A Justiça do Trabalho em Campo Grande acolheu uma Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS) e condenou a empresa Rumo Malha Oeste S.A por práticas consideradas graves de descumprimento de legislação trabalhista.
A sentença impõe à concessionária 35 obrigações e determina o pagamento de R$12 milhões em danos morais coletivos.
A ação foi movida após inspeções e perícias realizadas nos anos de 2016 e 2017 revelarem uma série de irregularidades nos regimes de trabalhos da empresa no trecho que opera entre Mato Grosso do Sul e São Paulo. Entre os principais problemas foram destacados:
- Condições de trabalhos degradantes - como a ausência de banheiros nas locomotivas, obrigando os trabalhadores a se deslocarem a áreas externas para as necessidades fisiológicas ou até mesmo realizar pela janela da condução; alojamento com falhas de iluminação, mato alto, buracos e peças expostas e falta de conforto mínimo para a dignidade humana;
- Jornadas exaustivas - relatos de maquinistas apontaram que já foram submetidos a escalas de 12 a 15 horas diárias, sem intervalos adequados para alimentação ou descanso;
- Problemas de segurança - o modelo de operação “monocondução” (quando há um único maquinista por locomotiva) foi vinculado a pelo menos um acidente grave noturno ocorrido em Chapadão do Sul, onde duas máquinas colidiram, em agosto de 2012.
Na ação civil ajuizada em 2014 pelo MPT, a então procuradora do Trabalho, Simone Beatriz Assis de Rezende, enfatizou que o grupo econômico Rumo Logística possui centenas de autuações pendentes pelo Ministério do Trabalho e Emprego, além de investigações e procedimentos administrativos conduzidos pelo MPT.
Na época, sete procedimentos investigatórios tramitavam no MPT-MS contra as empresas do grupo, que relataram diversas irregularidades trabalhistas como controle de ponto, extensa jornada de trabalho e as condições insalubres dos alojamentos.
“A monocondução, as jornadas excessivas, a ausência de concessão do intervalo legal para repouso, alimentação e para as próprias necessidades fisiológicas são fatores que agravam ainda mais as condições insalubres, antiergonômicas, enfim, indignas a que se submetem os maquinistas das rés”, concluiu Rezende.
Decisão
Ao longo dos mais de 10 anos de andamento do processo movido pelo MPT-MS, foi constatado que nenhuma das locomotivas utilizadas no trecho Corumbá-Porto Esperança possuía banheiro, bem como as que transitam ao longo de toda a rota Bauru/SP-Corumbá/MS.
Para o juiz Marco Antônio de Freitas, responsável pela decisão, “a existência de instalações sanitárias no ambiente de trabalho é uma condição mínima de dignidade sedimentada na jurisprudência e na doutrina”, e não é aceitável exigir que o trabalhador satisfaça necessidades fisiológicas em locais inadequados.
Deste modo, a empresa foi penalizada em R$12 milhões de reais em danos morais coletivo, além de ser intimada a cumprir, em até 90 dias, as obrigações de fazer e não fazer impostas pela sentença. Em caso de descumprimento, há penalidades de até R$100 mil mensais.
A decisão também reconheceu a possibilidade de responsabilização solidária de outras empresas do mesmo grupo econômico, considerando que Rumo Malha Oeste integra o grupo Ramo Logística, que já acumula processos trabalhistas em vários estados.
Outras multas
Conforme noticiado anteriormente pelo Correio do Estado, a Rumo Malha Oeste foi autuada 74 vezes em três anos, entre 2021 e 2024, por não cuidar da faixa de domínio, abandonar prédios e não trocar dormentes e trilhos nos 1.973 quilômetros da linha férrea entre Mairinque (SP) e Corumbá.
Estas infrações, em sete casos, resultaram em autuações e multas que chegaram a R$ 7,5 milhões, de acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
A empresa foi punida porque fez a retirada de 4 km de trilhos do ramal de Ladário para usar em outro trecho de Corumbá.
No auto de infração, consta que a Rumo foi punida por “não zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão, conforme normas técnicas específicas, não mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento ou conservação, até a sua transferência à concedente ou à nova concessionária”.
Em outra fiscalização, de dezembro de 2024, técnicos da ANTT constataram que 94,5% dos dormentes do trecho de 436 km entre Campo Grande e Três Lagoas estavam estragados, resultado de anos sem manutenção adequada. A penalidade, novamente, foi de R$ 2,1 milhões.
Além dos trechos em Mato Grosso do Sul, a concessionária também foi punida em R$ 2,03 milhões no trecho paulista entre Bauru e Mairinque, por “não zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão”.
Em outro auto, de R$1,015 milhão, referente ao trecho Três Lagoas-Bauru, a penalidade foi aplicada porque a empresa não comunicou à ANTT uma interrupção total do tráfego ferroviário provocada por erosão nas margens de um curso d’água, problema que persiste desde janeiro de 2024.
O cenário se repete em Corumbá, onde há ocupação irregular da faixa de domínio por uma transportadora que utiliza o espaço como estacionamento de caminhões. Em Ponta Porã, a Rumo foi multada em R$ 396 mil por abandono da antiga estação ferroviária e da faixa de domínio do município.
Em nota, a Rumo argumenta que tem cumprido suas obrigações e que os serviços de manutenção vêm sendo realizados “de forma contínua”.
“A Rumo sempre demonstrou os esforços empreendidos para manutenção e prestação do serviço ferroviário, inexistindo fundamento legal para a imposição da penalidade”.
*Colaborou Clodoaldo Silva


