Artigos e Opinião

ARTIGO

Luiz Henrique Mandetta: "Plano de Saúde Popular é ilegal"

Deputado federal, médico, membro da Frente Parlamentar da Saúde, presidiu a Subcomissão de Saúde Suplementar

Redação

23/03/2017 - 02h00
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O precursor dos direitos do consumidor foi o presidente dos Estados Unidos John Kennedy, em 1962, para proteger o consumidor com base em quatro pilares: direito à segurança, direito à informação, direito à escolha e direito a ser ouvido. No Brasil, uma das maiores reivindicações dos consumidores brasileiros, também como cidadãos, é o acesso ao atendimento à saúde de qualidade.

Neste mês, surgiu a proposta do Plano de Saúde Popular, enviada pelo Ministério da Saúde à Agência Nacional de Saúde (ANS) para decidir sobre a pertinência e a legalidade, bem como tomar as providências cabíveis. E os consumidores que clamam por acesso à saúde recebem como presente de grego três modalidades de contratação: o plano de saúde simplificado, o plano ambulatorial com hospitalar e o plano em regime misto de pagamento.

Reunir 20 instituições ligadas à saúde complementar para apresentar proposta de Plano de Saúde Popular não poderia gerar um resultado diferente do que foi apresentado à ANS. A redação foi elaborada pela ótica das operadoras de planos, pensando no equilíbrio financeiro a ser atingido ao diminuir a cobertura do plano. Mas esse caminho a história da trajetória dos planos de saúde no Brasil já mostrou que não funciona. 

Primeiro, essa proposta é oriunda de um grupo de trabalho formado pelo Ministério da Saúde que não tem competência legal. Esse debate, para ser travado com competência, deve ser feito na Câmara e no Senado, porque estamos tratando da Lei 9.656, que foi aprovada em 1998 – uma legislação que surgiu para regulamentar um setor que era feito basicamente entre partes interessadas, não havia nenhuma garantia de direitos. Só que a Medicina evoluiu a passos largos com as novas tecnologias e o tratamento das doenças expandiu em várias frentes. As coberturas não acompanhavam esse crescimento e os contratos ficavam caducos. 

O início foi muito conturbado porque houve uma mudança na legislação. O mercado se acomodou. Contudo, num período de crise econômica com cancelamento em massa dos planos privados, forma-se o cenário ideal para começar a surgir esse tipo de proposta, mas que guarda o mesmo vício, o mesmo problema na sua origem. Não se fala em planilhas de custo, não se fala no lucro das empresas. Sempre que se fala em programas “ditos populares”, fala-se em reduzir a cobertura, vamos dar menos atenção à saúde e aumentar a coparticipação.

Outro grande erro da proposta do Ministério da Saúde é o de intensificar o ganho dos planos de saúde no varejo e, quando chega a hora de atender os problemas de média e alta complexidade, de colocar a mão no bolso, os planos de saúde jogam a conta para o contribuinte pagar. E, para piorar, o maior garoto-propaganda para plano de saúde popular é o SUS. Vende-se a ideia de que um plano mais acessível livrará os usuários das longas filas do SUS porque institucionalizou-se a não expansão do sistema de saúde, principalmente na área hospitalar. Vai haver uma falsa sensação, porque o plano popular é pensado para uma atenção básica, e a atenção básica quem tem que promover, e já promove pelo programa Saúde da Família, é o SUS. 

Mas a regulamentação de planos de saúde por esse viés só tem um caminho: o da judicialização. Qualquer alteração com relação aos planos de saúde, o espaço legal para conduzir o debate ouvindo todos os lados que são atingidos pela regulamentação, principalmente o consumidor, é o parlamento. Porque, se isso nascer de uma portaria ou de uma resolução da Agência Nacional da Saúde, estará imediatamente judicializado no primeiro episódio. Esse debate fora do parlamento não prospera. 

