Política

DESVIANDO O ASSUNTO

"Questão indígena" era código para discutir formas de atrapalhar Lava Jato

Delcídio e ex da Justiça desvirtuaram tema e usavam como senha

RODOLFO CÉSAR

21/03/2016 - 17h00
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A questão indígena em Mato Grosso do Sul, que tem em seu histórico a morte de dezenas de índios e clima de tensão no sul do Estado, serviu de pretexto e virou código para as conversas entre o senador licenciado Delcídio do Amaral (PT) e o então ministro da Justiça e agora advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, para tratar sobre formas de atrapalhar a Operação Lava Jato.

Delcídio, em entrevista concedida à revista Veja desta semana, reconheceu que o tema era mencionado para disfarçar a pauta que os dois tratariam.

"Eu conversava muito com Cardozo. Quando sabia de alguma operação, ele me dizia: 'Ventos frios sopram de Curitiba'. A senha era essa. Quando queria tratar de alguma ação de bastidores, ele mandava mensagem me convidando para falar da 'questão indígena', assunto recorrente do meu estado. Nós dois e Dilma falávamos sobre o tema às segundas-feiras, depois da reunião da coordenação política", afirmou.

Enquanto o assunto era usado para maquiar tentativas de intervenções ilegais no trabalho da Polícia Federal e da Justiça, na apuração contra a corrupção, o governo federal prometia resoluções, que até hoje ainda não foram dadas.

PANO DE FUNDO

O então ministro de Justiça tinha conhecimento da situação dos conflitos e o impacto disso em Mato Grosso do Sul. Enquanto isso, servia-se do assunto para tratar outros motivos.

Quando aparentemente já havia sido criado essa senha, Cardozo visitou o Estado em 2 de setembro do ano passado, em meio a conflitos violentos entre indígenas e donos de fazendas.

Dias antes dessa visita, em 29 de agosto, Semion Vilhalva, da etnia guarani e líder de uma comunidade, fora assassinado na região de Antônio João. Grupo havia ocupado a fazenda Barra e em torno de 100 fazendeiros armados, em 40 caminhonetes, fizeram a retomada da terra.

Ainda antes disso, o então ministro da Justiça recebeu produtores rurais em várias reuniões em Brasília para tratar o mesmo assunto. Em um desses encontros, uma produtora rural cobrou: "Quero que vocês tomem providência, a situação está feia. Sou uma mãe de família, trabalhei a vida inteira. Eles (índios) têm direitos, mas nós também, aquela é uma área que não é indígena”.

Apesar do grau de complexidade para resolver os conflitos, a dedicação ao tema aparentemente era menor. Pode-se depreender que os esforços, a partir do relato de Delcídio, eram mais para utilizar a questão como secundária, enquanto lidar com a atual crise que existe no governo era e ainda é a prioridade.

LEVANDO A SÉRIO

Em uma nova tentativa de tomar medidas resolutivas, a Organização das Nações Unidas (ONU) veio ao Estado na segunda semana de março para mapear a situação e apresentar um relatório com indicação de ações ao Conselho de Direitos Humanos, em setembro deste ano.

COBRANÇA

Veja vídeo de produtora rural pedindo a José Eduado Cardozo medidas eficazes para minimizar o conflito indígena em Mato Grosso do Sul. Acesse aqui.

INTEGRAÇÃO

Após reuniões com Tebet, Chile quer Corredor Bioceânico com Brasil, Argentina e Paraguai

Governo chileno tem projeto para criar uma nova rota comercial, com extensão de 2,4 mil km, unindo o norte do país aos três vizinhos sul-americanos

15/04/2025 15h42

Reunião da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, com os ministros chilenos Nicólas Grau (Economia) e Jessica López (Obras Públicas)

Reunião da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, com os ministros chilenos Nicólas Grau (Economia) e Jessica López (Obras Públicas) Divulgação

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As articulações da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, durante passagem pelo Chile no fim do mês passado para tratar do projeto de rotas de integração sul-americana com autoridades do governo chileno deram os primeiros resultados.
 
Conforme ela, o Chile apresentou, ontem (14), o plano de obras do chamado Corredor Bioceânico, uma estrada de 2,4 mil quilômetros para unir o norte do país com o Brasil, a Argentina e o Paraguai.
 
