Os maiores devedores vão de frigoríficos a telefônica; valor equivale a quase 80% da arrecadação anual
A lista das empresas que devem cifras milionárias em impostos a Mato Grosso do Sul é vasta e inclui de frigoríficos a telefônica entre os inadimplentes com o Fisco estadual. Levantamento da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco) aponta que, no total, a dívida ativa é de mais de R$ 15,4 bilhões.
Segundo o Atlas da Dívida dos Estados Brasileiros – estudo conhecido como Barões da Dívida –, enviado ao Correio do Estado, o valor equivale a quase 80% da arrecadação anual. Somente as 10 empresas que mais devem ao governo de Mato Grosso do Sul somam uma dívida de mais de R$ 1,6 bilhão.
As maiores empresas devedoras do Estado foram: o Frigorífico Bxb Ltda., que tem sede em Nioaque e é focado no abate de bovinos (R$ 442,3 milhões); o segundo maior inadimplente é o Buriti Comércio de Carnes Ltda., que também é um frigorífico, localizado em Aquidauana, e deve R$ 242,4 milhões; e na sequência vem o curtume Braz Peli Comércio de Couros Ltda. (R$ 186,2 milhões) e a Telefônica Brasil S. A. (R$ 156,6 milhões).
O auditor fiscal e presidente da Fenafisco, Francelino Valença, disse em entrevista ao Correio do Estado que, assim como a arrecadação é liderada pelo Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), os débitos seguem a mesma linha.
“Em Mato Grosso do Sul, a arrecadação de ICMS corresponde, em média, a 85%. Então, nós podemos dizer que grande parte, a maior parte ou um porcentual aproximado disso corresponde ao ICMS. Quer dizer, a dívida ativa, predominantemente, é do não pagamento desse tributo”, explica.
Segundo a Fenafisco, a dívida ativa é o conjunto de débitos tributários de empresas e pessoas físicas que não foram pagos dentro do prazo legal de pagamento ou por decisão final em processo administrativo. Inclui impostos, multas e outras obrigações devidas ao governo.
Os dados usados para o estudo são referentes a 2023, mas foram divulgados neste mês. Conforme a análise da federação, os R$ 15,4 bilhões em dívida ativa registrados em 2023 equivalem a 79,55% da arrecadação anual daquele ano, que foi de R$ 19,3 bilhões.
“Ter uma dívida ativa que corresponda a quase 80% da arrecadação anual é o equivalente a 10 meses da arrecadação. A pergunta que nós poderíamos nos fazer seria o que o Estado poderia fazer com 10 meses de arrecadação em investimentos em programas sociais ou em obras? Ou seja, o Estado está sendo privado de investir ou de trazer benefício à população com recursos significativos em decorrência dessa elevada dívida ativa”, reitera Valença.
ESTRATÉGIAS
Para reduzir a dívida ativa e buscar esses recursos devidos, o auditor indica a redução do estímulo ao pagamento em atraso.
“Uma dessas coisas é a vantagem de atrasar e, depois, ser contemplado com os refinanciamentos das dívidas, os famosos Refis, com redução de juros e multa. Então, é necessário que mudemos a nossa visão em relação ao tributo em atraso, até porque isso é recurso da população, da sociedade, não é uma verba privada”, indica Valença.
Ainda de acordo com o presidente da Fenafisco, outro ponto importante seria o combate efetivo à sonegação.
“Dotando as administrações tributárias de instrumentos mais eficazes, sem contar também a legislação mais forte, mais contundente e menos parcimoniosa em relação à sonegação fiscal. Nós vivemos em uma sociedade em que temos tolerância ao crime de sonegação fiscal. É preciso, por exemplo, que nós mudemos a legislação, fazendo com que a sonegação, de fato, seja um crime punível, inclusive com penas mais duras”, afirma o presidente da Fenafisco.
NACIONAL
O levantamento nacional aponta que, de 2015 a 2023, a dívida ativa no balanço patrimonial dos estados brasileiros teve um expressivo crescimento, passando de R$ 988 bilhões, em 2015, para R$ 1,17 trilhão, em 2023.
Em fevereiro, o Colégio Nacional de Procuradores-Gerais dos Estados e do Distrito Federal (Conpeg) divulgou levantamento que apontava um recorde de arrecadação dos estados no valor de R$ 14 bilhões. O estudo Barões da Dívida demonstra, no entanto, que a recuperação representa apenas 1,19% do total devido aos estados brasileiros.
O Barões da Dívida mostra que os 10 principais devedores do País representam quase metade (43,14%) do porcentual dos 100 maiores, com um valor de R$ 163 bilhões em dívidas com os estados. São empresas petrolíferas, cervejarias, distribuidoras de bebidas e telefônicas.
Para a Fenafisco, o baixo índice de recuperação demonstra a ineficácia das políticas de cobrança. “O aumento da dívida ativa e os desafios para sua recuperação não são meramente resultado da lentidão burocrática, da falta de punição mais rígida para quem não paga, mas também são reflexo das dinâmicas de poder que permeiam o Estado brasileiro”, diz Francelino Valença.
O diretor Ricardo Bertolini, organizador dos dados pesquisados, reforça que o estudo é uma importante fonte de informações aos gestores públicos na busca de ações alternativas que visem a melhoria da eficácia dos processos de execuções fiscais.
“No Atlas da Dívida Ativa, traz-se uma visão dinâmica da posição das dívidas ativas dos estados em relação ao total, bem como o das grandes companhias, que geralmente aparecem na lista dos maiores devedores em mais de uma unidade da Federação. A ideia é que sejam publicadas atualizações periódicas, a fim de construirmos uma série histórica, que servirá para acompanhamento, debates com a sociedade e tomadas de decisões”, finaliza.
Saiba
O Atlas da Dívida dos Estados Brasileiros, estudo conhecido como Barões da Dívida, é feito por iniciativa da Fenafisco desde o fim de 2020. Apesar da obrigatoriedade legal para divulgação das informações, apenas 22 unidades federativas disponibilizaram dados completos dos mil devedores. Amazonas, Distrito Federal e Mato Grosso não encaminharam as informações. Tocantins e Paraíba apresentaram somente informações até 2021 e São Paulo, apenas os 500 maiores devedores.
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