Podemos melhorar a regra que existe hoje? Com certeza, sim. É uma lei de 1998, o mercado pode ter necessidade de algumas flexibilizações que precisam ser analisadas, mas isso tem de ser feito dentro do Poder Legislativo, com amplo debate. Até porque, quem vai pagar as contas no final será o consumidor, que vai ter a falsa sensação de cobertura e, quando precisar de um procedimento mais caro, ele não o terá.

EDITORIAL

Propag: uma decisão que dura décadas

O secretário de Estado de Fazenda de Mato Grosso do Sul pode até decidir o que prefere destacar, o que não pode é decidir o que a sociedade tem o direito de conhecer

16/12/2025 07h15

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O Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) foi desenhado para revisar termos das dívidas estaduais e permitir quitação em até 30 anos, com encargos menores, atrelando parte do alívio fiscal a investimentos e mecanismos de equalização federativa.

O prazo de adesão termina no dia 31. Trata-se, portanto, de uma decisão com efeitos fiscais, políticos e institucionais de longo prazo.

É justamente por isso que causa estranheza quando um movimento dessa magnitude parece avançar sem publicidade compatível com o tamanho do que está em discussão. Ainda que os ritos formais estejam cumpridos, e o Diário Oficial exista para isso, há decisões que não se esgotam no “publicou e pronto”.

A adesão ao Propag mexe com dívida e espaço fiscal, e isso exige mais do que um carimbo burocrático: exige explicação, justificativa e escrutínio.

Matéria publicada pelo Correio do Estado apontou que a adesão pode ser benéfica e abrir folga fiscal bilionária para os próximos anos. Se isso ocorrer na prática, melhor ainda.

Mas, justamente por ser uma oportunidade desse porte, não faz sentido que a sociedade seja informada por textos que parecem exigir esforço de “investigação”, recortes, vazamentos, boatos e notas lacônicas para compreender o básico. Decisão pública não pode depender de rumor para vir a conhecimento.

O secretário não é apenas o gestor do caixa, é, por definição, o guardião das chaves do cofre e da confiança do governador.

Seu dever não é somente buscar a melhor alternativa financeira, mas assegurar que a população, o Legislativo e os órgãos de controle entendam o que está sendo feito – por que, com quais condições, com quais impactos e com quais riscos.

Publicidade, aqui, não é uma peça de marketing nem release, muito menos demanda jornalística, quando se dão ao luxo de responder, é transparência, informação completa, tempestiva e verificável sobre atos que mexem com o dinheiro de todos.

Quando uma medida desse porte avança sem clareza por parte do secretário, o problema deixa de ser meramente jurídico e passa a ser de transparência. O silêncio produz um efeito inevitável: parece tentativa de fugir de perguntas. E perguntas são inevitáveis e legítimas.

Quais são os termos efetivos da adesão ao Propag? Há contrapartidas obrigatórias? Quais metas de investimento são exigidas e em quais prazos? Que impacto a adesão ao programa traz para a capacidade de investimento do Estado nos próximos anos? Há cláusulas que podem amarrar decisões futuras? Serão oferecidos ativos com lastro? Se sim, quais? Como foram avaliados? Quem avaliou? Esse tipo de compromisso atravessa mandatos e o que ficará para a próxima geração.

Boa governança começa pelo óbvio: se a decisão é boa, não há motivo para tratá-la sob reserva. Pelo contrário, quem tem convicção expõe os fundamentos, abre números, apresenta cenários e convida ao debate. Transparência não atrapalha, transparência protege a própria decisão.

Nada disso impede a adesão ao Propag, pelo contrário, torna a adesão mais legítima e menos vulnerável a ruídos. O que fragiliza não é a discussão, é o vazio de explicações.

O secretário precisa compreender que publicidade não é um favor à imprensa nem ao cidadão, é um dever institucional. É a materialização do princípio de que o erário não pertence a gabinete nenhum, pertence à sociedade.

Se o Propag é uma oportunidade, que seja tratado como tal: com informações completas. Se o secretário quer ser reconhecido como pilar de responsabilidade, não pode agir como se decisões fiscais estruturantes fossem assunto restrito a poucos. Confiança é ativo que não se negocia e, uma vez perdida, dificilmente se reconquista. 

