Segundo os líderes indígenas, além de contaminar o solo e as águas dos rios da região, afetando a saúde de suas populações, os produtos são utilizados como arma química por alguns grupos que ocupam territórios indígenas.

Inayê e Josuel pediram ainda medidas concretas de apoio à garantia de direitos dos povos indígenas brasileiros, a começar pela questão fundiária, que se tornou saliente nos debates multilaterais num contexto de crise climática.

A dupla também teve encontros com o relator especial da ONU para o direito à alimentação, Michael Fakhri, e com o relator sobre os direitos dos povos indígenas, José Francisco Cali Tzay, que condenou a movimentação do Senado durante sua apresentação à Comissão de Direitos Humanos da ONU.

Segundo ele, a questão do marco temporal extrapola o debate fundiário e indígena do Brasil. “Isso é para toda a humanidade.”

“Os senadores não aceitam nem respeitam os povos originários, mas vão ter de nos engolir porque não vamos parar de lutar”, disse Inayê.

Ela e o líder guarani, que juntos representam a Grande Assembleia Guarani e Kaiowá (Aty Guasu), foram acompanhados nesta viagem pela FIAN (Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas) e pelo Cimi. A comitiva também participou da 54ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, e da análise do Brasil pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

“As denúncias que vim fazer aqui dão medo na gente, mas sou uma mulher corajosa para enfrentar tudo isso”, disse. “Alguém precisa falar por nós.”

 

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Cidades

Projeto de lei quer converter multas de trânsito em doação de sangue e medula

Infrator que optar pela doação não pagará multa, mas outras sanções podem ser mantidas, como pontos na CNH

19/12/2025 18h00

Multas leves de trânsito poderão ser convertidas em doação voluntária de sangue ou medula

Multas leves de trânsito poderão ser convertidas em doação voluntária de sangue ou medula Foto: Arquivo

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Um projeto de lei protocolado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (Alems) propõe converter multas aplicadas no trânsito, relativas a infrações de natureza leve, em doação voluntária de sangue ou medula óssea. Como a Casa está em recesso, a matéria tramitará no ano que vem.

Conforme a proposta, de autoria do deputado estadual Junior Mochi, a conversão do pagamento das multas em doação de sangue ou medula teria caráter alternativo e facultativo, não constituindo direito subjetivo do infrator, e deverá ser expressamente requerida pelo interessado, nos termos de posterior regulamentação.

Ainda conforme o projeto, a conversão da multa em doação somente será admitida quando:

  • a infração for de natureza leve, nos termos do Código de Trânsito Brasileiro;
  • não houver reincidência da mesma infração no período de 12 meses;
  • a multa não decorrer de infração que tenha colocado em risco a segurança viária, a vida ou a integridade física de terceiros;
  • a doação seja realizada em hemocentros públicos ou privados conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS), ou em instituições oficialmente reconhecidas;
  • haja aptidão médica do doador, conforme critérios técnicos estabelecidos pelo Ministério da Saúde.

Cada doação de sangue corresponderá a conversão de uma multa de trânsito, assim como a inscrição no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome).

Caso o doador seja compatível com alguma pessoa precisando de transplante e faça a doação efetiva da medula óssea, poderá ser convertida até duas multas de trânsito.

A comprovação da doação ou da inscrição no Redome será realizada mediante apresentação de documento oficial emitido pela instituição responsável, observado o prazo e os procedimentos definidos em regulamento

O projeto veda a compensação parcial da multa, bem como a conversão de penalidades acessórias, como suspensão ou cassação do direito de dirigir.

A conversão será apenas relacionada ao pagamento da multa, mas não exime o infrator das demais obrigações legais decorrentes da infração de trânsito, inclusive quanto ao registro de pontos na Carteira
Nacional de Habilitação (CNH), quando aplicável.

O Poder Executivo poderá celebrar convênios e parcerias com municípios, hemocentros e instituições de saúde, com vistas à operacionalização da lei, caso seja aprovada e sancionada.

