As máquinas podem pensar?”. Esse foi o questionamento realizado por Alan Turing, matemático inglês considerado pai da inteligência artificial (IA), em seu artigo “Computing Machinery and Intelligence”, publicado na década de 1950 e que introduziu ao mundo acadêmico as primeiras considerações sobre essa tecnologia.
Desde então, houve vasta evolução tecnológica na era da informação, com o desenvolvimento de computadores cada vez mais complexos e novos tipos de tecnologia, cujas utilidades tornam quase impossível imaginar nossas vidas sem tais ferramentas.
Imagine-se, por exemplo, sem as facilidades proporcionadas por um aplicativo de trânsito que mostra a melhor rota em tempo real, ou conteúdos personalizados nas redes sociais e canais de streaming.
Fato é que a inteligência artificial está ocupando seu espaço na sociedade, tendo deixado há tempos de ser apenas tema de filmes de ficção científica. Essa tecnologia tem trazido benefícios concretos ao nosso cotidiano, relacionados à produtividade e à entrega de resultados precisos.
Como exemplo, podemos citar os seguintes setores econômicos que atualmente se destacam na utilização de IA: saúde (detecção de diagnósticos), varejo (perfil de consumo dos usuários), “indústria 4.0” (automação industrial), agronegócio (previsões meteorológicas e monitoramento de plantações), recursos humanos (automatização de processos de recrutamento e seleção), cibersegurança (previsão de ataques e atividades suspeitas) e infraestrutura (monitoramento de segurança).
Com o surgimento de novas tecnologias, é natural que haja instituição de normas com a finalidade de estabelecer diretrizes, princípios, direitos e nortear a atuação do mercado. Internacionalmente, já há diversos modelos regulatórios de IA.
O Japão e o Reino Unido, por exemplo, são países que mais se aprofundaram nos modelos de regulação, e a Alemanha, pela quantidade de iniciativas regulatórias. Por sua vez, a Coreia do Sul se destaca pelo apoio ao desenvolvimento das tecnologias de IA, buscando reduzir a regulamentação.
Há, ainda, países da União Europeia que preferem aderir a normas de órgãos internacionais, enquanto outros apenas buscam realizar ajustes legais para adaptação ao contexto de utilização desses sistemas.
Em âmbito nacional, está sob a análise do Senado uma minuta de projeto de lei elaborada por uma Comissão de Juristas, em substituição a proposições anteriores, com o objetivo de estabelecer normas gerais para o desenvolvimento, a implementação e o uso responsável da IA no Brasil.
Caso o projeto de lei seja aprovado, as empresas que desenvolvem ou utilizam inteligência artificial teriam os seguintes impactos:
Necessidade de observância a diversos direitos, tais como à informação prévia quanto às interações com sistemas de inteligência artificial; à explicação sobre a decisão, recomendação ou previsão tomada; à contestação de decisões; a não discriminação e à privacidade e proteção de dados pessoais; Instituição de avaliação preliminar de risco para identificação do grau de risco do sistema, previamente à sua colocação no mercado;
Instituição de programas de governança e processos internos aptos a garantir a segurança dos sistemas e o atendimento dos direitos de pessoas afetadas;
Dever de comunicação de incidentes de segurança;
Sujeição a sanções administrativas em caso de infração à lei e à responsabilidade civil em caso de danos.
Assim, quando promulgada a lei para regulamentar a atividade, ainda que ocorram modificações na minuta proposta, haverá impacto na realidade organizacional das empresas que desenvolvem sistemas de inteligência artificial (fornecedoras), ou a utilizem em seu nome ou benefício (operadoras).
Em ambos os casos, será necessário estruturar um programa voltado ao atendimento das normas direcionadas à proteção do cidadão face aos riscos que o avanço tecnológico protagonizado pelo uso da IA pode trazer.
Se nos dias de hoje as máquinas podem pensar, é preciso que haja convivência harmoniosa entre a inteligência humana e a artificial. O avanço tecnológico é inevitável, assim como as regulações que acompanham tal evolução.
Haverá impactos? Sim, serão necessárias mudanças organizacionais. Mas haverá também potencial para que a regulamentação norteie as empresas quanto ao uso responsável de sistemas de inteligência artificial, convergindo, enfim, os interesses de todas as partes envolvidas na sua utilização.