ARTIGOS

Relaxa: você não precisa ter opinião sobre tudo

Estudo recente sobre comportamento em comunidades digitais revelou que quando alguém percebe que a opinião é minoritária, tende a manter o silêncio

15/12/2025 07h45

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Existe uma ansiedade silenciosa no ar: a sensação de que você deveria ter uma opinião pronta para cada assunto que aparece no feed. Um acontecimento político numa terça, um comentário de influencer numa quarta, uma treta musical na quinta.

E se você não fala nada, parece que está sendo omisso, alienado, cúmplice ou qualquer outra palavra grande que as redes adoram jogar. Mas a pergunta que vale mais do que todas as indignações do dia é simples: quem disse que você precisa opinar sobre tudo?

A verdade é que a internet criou uma espécie de olimpíada de opiniões. E a largada é dada a cada nova notificação. Só que, quando você olha os números, percebe que esse universo não é tão povoado quanto parece.

Uma pesquisa mostrou que 55% dos americanos já deixaram um comentário on-line em algum momento e 77,9% já leram comentários. Significa que tem muita gente olhando, mas só metade de fato escrevendo alguma coisa.

Quando se vai para os jovens, 55% dizem postar opiniões com frequência e 71% afirmam estar mais confiantes do que nunca para fazê-lo. De novo, parece muito, mas não é todo mundo. É só uma parte barulhenta.

Do outro lado tem um dado incômodo. Um estudo recente sobre comportamento em comunidades digitais mostra que, quando alguém percebe que a opinião dele é minoritária, 72,6% simplesmente ficam em silêncio.

A espiral do silêncio continua funcionando mesmo num ambiente que promete liberdade absoluta para falar o que quiser. Ou seja, o barulho das redes às vezes é menos democracia e mais repetição. A impressão de que “todo mundo está falando” pode ser só a repetição de um mesmo grupo de pessoas com muita disposição e pouco cansaço.

E vale lembrar que esse palco é enorme. O mundo tem 63,9% da população usando redes sociais. É muita gente. São horas diárias rolando tela, consumindo milhares de pequenos estímulos. Nesse ambiente, a opinião virou quase um gesto automático.

Às vezes você nem sabe exatamente o que pensa, mas já sente a pressão de ter que dizer alguma coisa. Ser rápido se tornou mais importante do que ser cuidadoso. E isso tem consequência.

Opinar o tempo todo transforma a discussão pública em uma competição permanente. Você não compartilha uma ideia, você disputa espaço. E existe um dado que mostra o quanto isso escalou: em uma pesquisa internacional, 20% das pessoas disseram que às vezes é necessário ser rude nas redes para que sua opinião seja ouvida.

Um quinto das pessoas já acredita que a forma de existir no debate é gritando. Não tem nada de saudável nisso. Só desgaste.

Talvez seja por isso que, silenciosamente, muita gente está cansada. Opinar sobre tudo virou um tipo de exaustão emocional. Até porque, para opinar sobre tudo, é preciso estar o tempo todo sabendo de tudo. E começar a falar menos pode não ser um gesto de covardia, mas de inteligência.

Você não precisa ser comentarista integral do mundo. Pode escolher onde sua voz realmente importa. Pode esperar. Pode investigar. Pode até mudar de ideia sem precisar explicar isso para ninguém.

Quando quase metade das pessoas não comenta e três quartos se calam quando acham que estão sozinhas, significa que o silêncio não é falta de interesse. É um pedido de pausa. É uma escolha. Não é uma desistência do debate, é só uma forma de não ser engolido por ele.

A ideia de que você precisa ter opinião sobre tudo é só mais uma pressão inventada pela lógica das plataformas. Você não é obrigado a entrar em todas as conversas. Nem deve. O valor da sua voz não está na frequência, está na relevância.

E, às vezes, a decisão mais lúcida é ficar quieto por alguns minutos, horas ou dias. Porque pensar é um processo mais lento do que postar. E tem coisas que não precisam de urgência. Precisam de reflexão. Aliás, a maioria delas.

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