Pelo menos quatro empresas de Campo Grande são suspeitas de realizar descontos indevidos em aposentadorias e pensões do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS). Estas empresas não são associações investigadas pela Polícia Federal, com descontos feitos pelo INSS, mas instituições que realizavam débitos automáticos nas contas bancárias onde os benefícios são pagos.
De acordo com reportagem do Uol, há indícios de atuação do ramo de seguros, empresas financeiras e clubes de benefício que, assim como no caso dos descontos feitos pelo INSS, os aposentados e pensionistas dizem não reconhecer as cobranças.
Diferentente dos casos de fraude do INSS, onde o desconto era feito diretamente nos benefícios, com o restante depositado na conta bancária, os descontos feitos em débito são operações entre empresas privadas, com o desconto diretamente em conta, após o depósito do benefício.
Conforme o Uol, foram identificados três grupos de empresas envolvidas em cobranças em massa, que, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), juntas, são alvos de mais de 54 mil processos em todos os estados do País.
Uma das empresas com mais processos é Paulista Serviços e Recebimentos, identificada nos extratos bancários pela sigla Pserv, com sede em São Paulo. Na Justiça, ela se defende dizendo que só atua como intermediária das cobranças e as atribui a pelo menos nove empresas, de quatro estados
Destas nove empresas, cinco ficam em Campo Grande, sendo:
- SP Gestão de Negócios
- ZS Seguros e Serviços Financeiros
- Investsul Prestadora de Serviços
- Grêmio Recreativo e Esportivo aos Servidores Públicos (Gresp)
Cada empresa pertence a apenas um sócio, mas foram identificadas relações anteriores entre eles.
Questionada sobre a relação, a Pserv atribiu os débitos a quatro clubes de benefícios, sendo um Campo Grande, dois de Belo Horizonte (MG) e um de Curitiba (PR).
Além disso, todas as nove empresas possuem ligações com correspondentes bancários ou corretores de seguros.
Na maioria dos casos judicializados, os aposentados denunciam que não solicitaram contrataram nenhum tipo de serviço das empresas e que suas assinaturas foram fraudadas. Há situações em que um mesmo aposentado tem mais de um débito cadastrados, totalizando quase R$ 250 de desconto mensal.
Há ainda indícios de ligações entre as operações em Mato Grosso do Sul e Santa Catarina (SC), uma delas que sendo que o mesmo escritório de advogados defendeu o grupo antes da identificação de irregularidades.
Empresas negam irregularidades
A Pserv disse que as "empresas clientes são as responsáveis por qualquer atuação nas demandas de qualquer esfera consumerista/judicial" e que "cancelou diversos contratos com empresas sempre que o nível de reclamação chegava a 5% da carteira de seus clientes".
A SP Gestão de Negócios disse que "todos os contratos e procedimentos são estabelecidos em estrita conformidade com a legislação brasileira".
A ZS Seguros e Serviços Financeiros afirmou que "não possui relação comercial direta com consumidores finais", pois é uma intermediária tecnológica — que, por sua vez, utiliza a intermediação de pagamentos da Paulista. A empresa não informou quem seriam os responsáveis pelas cobranças.
O Grêmio Recreativo e Esportivo aos Servidores Públicos declarou que "apenas 0,5% dos associados apresentaram algum tipo de questionamento e solicitaram desligamento, sendo prontamente atendidos" e que todos os termos de associação estariam "devidamente assinados".
A Investsul foi procurada em todos os telefones e e-mails que constam nos cadastros oficiais da empresa, mas não houve retorno.
Descontos em débito automático
Os descontos irregulares em aposentadorias e pensões do INSS não se restringem a associações, já investigadas pela Polícia Federal.
Conforme reportagem do Correio do Estado, levantamento da Procuradora-Chefe da Coordenadoria Jurídica do Procon de Mato Grosso do Sul (Procon-MS), Carla Cardoso Nunes da Cunha, que o Correio do Estado teve acesso em primeira mão, mostra que o volume de descontos indevidos nos benefícios pagos pelo Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) pode ser muito maior que o identificado até agora pela Polícia Federal na Operação “Sem Desconto”.
No entanto, além destes, há essa outra irregularidade encontrada, de várias empresas que realizavam o desconto em débito automático, após o benefício já ter sido depositado pelo INSS.
Nestes casos, como o desconto é feito em conta, não consta no extrato do INSS e dificulta a mensuração de quanto pode ser o impacto financeiro.
O número exorbitante de casos é um forte indicativo de que houve acesso irregular a dados pessoais e bancários de aposentados e pensionistas do INSS, além de expor a fragilidade nos procedimentos de débito automático adotados pelos bancos, que, em muitos casos, não exigem que os clientes confirmem que autorizaram a cobrança.
Além das empresas de Campo Grande, há diversas outras com o mesmo perfil de atuação em todos os estados.
Na maioria dos processos consultados pelo Uol, as empresas não apresentam provas da contratação dos serviços ou anexam documentos com assinaturas que os advogados dos aposentados dizem ser falsas.
Mesmo assim, as empresas negam irregularidades e dizem que as cobranças são legítimas, referentes a apólices de seguros e adesões a clubes de benefício.
O INSS e a Dataprev, empresa de dados estatal, afirmam que informações bancárias de aposentados e pensionistas, necessárias para o cadastramento do débito automático, "são tratadas com rigorosos critérios de segurança".
A Federação Nacional dos Bancos (Febraban) afirmou que não compactua com qualquer prática ilícita ou abusiva contra o consumidor e que, ela e seus bancos associados, seguem integralmente as normas do Banco Central relativas ao serviço de débito automático.




