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ARTES CÊNICAS

Versão teatral de "Dom Casmurro" transcende o dilema do adultério

Versão teatral de "Dom Casmurro" transcende o dilema do adultério feminino e propõe atualizações a partir de questões identitárias e de gênero; a atriz e diretora Lígia Prieto fala sobre a experiência de adaptar o clássico de Machado de Assis

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A partir de 1861, com “Hoje Avental, Amanhã Luva” e “Desencantos”, Machado de Assis (1839-1908), aos 22 anos, ainda sem a celebridade de seus contos e romances, mas já com uma certa moral enquanto cronista e ensaísta, aventurou-se pela dramaturgia teatral.

Suas escritas para os palcos somam 13 peças, quase todas criadas até 1866, e, desde sempre, são consideradas a parte medíocre de sua lavra, inferior até mesmo aos poemas legados pelo bruxo do Cosme Velho. Já a prosa do autor é um banho de talento, argúcia e reinvenção praticamente de ponta a ponta.

E, no topo da vitrine estrelada do autor, que superou a origem pobre, o preconceito racial e a epilepsia, está “Dom Casmurro” (1900), que rivaliza com “Memórias Póstumas de Brás Cubas” (1881) pelo posto de maior romance de Machado e, há quem diga, de toda a literatura brasileira.

Com o ciúme doentio de Bentinho e os “os olhos de cigana oblíqua e dissimulada” de Capitu, o escritor forja passaporte para viajar, uma vez mais, na sua profunda observação da natureza humana, amealhando referências mil que vão de Goethe a Shakespeare.

Do bardo inglês, é “Otelo” quem lhe inflama a inspiração; aliás, melhor dizendo, caberia a Iago, alferes do personagem mouro que dá nome à peça, o papel de magnetizar o eu lírico de Bento de Albuquerque

Santiago, o advogado carioca de 54 anos que, em primeira pessoa, narra as agruras por que vai passando por fortuna da dúvida cruel em torno do suposto adultério da amada.

O tempo narrativo é psicológico, há recuos autobiográficos do personagem que não impedem divisar com certa facilidade e em blocos a trajetória de Bentinho.

A eficiência no psiquismo, na metalinguagem e na crítica social fazem de “Dom Casmurro” um ponto alto da literatura realista, com tradução para, pelo menos, outros 15 idiomas desde os anos 1930 e exitosas versões para o cinema, para HQs e para o teatro.

Na entrevista a seguir ao Correio do Estado, a atriz e diretora Lígia Prieto fala sobre a experiência de encenar “Dom Casmurro” sob a patente do Grupo Casa, que a artista pilota ao lado de Kelly Figueiredo.

Com apenas dois atores em cena, os paulistas Amanda Pessoa e Antônio Júnior, a peça traz Lígia sem aparecer no palco, mas com duplo crédito na montagem.

Além da direção, é ela quem também assina a adaptação do texto original, que pôde ser vista em três sessões no Sesc Cultura na semana passada. E que atualiza a sofisticada mordacidade machadiana com dilemas bem contemporâneos e tão ou mais cruéis na vigência da pauta atual, a exemplo das questões raciais e de gênero.

Por que levar “Dom Casmurro” ao teatro em 2022?

Embora tenha sido escrito em 1899, o texto é absurdamente atual. Infelizmente. Por demérito da sociedade e por mérito da genialidade de Machado.

Trazer a literatura realista para a cena é um prazer, é uma ampliação do cotidiano que nos atravessa e, como um espelho, nos mostra nossos abismos. Pode ser que por essas questões ele tenha tido uma recepção tão boa no Festival Fema (SP), conquistando o prêmio de melhor espetáculo.

Quais características e temas destacaria no texto?

A relação principal entre Bentinho e Capitu, sem dúvida, é o que mais nos grita, a objetificação dessa mulher livre que vai sendo destruída durante a história. E o que a gente amplia mais ainda na nossa versão também são os questionamentos sobre o racismo.

Nesse ponto, trazemos para a cena a realidade própria de Machado, neto de escravos alforriados, contrapondo a própria cena ficcional com dados documentais do escritor.

Como se deu a adaptação para a dramaturgia teatral?

