Fazenda no Pantanal pode ter até 1,6 mil animais sem documentação; no fim do mês, Estado recebe status de área livre da aftosa
A poucos dias do “churrasco em Paris” prometido por autoridades de Mato Grosso do Sul, como o governador Eduardo Riedel (PSDB) e o presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), Guilherme Bumlai, no dia em que o Estado receber o status de área livre da febre aftosa sem vacinação, a disputa por uma fazenda no Pantanal da Nhecolândia – distante 230 quilômetros de Corumbá – expõe um possível descontrole sanitário em MS: até 1,6 mil bovinos que estão na Fazenda Clarão da Lua simplesmente não existem para a Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal (Iagro).
O rebanho sem nenhum controle, como a vacinação contra doenças como raiva e brucelose e mesmo a aftosa – que era exigida até dois anos atrás –, estava na Fazenda Clarão da Lua, que é alvo de uma disputa judicial por sua titularidade, envolvendo o atual arrendatário, Amerco Rezende de Oliveira, o atual proprietário, Rodrigo Ricardo Ceni, e o antigo proprietário, Marcos Garcia Azuaga.
Em meio às disputas pela fazenda, Rodrigo Ricardo Ceni conseguiu o cumprimento de um mandado de reintegração de posse contra Amerco Rezende. A fazenda, que era de Marcos Garcia, foi comprada por Rodrigo e, quatro dias depois, revendida a Marcos. O inadimplemento dos contratos de compra e venda foi o que causou a enxurrada de ações judiciais pela posse e propriedade da fazenda.
O problema surgiu antes do cumprimento do atual mandado de reintegração de posse, determinado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), que ordena que Ceni devolva a posse da fazenda a Amerco Rezende. Quando tomou posse da propriedade, no dia 20 de março, o oficial de Justiça que esteve no local teve contato com dois capatazes, e cada um informou um número diferente de bovinos na fazenda de 3 mil hectares. O primeiro disse que havia 800 rezes no local, já o outro falou em 1,6 mil. Não houve contagem, e o mandado de reintegração de posse também não determinava tal feito.
Agora, Ceni tenta adiar a devolução da posse porque, ao consultar a Iagro, não encontrou nenhum animal registrado na fazenda objeto da disputa. O temor de Ceni, além do financeiro, de ter de arcar com responsabilidades sobre os bovinos que estão na área, é também sanitário: não há nenhum controle sobre os bovinos clandestinos.
Nos bastidores, há peões da região que acreditam que os animais que estão na Fazenda Clarão da Lua tenham vindo da Bolívia.
Guilherme Bumlai, o presidente da Acrissul, que disse que estaria no “churrasco em Paris” com Eduardo Riedel, advoga para Amerco Rezende, que mantinha os supostos bois clandestinos, nas ações.
A disputa está em pleno vigor. A expectativa é de que os técnicos da Iagro vão ao local, acompanhados de oficiais de Justiça, na segunda quinzena deste mês. Também é na segunda quinzena deste mês que uma comitiva de Mato Grosso do Sul vai a Paris, à sede da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA), para receber o certificado de área livre de aftosa sem vacinação.
Mais mercados
O certificado de área livre da febre aftosa sem vacinação pode ajudar Mato Grosso do Sul. O certificado nas mãos das autoridades sanitárias abrirá muitos mercados para o Estado, em meio às restrições impostas pelo governo do republicano Donald Trump, nos Estados Unidos.
Em entrevista ao Correio do Estado na semana passada, o titular da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc), Jaime Verruck, afirmou que Mato Grosso do Sul não tem outro mercado para alocar o volume comprado pelos Estados Unidos, que é o segundo maior destino das exportações locais, só atrás da China.
Em 2024, por exemplo, os norte-americanos importaram quase US$ 700 milhões de carne sul-mato-grossense, o que, com as tarifas em vigor, geraria um custo adicional de US$ 70 milhões para acessar aquele mercado.
Conforme Verruck, o reconhecimento de área livre de aftosa sem vacinação mitiga parte dos impactos das tarifas norte-americanas. “Ele [o reconhecimento de área livre de aftosa sem vacinação] minimiza [o impacto], no sentido de nós podermos deslocar nossa produção para novos mercados”, explica.
“Ele [o reconhecimento] vai se posicionar como alternativa de entrada em novos mercados daqueles produtos que nós não conseguimos mais colocar nos Estados Unidos”.
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