Há situações em que a intervenção judicial torna-se imprescindível e pode até ser a chance de sobrevivência do paciente, que precisa enfrentar o colapso na saúde.
A incompatibilidade entre atos de gestão e decisões judiciais, baseadas em preceitos constitucionais, tem gerado conflitos e resultado numa série de determinações descumpridas pelopoder público. Por um lado, magistrados seguem o que preconiza a Constituição Federal, tendo a “saúde como direito de todos e dever do Estado (...)”. Por outro, os gestores enfrentam limitações orçamentárias que, na maioria das vezes, os impedem de ampliar investimentos. O chefe do Executivo acaba não tendo como acatar todas as ordens emitidas que, geralmente, apresentam caráter de urgência. No meio de todo esse impasse, o principal prejudicado continua sendo o paciente, que enfrenta constante descaso na rede pública.
É o que vem acontecendo em Campo Grande com várias decisões judiciais recentes. Só na área da saúde são ao menos cinco ordens descumpridas pelo prefeito Alcides Bernal. Uma delas, determina que nenhum paciente passe mais de 24 horas internado nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Corretíssimo. Todos sabem que a pessoa terá atendimento com mais qualidade no hospital. A solução não é tão simples. Constantemente, todos os leitos estão ocupados e pacientes precisam ficar em macas nos corredores. Isso quando conseguem atendimento. Há sobrecarga de atendimento dos pacientes que vêm do interior do Estado e, por isso, complica ainda mais tentar responsabilizar apenas a administração municipal.
Atender a essa ordem judicial exigiria recursos financeiros para melhorar o atendimento nos hospitais, ampliando número de leitos e de profissionais da saúde. Ainda, seria importante aperfeiçoar a central de regulação, para otimizar o direcionamento de vagas. São temas constantemente debatidos, demandas repetidas há bastante tempo, mas que, pela complexidade, ainda não foram acatadas. Certamente, qualquer gestor gostaria de exaltar que, durante sua administração, não houve mais espera por transferência para hospitais. Mas, diante da negativa sobre leitos disponíveis, tomará qual providência? Se recorre com frequência às vagas particulares (também nem sempre disponíveis) pode extrapolar os limites de gastos e não conseguir fechar as contas. Aí, novamente, estará se tornará alvo da Justiça, por estar descumprindo a legislação.
Certamente, há situações em que a intervenção judicial torna-se imprescindível e pode até ser a chance de sobrevivência do paciente, que precisa enfrentar o colapso na saúde. O descaso está evidente nos medicamentos em falta nas unidades de saúde ou nos exames suspensos porque a prefeitura deixou de comprar reagentes. Tratam-se de serviços essenciais, que sempre foram oferecidos. Comete-se grave erro na condução da política de saúde, deixando de investir na prevenção. Essa negligência hoje custará ainda mais cara no futuro, pois problemas mais graves poderiam ser evitados.
Infelizmente, constróem-se prédios sem equipá-los ou sem contratar profissionais suficientes. O desperdício deve ser combatido. As mazelas não serão resolvidas em passe de mágica e, por isso, o cumprimento às decisões judiciais continua sendo protelado. É preciso bom senso para atender às urgências, principalmente quando se trata de saúde, com vigilância às reais prioridades de gastos do dinheiro público.


