Mais uma pessoa morreu nesta sexta-feira (5) num acidente envolvendo anta na MS-040, entre Campo Grande e Santa Rita do Pardo. Agora, já são seis as mortes de pessoas nesta mesma rodovia desde que os últimos 210 quilômetros foram asfaltados, no final de 2014.
A vítima desta vez foi José Augusto Croneis, de 65 anos, que estava numa caminhonete com outros três turistas da pesca que retornavam de Miranda para o Estado de São Paulo. Os demais ocupantes da Hilux sofreram ferimentos e tiveram de receber atendimento na Santa Casa de Campo Grande, já que o veículo capotou várias vezes depois de atingir o animal.
O acidente de ontem, de acordo com a assessoria de imprensa da Agesul, foi o décimo terceiro caso de colisão entre veículo e anta nesta rodovia somente em 2023, conforme dados do projeto Estrada Viva.
A informação de que já são seis as mortes nesta estrada é de Patricia Medici, doutora em Manejo de Biodiversidade e coordenadora da Iniciativa Nacional para Conservação da Anta Brasileira (INCAB).
Ela monitora a estrada desde março de 2015, três meses depois da inauguração. E, de acordo com ela, não existe registro exato de pessoas feridas e nem de possíveis mortes ocorridas em hospitais. Mas, além das mortes, são dezenas de pessoas que sofreram ferimentos nos incontáveis acidentes que já ocorreram nesta rodovia.
E, de acordo com os registros da doutora, desde o dia em que o monitoramento começou até esta semana, 206 carcaças de antas foram encontradas à beira da estrada, todas mortas por atropelamentos. “É uma média de 30 animais só dessa espécie mortos por ano”, explica. Então, se somente nos primeiros quatro meses do ano já são 13 registros, a tendência é de que a média de 30 casos por ano seja superada em 2023.
Mas o número de mortes é bem maior que 206, afirma ela. Tem muitos animais que são levados embora pelas pessoas que atropelam ou que são removidos pelos gestores da rodovia. Tem ainda aqueles que são atingidos, continuam andando e acabam morrendo longe da estrada, no meio das fazendas. Estas mortes acabam não sendo catalogadas, explica.
De acordo com o tenente-coronel Edmilson Queiroz, da Polícia Militar Ambiental (PMA), a maior parte dos acidentes acontece no começo da manhã e no fim da tarde, horário em que as antas andam em busca de alimento e que os usuários da estrada precisam tomar mais cuidado.
De acordo com ele, na MS-040 existe uma série de sinalizações, inclusive sinais sonoros no asfalto, alertando motoristas para que tenham cuidado e para que reduzam a velocidade. Estes avisos fazem parte do projeto “Estrada Viva”, que monitora outras cinco rodovias no Estado nas quais acidentes com animais são frequentes.
“Eu ando muito nesta estrada. À noite ou nos horários críticos, só dirijo a 90 ou 100 por hora porque não quero colocar a vida da minha família em risco”, afirma o policial. A doutora, porém, já tem outra visão. Para ela, “o ônus da responsabilidade pelas mortes, tanto de animais quanto de pessoas, não deve ser atribuída ao motorista, mas ao gestor da estrada, que no caso é a Agesul”.
E, de acordo com ela, desde 2016 existe um projeto nas mãos do governo do Estado apontando o que deveria ser feito para mitigar o problema. Ao longo dos 210 quilômetros existem pelo menos 50 passagens sob a rodovia, muitas delas feitas por fazendeiros que precisam levar o gado de um lado para outro. Estas passagens já são utilizadas por muitos animais silvestres, conforme monitoramento feito pelo INCAB.
O Instituto sugere que a Agesul instale gradio reforçado ao longo de 500 metros de cada lado destas passagens subterrâneas e nos dois lados da pista. Além disso que faça uma espécie de corredor em alguns locais para que as antas sejam conduzidas a utilizarem estas passagens. Se isso não for feito, pessoas vão continuar morrendo, sentencia a doutora.
Esse projeto Estrada Viva, segundo ela, “é uma vitrine da Agesul, apenas para dizer que algo está sendo feito. Estão instalando umas cerquinhas, de tela de galinheiro, que não seguram nem uma mosca, quanto mais uma anta. Estão fazendo isso para tirar fotos, para postar nas mídias sociais e levar nas reuniões. Essas medidas não vão fazer nem cócegas para a solução deste problema gravíssimo”, critica a estudiosa.
Numa tentativa para forçar o poder público a adotar medidas mais efetivas, o Instituto já apelou até ao judiciário, mas sete anos depois o inquérito civil número 06.2016. 00000716 6 e a ação civil pública 0900340-76.2018.8.12.0001 estão guardados em alguma gaveta à espera de decisão judicial.
PROBLEMA AMPLO
Não é só na MS-040 que ocorrem os acidente envolvendo antas. Patricia Medici lembra que o caso mais grave em Mato Grosso do Sul aconteceu na BR-267 (que é paralela da MS-040), no dia 3 de setembro de 2015.
Naquele dia, uma van retornava de Campo Grande para Nova Andradina e após bater numa anta atingiu uma carreta que vinha no sentido contrário, pegou fogo e oito pessoas acabaram morrendo. Somente uma mulher, que foi arremessada da van, sobreviveu. O caminhoneiro também saiu com vida.
De 2013 até o fim do ano passado, de acordo com Patricia, cerca de 40 pessoas morreram em acidentes envolvendo animais silvestres em 34 rodovias de Mato Grosso do Sul. Contudo, a estrada com maior frequência de casos graves (excluindo o acidente com 8 mortes da BR-267) e que precisa de intervenção com urgência, é a 040, de acordo com ela.
Para o policial ambiental Edmilson Queiroz, os atropelamentos de animais são uma espécie de “conflito bom, pois isso mostra que nossa fauna está saudável. Só existem tantos registros de atropelamentos de onças, antas, capivaras, quatis e outras espécies porque temos grande quantidade de animais na natureza”, diz.