Eu gosto muito de adaptar a literatura brasileira. Já adaptei “Vidas Secas” [romance de 1938 de Graciliano Ramos], “O Alienista” [conto de Machado de 1882] e agora “Dom Casmurro”. Tem uma característica específica nesses romances, eles são muito detalhados.

Os autores brasileiros são impecáveis nesse ponto, o que facilita a construção da cena teatral. É como se levantássemos as personagens e conversássemos com elas. É muito pontual, nessa adaptação temos um enxerto de textos de [Anton] Tchekhov [1860-1904] e também de anúncios de vendas de escravos do mesmo período da escrita do texto.

Nesses termos, qual a aresta eventualmente mais trabalhosa ou desafiadora na passagem da página para o proscênio?

Muito, a teatralidade específica da cena, essa explosão do cotidiano. A literatura realista é um roteiro de novela pronto. Agora, acredito que a diferença está nessa ampliação desse cotidiano para que nos convida o teatro.

Poderia comentar o que vocês chamam de “diálogo aberto e direto do elenco com os caminhos dos personagens e com a plateia”? 

Visto que trazemos também fatos reais e dados do mesmo período da história e da escrita do autor, o elenco apresenta textos diretos para a plateia, como pequenas pílulas de informações que conduzem a história principal.

Os personagens [do romance] quase todos estão ali. Embora sejam somente dois atores em cena, eles se misturam fazendo várias personagens, é uma brincadeira que funciona bem e, por incrível que pareça, a plateia não se perde, a história segue conduzida para o fim trágico de “Dom Casmurro”.

Como o elenco e toda a equipe lidaram com o processo criativo?

Inicialmente à distância total. O espetáculo tem música ao vivo, e quando aconteceu a estreia, em 2020, eu acabei não conseguindo estar presencial por conta da pandemia.

Agora, estamos retomando o espetáculo e amarrando de vez ele no repertório do Grupo Casa. O texto é delicado e forte. É emocionante fazer parte.

O elenco principalmente, a cada passo do processo, encontra um novo lugar de leitura dessa obra que já lemos há tanto tempo. Conseguimos tirar muitos questionamentos dessa história e trazemos diretamente para as nossas vidas e o nosso dia a dia.

Quando começaram o projeto da peça?

Foi escrito em outubro de 2020, e em novembro de 2020 já foi premiado na sua apresentação de estreia. Dois anos depois, estamos olhando para ele com desejo de um novo nascimento, com vida longa e uma estrada carinhosa.

E quanto ao teu envolvimento pessoal com a obra de Machado?

Eu sou encantada por Machado. Quando o Antônio Junior me convidou para escrevê-lo, eu reli e chorei outra vez. Todas as vezes que o li na vida, eu chorei. Sinto raiva do caminho de Capitu, odeio Bentinho.

Acho cruel e real demais, a cada contato com a obra, me arranca um pedaço por ser mulher.

Como vê a narrativa do romance e de outras formas literárias ao ser apropriada pelos elementos expressivos da cena teatral?

Acho incrível. Eu gosto muito da palavra “ampliação”, se pudéssemos ampliar o cotidiano, o que teríamos?

Acredito que essa é uma proposta do teatro, e qualquer gênero literário cabe nessa brincadeira, causando um estranhamento da obra e uma possibilidade para outros questionamentos e criação de pensamentos.

A arte faz o povo pensar. E trazer histórias tão bem contadas para diferentes gêneros artísticos amplia a possibilidade de chegar em pessoas diferentes, em lugares diferentes, de formas diferentes que vão acessar lugares diferentes de cada um.

Você pode ler o livro, causará algumas sensações. Ao ver a peça, terá outras, que se misturam à existência e à força do elenco, que nesse espetáculo é formado por maravilhosos intérpretes.

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Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana Neiva

A atriz está a frente do programa Quero Ser Veg

09/02/2025 19h00

Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana Neiva

Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana Neiva Foto: Divulgação

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Mayana Neiva é atriz. Nascida na Paraíba, foi morar nos EUA durante a adolescência, quando descobriu a vocação para o teatro. No retorno ao Brasil, passou por concursos de beleza, eleita Miss Paraíba em 2003. Depois, migrou para São Paulo com o objetivo de se dedicar à vida artística.

