Diante das resistências no governo e no Congresso ao imposto sobre transações, o ministro Paulo Guedes (Economia) decidiu propor uma reforma tributária de menor impacto, enxugando medidas que defendia desde o início do governo e promovendo uma redução mais tímida de alíquotas.
No plano considerado ideal pelo ministro, o imposto aos moldes da extinta CPMF poderia ser usado para compensar a perda de receita com a redução de outros tributos.
Sem esse instrumento, auxiliares do ministro afirmam que não será possível, por exemplo, cortar as alíquotas do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).
A única mudança possível deve ser um aumento da faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para um patamar abaixo de R$ 3.000. O formato em estudo prevê isenção do imposto para rendas mensais de até R$ 2.500.
Se o plano for concretizado, o governo não cumprirá a promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro de ampliar a isenção para rendas de até R$ 5.000. Neste ano, o mandatário passou a dizer que trabalharia para que a isenção fosse para R$ 3.000 em 2022.
De acordo com auxiliares de Guedes, o governo não deve mexer nas deduções do Imposto de Renda.
A medida é defendida pelo ministro sob o argumento de que o mecanismo beneficia faixas de renda mais altas e exclui os mais pobres. Essa alteração impactaria a classe média, que usa gastos médicos e educacionais, por exemplo, como forma de reduzir o imposto a pagar.
O texto ainda não está fechado e pode sofrer alterações. O Ministério da Economia pretende apresentar as propostas ao Congresso nas próximas semanas.
A Pasta vai propor mudança de tributação sobre investimentos. Aplicações que hoje são isentas, como Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), passarão a ser taxadas.
As alíquotas do IR sobre investimentos em renda fixa devem ser unificadas em 15% – hoje a cobrança varia de 15% a 22,5%, a depender do período de aplicação.
Sem o imposto aos moldes da CPMF, o ministro também não conseguirá promover uma ampla desoneração da folha de salários. Esse ponto era tratado como primordial por Guedes.
PROJEÇÃO
Estimativas do Ministério da Economia apontam para uma arrecadação anual de R$ 120 bilhões, se o imposto sobre transações tivesse alíquota de 0,2%. Mais recentemente, a Pasta passou a avaliar alíquota de 0,1%, com receita estimada de R$ 60 bilhões.
Sem a CPMF, o time de Guedes ainda afirma que terá de lidar com entraves na unificação de PIS e Cofins, a primeira etapa da reforma, já enviada ao Congresso.
Como a desoneração da folha não deve ser implementada, o governo terá de criar uma segunda alíquota da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que será baixa para reduzir o efeito negativo sobre setores específicos, como o de serviços. O projeto original prevê cobrança única de 12%.
A interlocutores Guedes afirma que se conseguisse emplacar o imposto sobre transações e a desoneração da folha, o setor de serviços seria beneficiado, porque o gasto com pessoal nessa área representa a maior parte do custo. Desse modo, não seria necessário promover um alívio específico para o setor na criação da CBS.
Segundo membros do Ministério da Economia, também não haverá fôlego para uma redução expressiva nas alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
A ideia inicial previa cortar esse tributo e instituir o imposto seletivo, que incidiria sobre produtos que geram efeitos colaterais negativos, como cigarro, bebidas e automóveis.
No modelo atual, o imposto seletivo será proposto, mas haverá uma redução menos intensa do IPI.
O plano de implementar o imposto sobre transações encontrou resistências dentro e fora do governo desde o início da gestão Bolsonaro. No mês passado, Guedes passou a dizer que não vai mais lutar pelo tributo.
Nos bastidores, no entanto, a equipe do ministro afirma que a estratégia agora é mostrar aos congressistas, ao longo das discussões da reforma no Congresso, que a nova CPMF poderia ser usada para reduzir uma série de outros impostos que teriam apelo popular positivo, como é o caso do Imposto de Renda.
Desde que a comissão especial que analisava a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45, do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), foi encerrada, há um mês, a reforma tributária está com tramitação suspensa no Congresso.
Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), reuniram-se com Guedes para definir o faseamento e a divisão das etapas em cada Casa.
A CBS, fusão de PIS e Cofins, e a mudança no Imposto de Renda e no IPI começariam pela Câmara. Mudanças constitucionais, aproveitando parte da PEC relatada pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), tramitariam a partir do Senado, assim como a renegociação de dívidas proposta no passaporte tributário.
Até o momento, no entanto, não foi apontado um relator para o projeto da CBS, apesar do otimismo do presidente da Câmara com a aprovação da reforma ainda neste ano.
Para Aguinaldo Ribeiro, ainda não é possível saber qual será a reforma tributária avaliada. “Na Câmara não tem reforma tributária. Ampliar a faixa de isenção de Imposto de Renda não é reforma tributária, isso já foi feito várias vezes”, disse.
“Pelo que me consta, o que sobrou à Câmara foi a CBS, que representa aumento de imposto, porque você vai ter aumento de alíquota. Não se pode chamar isso de reforma tributária”, afirmou.
O deputado, líder da maioria no Congresso, defende uma reforma ampla. “O resto é engodo. O que está proposto na CBS é aumento de imposto. E a CPMF é aumento de imposto, porque é imposto regressivo”.
Líder do PSDB na Câmara, o deputado Rodrigo de Castro (MG) também é cético em relação à tramitação da reforma. “Não há clima para aprovar uma reforma que signifique apenas aumento de arrecadação, como no caso da CBS”.
O sentimento é o mesmo na oposição. “Não vejo ambiente político para avançar. A solução CPMF é um paliativo equivocado, porque ratifica a injustiça fiscal e o caráter regressivo do modelo atual ao igualar a cobrança à toda a população”, disse o líder do PSB na Câmara, Danilo Cabral (PE).
Plano anterior
Em 2018, o presidente Jair Bolsonaro prometeu ampliar a faixa de isenção dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 5.000 mensais. Governo também planejava reduzir as alíquotas do IR.