Agentes da Polícia Civil precisaram arrecadar dinheiro para alimentar detentos em Pedro Gomes, no interior do estado, caso confirmado pela Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul.
A constatação se deu após denúncia junto ao Sistema Penitenciário (Nuspen) e de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (Nudedh) da Defensoria, após mobilização policial para levar comida aos presos que não possuíam família no município. “Havia situações, porém, que o preso não tinha familiares na localidade ou havia recusa da família. Em tais casos, os policiais faziam arrecadação ou contavam com doações”, frisou o defensor. Cabe destacar que a alimentação dos presos é de responsabilidade do estado.
Interditado desde 2017, o espaço recebe homens e mulheres presos em flagrante ou em cumprimento de mandado de prisão. “A privação de alimentação, direito fundamental, é tortura. Não podemos aceitar que pessoas sob custódia do Estado sejam submetidas a essa condição desumana”, protestou o defensor público Stebbin Athaides Roberto da Silva, que conduz o caso.
Como providência, a Defensoria firmou um acordo extrajudicial com a prefeitura municipal, já homologado pela Justiça, para prestação de assistência emergencial e temporária, na qual o município fornece cinco almoços para cada pessoa, visto que, de acordo com a defensoria, geralmente, ninguém fica mais do que esse período na cadeia, “já que permanecem por um tempo curto, ou seja, até que uma decisão judicial seja proferida.” Conforme o defensor, “a atuação do município, louvável e necessária, não pode ser interpretada como transferência de responsabilidade, que é do Estado de MS”.
A pasta enviou ofícios às secretarias estaduais de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) e de Assistência Social e dos Direitos Humanos (Sead) e cobrou uma solução do caso.
Para Silva, os pratos vazios mostram a “falência” do sistema carcerário em Mato Grosso do Sul e escancaram que políticas públicas voltadas ao atendimento das pessoas encarceradas são negligenciadas porque “não geram visibilidade política”. “Os direitos humanos não podem ser tratados como questões de segunda categoria”, disse o defensor.
Enquanto aguarda uma devolutiva do governo, a Defensoria Pública também tenta reativar o Conselho da Comunidade de Pedro Gomes para ganhar mais força na solução da falta de alimentos na cadeia, já que o órgão da sociedade civil consegue interceder pelos custodiados na procura por recursos e políticas públicas de atendimento adequado a eles.
Interdição
A Cadeia Pública de Pedro Gomes foi interditada em 2017 pelo juiz Francisco Soliman, A decisão foi dada numa ação civil pública movida pelo MPE (Ministério Público Estadual).
Só podem ocupar a cadeia os presos em flagrante delito, até a apresentação à autoridade judiciária para audiência de custódia, e os adolescentes apreendidos em flagrante de ato infracional, até o prazo máximo estabelecido pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

Para pedir a interdição da Cadeia Pública, o MPE se baseou na Convenção Americana de Direitos Humanos que diz: "Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano".
Na decisão, o juiz enfatizou que com o passar do tempo a situação do local tem piorado, pois nenhuma providência foi tomada pelo governo do Estado.
“A precariedade estrutural da carceragem é fato notório e de conhecimento das autoridades públicas relacionadas à seara criminal, de modo que os documentos que instruíram a inicial somente reforçaram a compreensão já existente, e que não era recente”, escreveu Soliman.
Segundo a decisão, o estado de conservação e a forma das instalações elétricas acarretavam inegável risco de incêndio na carceragem, além de infiltração, risco de desmoronamento das paredes e vazamentos. O espaço foi interditado com as cercas elétricas danificadas e arames como instrumento para serragem das barras de contenção, o que, segundo a decisão, facilitaria a fuga de presos.
Ao longo de 2016, o fornecimento de alimentação aos presos também foi suspenso por falta de pagamento. A reportagem buscou contato com o prefeito Delegado Murilo (PL), entretanto, não obteve retorno.