Após participar de grupos de teatro, recebeu o convite para estrear na TV na minissérie A Pedra do Reino (2007), na Globo. Em seguida, fez Queridos Amigos (2008) e seu primeiro papel em novelas, a modelo Desirée de Ti Ti Ti (2010). Formada em Filosofia, também lançou o livro Sofia, de cunho infantil, em 2009.

Seguiu na emissora (TV Globo) com papéis em Amor Eterno Amor (2012), Sangue Bom (2013), O Outro Lado do Paraíso (2017), Éramos Seis (2019), entre outros títulos. Também dedicou-se a trabalhos no cinema e no teatro.

Ela estreou em 25 de janeiro a série Quero ser veg, a primeira a discutir o veganismo em televisão aberta. A série apresenta cinco episódios sobre o veganismo e os mitos relativos à alimentação baseada totalmente em vegetais e que já faz parte da vida de cerca de 10 milhões de brasileiros, segundo Associação Brasileira de Veganismo. O público pode assistir à série aos sábados, às 12h30.

Mayana é a Capa exclusiva do Correio B+ desta semana, e em entrevista ao Caderno ela fala da experiência como apresentadora, do programa Quero Ser Veg, novelas e autocuidado.

Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana NeivaA atriz Mayana Neiva é Capa exclusiva do Correio B+ desta semana - Foto: Henrique Rezende - Diagramação: Denis Felipe - Por Flávia Viana

CE - Como surgiu o convite para o programa Quero Ser Veg? E como foi pra você estar no comando de um programa na TV aberta? 
MN -
Recebi o convite da diretora Cíntia Domit Bittar, que é uma querida amiga. Já fizemos alguns trabalhos juntas, e é uma grande honra estar à frente do primeiro programa sobre veganismo da TV Aberta Brasileira, levando essa escolha consciente, da alimentação consciente para o público, ainda mais uma TV pública, que chega para todas as pessoas de maneira gratuita.

O programa está muito divertido, amoroso, faz um convite para a gente repensar as nossas escolhas diárias, e não necessariamente só para você se tornar vegano. Você pode, por exemplo, escolher fazer uma refeição vegana por dia, ou uma por semana, isso já terá um impacto no planeta muito grande.

CE - O veganismo já faz parte do seu estilo de vida? O que o programa mudou na sua forma de pensar?
MN -
Essa é uma das razões pelas quais eu fui convidada para apresentar o programa. Eu tive uma vivência dentro do vegetarianismo e minha alimentação é majoritariamente dentro do vegetarianismo. Mas eu gosto de comer peixe, por exemplo, e uma das coisas que o programa discute é pra gente repensar fazer uma refeição sem proteína animal no dia, ou experimentar outros sabores, outras culinárias, que não tenham a proteína animal como centro do prato.

A Cintia quis me convidar porque sentia que tinha uma experiência que era próxima da pessoa que estava assistindo, alguém que talvez tenha o desejo, tanto que o programa chama Quero Ser Veg. Ter o o desejo e se dispor a experimentar aquilo, partindo desse pressuposto.

Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana NeivaQuero Ser Veg - Divulgação

CE - Já existe alguma previsão para uma nova temporada? E outros projetos para a televisão, o que podemos esperar de Mayana Neiva nas telinhas em 2025?
MN -
A gente espera, sim, ter uma segunda temporada, estamos aguardando finalizar essa pra ter uma ideia, mas quero muito que esse programa siga o que ele merece, chegar em outros lugares e aumentar a discussão sobre esse tema tão relevante. Para esse ano, eu tenho a estreia de Guerreiros do Sol vindo por aí.

CE - Seu trabalho em novelas mais recente foi em Paixão de Cristo. Sente saudades de fazer novelas?
MN -
Meu último trabalho em novela foi em Éramos Seis, na Globo. A Paixão de Cristo foi uma peça em que fiquei muito feliz de fazer e minha próxima série é Guerreiros do Sol. Mas eu também estou fazendo shows, estou com foco de trabalhar o meu disco. Muitas coisas vindo por aí também de outras maneiras.

CE - Você estará em Guerreiros do Sol, na Globoplay. O que pode nos contar sobre esse trabalho? E como vê o crescimento do streaming nos dias atuais?
MN -
Eu acho que o crescimento do streaming é maravilhoso para todos os atores, expande nosso campo de trabalho.