Objetivos

Na justificativa do projeto, o deputado afirma que o objetivo é conciliar o caráter educativo das sanções
administrativas de trânsito com políticas públicas de incentivo à doação voluntária de sangue e de medula óssea, "práticas essenciais à manutenção da vida e à efetividade do Sistema Único de Saúde".

"A proposta não elimina a penalidade, mas a ressignifica, convertendo-a em uma ação de relevante interesse social, capaz de estimular a solidariedade, a cidadania e a responsabilidade coletiva. Trata-se de medida alinhada aos princípios da dignidade da pessoa humana, da função social das sanções administrativas e da eficiência das políticas públicas, diz a justificativa.

Em caso de aprovação e sanção, a adesão pelos municípios será facultativa, preservando o pacto federativo.

"Ressalte-se que a iniciativa respeita a autonomia municipal e o Código de Trânsito Brasileiro, limitando-se às infrações leves e excluindo aquelas que representem risco à segurança viária. A adesão pelos Municípios é facultativa, preservando-se o pacto federativo", conclui o texto.

Campo Grande

Investigada por desvio recebeu R$ 1,7 milhão para iluminar "Cidade do Natal"

Construtora JCL venceu licitação há dois meses e será responsável pela decoração natalina da Capital

19/12/2025 17h50

Foto: Gerson Oliveira / Correio do Estado

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Investigada em operação que apura suspeitas de fraudes em licitações e contratos de iluminação pública em Campo Grande, a Construtora JCL Ltda. venceu há dois meses a disputa para iluminar a decoração natalina da Capital neste ano, orçamento de R$ 1,7 milhão.

Conforme o Portal da Transparência, a empresa será responsável por fornecer, instalar e desinstalar a decoração natalina na Capital, contrato firmado no dia 17 de novembro e que expira no dia 15 de fevereiro. 

Conforme o edital, a iluminação abarca trechos da Rua 14 de Julho, Avenida Afonso Pena local de apresentações culturais, gastronomia e lazer. Para a decoração natalina está prevista a instalação de mangueiras luminosas de led branco quente (âmbar), verde e azuis pelas avenidas Afonso Pena, Duque de Caxias e Mato Grosso.

Na 14 de Julho, a decoração possui flâmulas natalinas, bolas metálicas iluminadas, árvores naturais de porte médio, árvores em formato de cone, anjo iluminado e pórticos metálicos.

As luzes foram acesas no dia 1º de dezembro deste ano, com desligamento previsto para o dia 15 de janeiro de 2026, datas que, conforme contrato, podem ser adiadas ou antecipadas.

De acordo com a prefeitura, a iluminação decorativa natalina tem como objetivo "trazer o espírito natalino para as ruas, praças e avenidas da Capital, aliando beleza, lazer e sentimento de pertencimento urbano".

Iluminação natalina

A Praça Ary Coelho também foi decorada com os portais de entrada até o coreto, além de iluminação nas árvores naturais.

Complementam a decoração em outras vias estrelas dos mais variados tamanhos, árvores de arabesco, cometas, botas, bicicletas, pirâmides e pórticos, entre outros.

Além dessas, receberão decoração as rotatórias da Ceará com Joaquim Murtinho; Duque de Caxias com a Entrada da Nova Campo Grande; da João Arinos com Pedrossian; Três Barras com Marques de Lavradio; Consul Assaf Trad com Zulmira Borba; Gury Marques na rotatória da Coca-Cola; Filinto Muller no Lago do Amor; dentre outras. A iluminação compreende ainda o Paço Municipal.

 

Contradição

A assinatura do contrato entre a prefeitura e a construtora contraria uma lei sancionada pelo próprio Executivo em agosto deste ano, que detinha o objetivo reduzir gastos e otimizar recursos públicos.

A Lei 7.464/25, sancionada em 4 de agosto, previa que a iluminação e ornamentação natalina em espaços públicos fosse patrocionada por empresas privadas, sem custos para a Prefeitura.

Conforme a lei, as empresas interessadas em iluminar a "Cidade do Natal" em troca, poderiam divulgar suas marcas nos locais iluminados. O programa "Natal de Luz", inserido na lei, tem vigência anual, entre 1º de novembro e 10 de janeiro. 

*Colaborou João Pedro Flores

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