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Meta e o crime organizado digital no Brasil: tecnologia cúmplice das fraudes financeiras

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O Brasil enfrenta hoje uma das maiores ondas de fraudes financeiras digitais de sua história. Milhares de pessoas têm sido enganadas por falsas corretoras de investimento, que prometem lucros rápidos, plataformas sofisticadas e uma suposta segurança institucional. Por trás desses golpes, existe um elo perturbador: o uso massivo das ferramentas da Meta Platforms Inc. – controladora do Facebook, Instagram e WhatsApp – como meio estruturante dessas fraudes.

Não estamos diante de incidentes pontuais, mas de um verdadeiro modelo industrial de crime digital. Organizações criminosas transnacionais operam em escala, utilizando inteligência artificial, vídeos com deepfakes de personalidades conhecidas e algoritmos de publicidade hipersegmentada para atingir os mais vulneráveis: aposentados, trabalhadores endividados e pequenos investidores em busca de renda extra.

Esses grupos atuam como instituições financeiras clandestinas, captando recursos do público, prometendo rentabilidades irreais e intermediando operações ilegais, sem nenhuma autorização dos órgãos reguladores. A viabilidade desse modelo está diretamente ligada à omissão da principal plataforma de distribuição: a Meta.
A empresa não apenas permite a disseminação desses conteúdos, como lucra com eles. A cada clique patrocinado, a cada campanha financiada com dinheiro oriundo das próprias vítimas, a Meta arrecada. Mesmo após diversas denúncias, reportagens investigativas e alertas técnicos, os anúncios fraudulentos continuam sendo veiculados.

Essa permanência sistemática dos anúncios reflete um fenômeno conhecido como “cegueira deliberada”: a escolha consciente de não agir, mesmo dispondo de meios técnicos e informações suficientes para barrar crimes em andamento. A Meta detém recursos sofisticados de inteligência artificial, ferramentas de moderação automatizada e análises comportamentais altamente precisas. No entanto, opta por priorizar a venda de anúncios, ainda que isso custe a segurança dos usuários brasileiros.

Essa omissão não é passiva – é cúmplice. A empresa pode ser responsabilizada criminalmente por sua participação indireta na operação de instituições financeiras clandestinas, crime previsto na legislação penal brasileira. Ao fornecer o meio, lucrar com a operação e ignorar deliberadamente sua natureza ilegal, a Meta contribui para o êxito da fraude. Trata-se de um típico caso de dolo eventual: a empresa tinha plena consciência do risco de estar facilitando crimes e, mesmo assim, aceitou esse risco em nome do lucro.

Isso não é um ataque à liberdade de expressão. É uma chamada à responsabilidade de quem, ao oferecer uma estrutura tecnológica poderosa, decide fechar os olhos para o sofrimento alheio – desde que o caixa continue cheio. A Meta, como uma das empresas mais influentes do planeta, precisa entender que operar no Brasil significa também submeter-se às leis brasileiras, inclusive às penais.

O combate às fraudes digitais exige mais do que regulação: exige coragem. Coragem para enfrentar não apenas os golpistas que atuam nas sombras, mas também os gigantes tecnológicos que, à luz do dia, fornecem palco, plateia e bilheteria para que esses crimes prosperem.

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EDITORIAL

As bolhas que nos afastam da realidade

Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis

17/12/2025 07h15

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A expressão “estar em uma bolha” deixou de ser apenas uma gíria de internet para se transformar em um retrato cada vez mais fiel da forma como a sociedade vem se organizando. Nas redes sociais, algoritmos direcionam conteúdos, opiniões e notícias de acordo com preferências previamente identificadas.

O resultado é um ambiente confortável em que quase tudo confirma aquilo que o indivíduo já pensa. Divergir passa a ser exceção e confrontar ideias, um incômodo evitado.

Fora do ambiente digital, a lógica das bolhas também se impõe. O isolamento crescente em condomínios fechados, verticais ou horizontais, reduz o contato cotidiano com o diferente. Ao limitar o convívio, o indivíduo perde a oportunidade de compreender realidades distintas da sua própria.

Torna-se, ao mesmo tempo, mais desconfiado e mais desinformado, conhecendo o mundo mais pelo “ouvir dizer” do que pela experiência direta. A realidade passa a ser filtrada, editada e, muitas vezes, distorcida.

As bolhas criam falsas impressões. Quando se consolidam em grupos, reforçadas pelo sentimento de pertencimento, geram uma perigosa falta de sintonia com o restante da sociedade. Problemas coletivos passam a ser relativizados, minimizados ou simplesmente ignorados.

A empatia dá lugar à autoproteção e o interesse público acaba substituído pela preservação de privilégios.

Nesta edição, mostramos um exemplo concreto dessa desconexão: o aumento do duodécimo para quase todas as instituições de Mato Grosso do Sul, mesmo após um ano marcado por crise financeira, enquanto cresce a sobrecarga sobre o Poder Executivo.

É sobre ele que recai, de forma quase exclusiva, o peso de enfrentar as dores reais da sociedade: da falta de recursos para serviços essenciais às demandas crescentes por saúde, educação, transporte e assistência social.

Essa discrepância orçamentária não é apenas um dado técnico. Ela reforça as bolhas institucionais. Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis.

Trata-se de um desequilíbrio que aprofunda a sensação de injustiça e distancia ainda mais as instituições da realidade vivida pela população.

Seria desejável que integrantes das instituições que recebem repasses de duodécimo saíssem de suas bolhas. Que vivessem mais intensamente a realidade fora de gabinetes, relatórios e planilhas.

Que entendessem que, em tempos de dificuldades financeiras, reforçar privilégios e ampliar confortos institucionais não é apenas insensível, é socialmente injusto.

Romper bolhas não é simples, mas é necessário. Para indivíduos, para grupos e, sobretudo, para instituições públicas. A democracia e a justiça social exigem mais contato com a realidade concreta e menos acomodação em mundos protegidos. Caso contrário, seguiremos administrando percepções, e não problemas reais.

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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