E Guerreiro do Sol é uma série maravilhosa que fala sobre o Nordeste, dirigida pelo Papinha (Rogério Gomes), que é um grande diretor, então vai ser um mergulho encantador no cangaço do Nordeste brasileiro. Tem muita coisa linda vindo por aí com essa série, tenho certeza de que o Brasil vai se apaixonar.

CE - Em suas redes sociais e em seu podcast você fala bastante em autoconhecimento, um estilo de vida mais leve. Quais seriam as suas dicas para seus seguidores? Qual a sua rotina de autocuidado?
MN -
Eu sou formada em meditação, trabalho também com palestras ligadas ao campo de autoconhecimento, faço atualmente uma pós-graduação na Universidade Einstein, aqui em São Paulo, sobre gestão emocional nas corporações.

Resolvi também colocar para fora esse aspecto do meu trabalho que tem tomado muito do meu coração. Para mim, a gestão da nossa comunicação interna, estar alinhado com a nossa essência e com a nossa paz é o maior chamado da nossa vida, por isso o meu podcast Conversas que Curam também fala sobre esse tema. A minha rotina de autocuidado inclui meditação, alimentação saudável e coerência entre o que você fala e o que você faz.

Capa B+: Entrevista exclusiva com a atriz e apresentadora Mayana NeivaQuero Ser Veg - Divulgação

CE - Além do trabalho como atriz, você tem se mostrado cada vez mais uma artista completa, se destacando também como cantora? Conta um pouco sobre este seu lado, qual o seu estilo de música preferido e os novos projetos nessa área. Você tem uma vasta carreira no cinema. Como vê o atual momento do cinema brasileiro no mundo?
MN -
Meu estilo de música é a música brasileira. Eu amo, é  minha música favorita e também a música latino-americana.

Sobre a questão do cinema nacional, estamos em um momento surrealmente belo para o cinema, né? A Fernanda Torres nos representando, é nosso orgulho nacional, com esse filme que rememora a ditadura, que traz coisas tão importantes, mensagens tão incríveis, chega tão longe, é um feito.
 

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Império do Morro agita 2ª noite de festa pré-carnaval em Ladário

O agito ocorreu Avenida 14 de março e contou com a Bateria Pulso Forte e a rainha Raissa Oliveira

09/02/2025 15h30

Foto: Reprodução

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Destaques da Escola de Samba Império do Morro, campeã de 2024 da folia corumbaense, agitaram o 2º esquenta pré-carnaval em Ladário, a 426 km de Campo Grande.

O agito no coreto da Avenida 14 de março contou com a Bateria Pulso Forte e a rainha Raíssa Oliveira, destaques da agremiação, que animaram a festa organizada pela administração municipal.

Encontro que também contou com a porta-bandeira Vallessa e do mestre-sala Edelton, ambos que desfilaram ao lado dos foliões. 

Na ocasião, a escola de samba apresentou o samba-enredo “De Maria e de Romão, da Fé e emoção. Nordeste de tanta gente, Eldorado do Sertão”,  que será utilizadono desfile do dia 3 de março, em Corumbá. “Fiquei muito emocionada”, disse a rainha Raissa, lembrando que seu irmão, Renan (falecido), foi Rei Momo de Ladário.

Para o presidente da escola, Robson Lacerda, a antecipação do carnaval de Ladário vai reviver a folia na cidade considerada o berço da festa.

“Ladário estava carente desse grande evento (...) a cidade tem tudo para evoluir”, comentou o carnavalesco. 
Ao dar início a festa, que seguiu mesmo debaixo de chuva, o prefeito Munir Ramunieh, sambou ao lado da rainha da bateria e das passistas carregando a bandeira da cidade.

Depois, ao abrir a festa, disse que no próximo ano vai realizar um desfile em Ladário com as agremiações de Corumbá. “Tudo isso não seria possível sem o apoio financeiro do governador Eduardo Riedel e outros parceiros”, lembrou.

Denominado “Lugar de alegria, samba e folia”, o carnaval ladarense receberá recursos de R$ 700 mil, por meio de convênio com o Governo do Estado e emendas de parte da bancada federal e do Senado, verba que arcará com os custos de palco e camarotes e três shows nacionais em fevereiro: Grupo Revelação, no dia 21; MC Jacaré, no dia 22, e Carreta do Dogão, no dia 23.

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