O avanço da lama sobre as águas cristalinas dos rios de Bonito e Jardim, no mês de novembro, trouxe alerta à indústria do ecoturismo na região. O maior atrativo dos visitantes que passam pelas cidades foi ameaçado pelo avanço do agronegócio, o desmatamento ilegal nas margens dos rios, a falta de drenagem nas estradas e os drenos nas nascentes.
A chuva que antecedeu o feriado da Proclamação da República (celebrado dia 15 de novembro) trouxe um prejuízo de, pelo menos, R$ 15 mil para a proprietária do Balneário do Assis, localizado em Jardim, Henriqueta Scherer, 66 anos. O local, que é banhado pelo Rio da Prata, recebe cerca de 250 pessoas por fim de semana e permaneceu fechado durante três, ou seja, sem visitação. Apenas nesta semana, a água, que ainda está turva, começou a ficar limpa e voltar a ser igual às imagens de cartão-postal.
Ela conta que o pai, seu Assis, comprou a fazenda em 1965 e, desde 1997, ela começou a administrar. “São três fins de semana sem poder trabalhar, em consequência da lama que desceu no rio. Prejuízo grande. É desalentador, triste demais. Tenho o maior respeito e cuidado com o meio ambiente”, lamentou. Segundo Henriqueta, cinco funcionários dependem dela.
Proprietário dos atrativos Recanto Ecológico Rio da Prata, Lagoa Misteriosa e Estância Mimosa, sendo o último em Bonito e os dois primeiros em Jardim, o empresário Eduardo Coelho relata que o Rio da Prata vem perdendo qualidade há cerca de 25 anos. De acordo com ele, antigamente, quando chovia pouco, o rio não ficava turvo, mas quando chovia muito ficava leitoso e com dois dias estava transparente de novo. “A cobertura do solo tinha muita mata e capim nativo. Esse capim nativo foi substituído por capim braquiária e o Cerrado foi desmatado para virar capim. Há quatro anos, foi feito ‘valeteamento’ na região das nascentes do Rio da Prata, onde ficam os banhados, colocaram drenos, [o que] tem deixado o rio cinza”, lamentou.
Com a situação do fim do mês de novembro e começo de dezembro, Coelho disse que ficou com medo em razão da dependência financeira da família e de 70 funcionários diretos que ele mantém com o ecoturismo.
“Eu estava apavorado até terça-feira da semana passada, estava com muito medo. As ações estavam lentas do governo do Estado. Mas agora acho que entendeu a importância da atividade. O Imasul também estava omisso com relação aos drenos, mas agora tem mais gente analisando o problema”, destacou.
Fotógrafo desde 2012, com 27 anos, o bonitense Diego Cardoso contou ao Correio do Estado que cancelou um trabalho, na segunda-feira (3), porque a água do Rio Formoso ainda estava turva. “Desde que me lembro, no processo é normal sujar, o que não é normal é a demora para ela voltar a ficar limpa. Se eu tivesse prazo para entregar, tinha perdido o trabalho. Ainda não perdi, mas pode acontecer se continuar assim”, lamentou.
O empresário João Roza Vizcaino, 64 anos, dono do restaurante Casa do João, disse que tem 62 funcionários diretos em Bonito e teme um problema social nas duas cidades. “É muito triste, se pensar, hoje, as propagandas são água limpa, transparente, daqui a pouco vai se tornar uma fraude. Bonito pode ser processado por fraude. Depende totalmente do ecoturismo. Pouca exceção não depende do turismo. Tenho muito medo de continuar assim, porque, além de ser ambiental, passa a ser um problema grave social. Imagina o que o povo de bonito vai fazer, porque todo mundo vive de turismo. Vão fazer uma recuperação emergencial, mas precisa de uma definitiva”, ressaltou.
Segundo o presidente da Associação Empresarial de Jardim, Claudemyr Soares, 1% do Produto Interno Bruto da cidade depende diretamente do turismo, além do comércio local, que acaba tendo mais consumo. “Por outro lado, recebemos muitos turistas via Bonito, que vêm e voltam, por meio das agências de Bonito. Lagoa Misteriosa, Recanto Ecológico Rio da Prata, Buraco das Araras, Balneário do Assis vivem lotados e grande parte é comercializada via destino Bonito e Rota Pantanal-Bonito”.
Um levantamento da Fundação Neotrópica do Brasil aponta que, em Bonito, 50% dos empregos são gerados pelo ecoturismo. O presidente da Associação Comercial de Bonito, Márcio Carvalho, afirmou que toda a cidade depende do setor. “Todo o sistema é interligado, aumenta o dinheiro no turismo e acaba gastando no comércio”, disse.