O projeto que busca configurar uma nova rota comercial entre o Atlântico e a região Ásia-Pacífico está em pauta há uma década e é considerado uma das obras de infraestrutura mais importantes da América Latina.
 
A via conectará os portos do sul do Brasil com os do norte do Chile, atravessando Mato Grosso do Sul, a região do Chaco paraguaio e as províncias argentinas de Salta e Jujuy.
 
"É uma boa notícia, porque se trata de uma integração real e concreta", disse o presidente chileno Gabriel Boric, ao apresentar o "Plano de Ação do Corredor Bioceânico" no palácio presidencial de La Moneda, em Santiago, capital do Chile.
 
O plano considera o desenvolvimento de 22 projetos de infraestrutura no Chile para melhorar estradas, estabelecer novos pontos de controle da alfândega e da polícia, além da atualização dos portos de Iquique, Mejillones e Antofagasta.
 
No Brasil, a futura rota percorrerá rodovias de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul. De acordo com o governo chileno, esse corredor representa uma melhoria significativa em relação a outras rotas.
 
Espera-se que possa reduzir em até 10 dias o transporte entre regiões do interior do Brasil e Paraguai e países da Ásia-Pacífico, como China, Coreia do Sul e Japão. O programa será um dos principais pontos de discussão da visita oficial ao Brasil que o presidente Gabriel Boric realizará na próxima semana.

Agenda chilena

Em entrevista exclusiva ao Correio do Estado, a ministra Simone Tebet explicou que recebeu, na embaixada brasileira em Santiago, os ministros chilenos Nicolás Grau (Economia) e Jessica López (Obras Públicas) para tratar especificamente do chamado Corredor Bioceânico.
 
"Na reunião, eu percebi que os ministros precisavam de uma garantia do envolvimento do governo brasileiro na Rota Bioceânica para que o governo chileno incorporasse essa questão no projeto deles do Corredor Bioceânico. Eles sentiram firmeza na nossa participação", argumentou.
 
Simone informou aos ministros Nicolás Grau e Jessica López que o Brasil já está negociando as questões alfandegárias com Paraguai porque a ponte que liga Carmelo Peralta (PY) a Porto Murtinho (M) fica pronta no próximo ano. "De posse dessas informações, eles resolveram incorporar o Corredor Bioceânico no programa estatal chileno", explicou.
 
Na próxima semana, a ministra confirmou a reunião do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o presidente Gabriel Boric. "Já está confirmada ainda a vinda de vários ministros chilenos para que atos governamentais dos dois países sejam assinados. Também participarão alguns empresários estratégicos do Chile para verificar o interesse do governo federal brasileiro em relação a essa rota", adiantou.
 
Ela detalhou que o principal interesse do Chile no Brasil é avançar com o Corredor Bioceânico, pois os chilenos perceberam que essa questão passou a ser uma política do governo brasileiro. "Isso faz com que os países possam investir o próprio orçamento e estimular a iniciativa privada dos seus países a investirem também", assegurou.
 
Para Simone Tebet, faltava segurança e previsibilidade para que essa rota fosse a entrada decisiva do governo do Chile no processo. "Já que os empresários dos portos de Antofagasta, Iquique e Mejillones já estavam envolvidos, assim como o governo do Paraguai, que está investindo a pleno vapor, pois para eles é estratégica essa rota", lembrou.
 
A ministra ainda acrescentou que o governo brasileiro também está se movimentando porque ela não deixa de fora da pauta do presidente Lula a questão das rotas de integração sul-americana.

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CONTROLE

STF põe no radar emenda interestadual e 4 parlamentares de MS fizeram o repasse

De 2023 a 2024, foram destinados ao estado de São Paulo mais de R$ 11,8 milhões por 2 deputados federais e 2 senadoras

15/04/2025 08h00

Sessão deliberativa do Congresso; parlamentares enviaram R$ 550 milhões para outros estados

Sessão deliberativa do Congresso; parlamentares enviaram R$ 550 milhões para outros estados Foto: Jonas Pereira/Agência Senado

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Para conter distorções no uso de emendas parlamentares, o Supremo Tribunal Federal (STF) colocou no radar as chamadas emendas interestaduais, ou seja, aquelas destinadas por deputados federais e senadores da República para estados diferentes daqueles pelos quais foram eleitos em 2022.

