Foi tamanha a polarização criada entre Fernanda Torres e a espanhola Karla Sofía Gascón na disputa pela estatueta de Melhor Atriz que muita gente passou batido pelas duas outras indicações que “Ainda Estou Aqui” recebeu no Oscar 2025 – as de Melhor Filme e Melhor Filme Estrangeiro. E foi justamente nessa última categoria, a que reconhece as produções estrangeiras, que o longa-metragem dirigido por Walter Salles Jr., com Fernanda e Selton Mello nos papéis principais, que o Brasil se deu bem. Isso mesmo, o Brasil.
O clima de Copa do Mundo tomou conta de várias cidades do País, em pleno Carnaval, horas antes da cerimônia de premiação, transmitida a partir das 20h de domingo, diretamente de Los Angeles, com telões em bares (Capivas, Pizza Pub, Copo, Quiçá, etc.) e também no coração da folia de Campo Grande, onde o camarote Ponto Beats montou uma estrutura para o público da festa acompanhar a 97ª edição do Oscar. Os mais eufóricos se manifestavam ante qualquer menção a “Emilia Pérez”, que obteve 13 indicações.
O filme do francês Jacques Audiard tem elenco encabeçado por Karla Sofía, primeira atriz trans a receber uma indicação, e o desgaste enfrentado pela intérprete, por conta de antigas postagens nas redes sociais, gerou um ambiente de arrivismo na torcida brasileira, que contaminou, como um todo, a recepção de “Emilia Pérez”. Nem precisava tanto. “Ainda Estou Aqui” é muito mais filme que seu principal concorrente direto. Outras produções que estavam na disputa, como “A Semente do Fruto Sagrado”, têm potência maior.
O fato é que, com o seu primeiro Oscar, a cinematografia brasileira quebra um tabu de oito décadas, se contarmos desde a primeira vez, em 1945, que um brasileiro concorreu – Ary Barroso (1903-1964), com a canção original de uma produção norte-americana. E, sim, para além da celebração mais imediata ou do nariz torcido de quem considera a láurea uma “alienação colonizadora”, o prêmio deve ser visto como um divisor de águas que pode fazer o audiovisual produzido aqui alçar novos voos.
Pois é de negócios, sobretudo, que se trata – aliás, tanto nessa indústria como em qualquer outra. E na chave do melodrama social, gênero no qual Walter Salles Jr. vem reiterando a sua competência, o filme brasileiro tocou o mundo e a Academia. Alinhavando a história (real) da família Paiva com os descaminhos perpetrados pelo aparelho repressor da ditadura, o enredo conjugou sentimento e denúncia de modo cativante e universal, dentro da sobriedade e comedimento que caracteriza o diretor.
O longa custou entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões e já arrecadou, pelo mundo, R$ 265 milhões. Chegou a estar em cartaz, em um único fim de semana, em 762 salas dos EUA. Um belo produto que vende bem o cinema brasileiro, tendo uma excelente atriz na condução da trama. Não é pouca coisa. Hora de olhar para dentro e apurar as outras riquezas que a diversificada produção nacional já vem mostrando ao mundo. Um Oscar na estante consolida esse status e muda posição do País no jogo de forças da indústria do cinema.

Estener Ananias de Carvalho e Renata dos Santos Araújo de Carvalho
Anderson Varejão, Luiz Fruet e Aylton Tesch