Embora não seja ilegal, em agosto do ano passado, o ministro Flávio Dino, do STF, chegou a determinar que os parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado só podiam destinar emendas na modalidade transferências especiais, as “emendas Pix”, aos estados pelos quais foram eleitos, proibindo, portanto, os repasses para outras unidades da Federação.

Na ocasião, o ministro justificou que o veto foi porque a prática compromete a transparência e a rastreabilidade na execução das emendas parlamentares e, por isso, restringiu a manobra a projetos de âmbito nacional, cuja execução ultrapasse os limites territoriais do estado do parlamentar. 

Em todo o Brasil, deputados federais e senadores destinaram mais de R$ 550 milhões em emendas parlamentares nos últimos dois anos para estados diferentes daqueles pelos quais foram eleitos. Somente em 2024, os repasses interestaduais somaram cerca de R$ 252 milhões.

No caso de Mato Grosso do Sul, no mesmo período, quatro parlamentares – os deputados federais Marcos Pollon (PL) e Rodolfo Nogueira (PL) e as senadoras Soraya Thronicke (Podemos) e Tereza Cristina (PP) – enviaram um total de R$ 11.871.781,00.

O deputado federal Marcos Pollon destinou, em agosto do ano passado, R$ 1 milhão em emenda para ser usado pela empresa Academia Nacional de Cultura (ANC) para a produção de uma série documental chamada “Heróis Nacionais”, que contará histórias de personagens importantes para a formação do Brasil, conforme avaliação do parlamentar.

A reportagem apurou no site da ANC que a empresa foi criada para preparar artistas e produtores para “um mundo em constante disrupção”. 

“Construímos uma estrutura de impacto, unindo o conhecimento acadêmico de estudiosos pesquisadores do saber com os conceitos e práticas de mercado, através da atuação dos experts que estão nas fronteiras da inovação global nos setores da indústria cultural”, traz texto no site.

SAÚDE

O colega de partido dele, deputado federal Rodolfo Nogueira, também enviou, em abril do ano passado, mais R$ 1 milhão para o Fundo Estadual de Saúde (Fundes) da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, enquanto a senadora Tereza Cristina destinou um total de R$ 1.371.781,00 em três emendas, sendo uma em 2023 e duas em 2024, todas para o estado de São Paulo.

A primeira emenda, no valor de 244.381,00, foi para o Fundo Municipal de Saúde do município de Barretos (SP), em maio de 2023, enquanto outra foi no valor de R$ 200.000,00 para o Fundes, da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, em abril do ano passado, e a terceira, no valor de R$ 927.400,00, para a Fundação Faculdade de Medicina de São Paulo (FFM), em dezembro do ano passado.

Criada em 1986, a FFM é uma entidade privada, sem fins lucrativos, que promove o ensino, a pesquisa e a assistência em saúde por meio do apoio às atividades da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Hospital das Clínicas.

Já a senadora Soraya Thronicke foi a parlamentar sul-mato-grossense campeã de envio de emendas para estados diferentes do qual ela foi eleita, totalizando R$ 8.500.000,00, sendo uma de R$ 8 milhões, em março do ano passado, Soraya enviou R$ 8 milhões para o Instituto de Desenvolvimento Socioambiental (IDS) do Rio de Janeiro.

A entidade trabalha com iniciativas de agricultura familiar e, desde 2021, já captou R$ 27 milhões com o governo federal, sendo parte por meio de emendas parlamentares. 

Além disso, em abril do ano passado, a senadora sul-mato-grossense mandou R$ 500 mil para o Fundes, da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo.

SAIBA

A prática contraria o argumento frequentemente usado pelos parlamentares de que o crescimento dessas verbas se justificaria pelo vínculo com suas bases eleitorais e pelo conhecimento das demandas locais, além de levantar dúvidas sobre a transparência dos recursos, o controle dos repasses e a efetividade do uso do dinheiro público utilizado.

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