Artigos e Opinião

Editorial

O ajuste fiscal que a Capital precisava

O ajuste fiscal não é um fim em si mesmo, mas um meio para que Campo Grande volte a sonhar alto e entregar resultados concretos à população

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Seis meses após a posse, a prefeita Adriane Lopes enfim enviou à Câmara Municipal medida que deveria ter sido apresentada já no primeiro dia útil do novo mandato: um pacote de ajuste fiscal para reorganizar as finanças da Capital. Era um gesto aguardado desde fevereiro, não apenas por vereadores ou servidores públicos, mas por toda a sociedade campo-grandense, ciente de que os desequilíbrios fiscais vinham se acumulando há anos.

A verdade é que o ajuste fiscal era necessário há muito tempo. Campo Grande passou a última década operando no limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, com sucessivos alertas sobre o comprometimento das receitas com pessoal. Em alguns momentos, a cidade se tornou refém de uma máquina pública inflada, servindo de abrigo para contratações políticas, e não como instrumento de eficiência administrativa. O resultado foi a deterioração dos serviços e a perda da capacidade de investimento.

Com a economia local mostrando sinais de vitalidade, o que faltava era exatamente um governo capaz de colocar a casa em ordem. Campo Grande não carece de recursos, mas de boa gestão. E, nesse sentido, o pacote aprovado pela Câmara é um primeiro passo importante. Ao atrelar o crescimento das despesas à inflação do ano anterior, o município sinaliza compromisso com a responsabilidade fiscal – um recado claro aos credores e potenciais financiadores.

A medida tem peso simbólico e prático. Simbólico, porque representa uma ruptura com a cultura do improviso e do gasto desenfreado. Prático, porque permite ao município acessar linhas de crédito e financiamentos com a garantia da União – algo essencial para retomar obras, modernizar a infraestrutura e atender às demandas históricas da população.

É claro que o ajuste não resolve tudo. Será preciso zelo na execução orçamentária, transparência na alocação dos recursos e, sobretudo, disciplina para cumprir as metas estabelecidas. A nova lei permite cortes em despesas de custeio e pessoal, mas não mexe em áreas sensíveis como saúde e educação, o que é positivo. O foco agora deve ser a melhoria da eficiência nos serviços públicos.

Campo Grande precisa de um novo ciclo, sustentado por finanças organizadas e planejamento de longo prazo. Se esse ajuste for levado a sério, os resultados podem ser surpreendentemente rápidos, justamente porque a capital sul-mato-grossense tem uma economia vibrante, empreendedora e com enorme potencial de crescimento.

A cidade merece encontrar, neste novo momento, o rumo certo – um rumo de responsabilidade, investimento e prosperidade compartilhada. O ajuste fiscal não é um fim em si mesmo, mas um meio para que Campo Grande volte a sonhar alto e entregar resultados concretos à população. Esperamos que, desta vez, a oportunidade não seja desperdiçada.

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EDITORIAL

As bolhas que nos afastam da realidade

Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis

17/12/2025 07h15

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A expressão “estar em uma bolha” deixou de ser apenas uma gíria de internet para se transformar em um retrato cada vez mais fiel da forma como a sociedade vem se organizando. Nas redes sociais, algoritmos direcionam conteúdos, opiniões e notícias de acordo com preferências previamente identificadas.

O resultado é um ambiente confortável em que quase tudo confirma aquilo que o indivíduo já pensa. Divergir passa a ser exceção e confrontar ideias, um incômodo evitado.

Fora do ambiente digital, a lógica das bolhas também se impõe. O isolamento crescente em condomínios fechados, verticais ou horizontais, reduz o contato cotidiano com o diferente. Ao limitar o convívio, o indivíduo perde a oportunidade de compreender realidades distintas da sua própria.

Torna-se, ao mesmo tempo, mais desconfiado e mais desinformado, conhecendo o mundo mais pelo “ouvir dizer” do que pela experiência direta. A realidade passa a ser filtrada, editada e, muitas vezes, distorcida.

As bolhas criam falsas impressões. Quando se consolidam em grupos, reforçadas pelo sentimento de pertencimento, geram uma perigosa falta de sintonia com o restante da sociedade. Problemas coletivos passam a ser relativizados, minimizados ou simplesmente ignorados.

A empatia dá lugar à autoproteção e o interesse público acaba substituído pela preservação de privilégios.

Nesta edição, mostramos um exemplo concreto dessa desconexão: o aumento do duodécimo para quase todas as instituições de Mato Grosso do Sul, mesmo após um ano marcado por crise financeira, enquanto cresce a sobrecarga sobre o Poder Executivo.

É sobre ele que recai, de forma quase exclusiva, o peso de enfrentar as dores reais da sociedade: da falta de recursos para serviços essenciais às demandas crescentes por saúde, educação, transporte e assistência social.

Essa discrepância orçamentária não é apenas um dado técnico. Ela reforça as bolhas institucionais. Enquanto uma parte do Estado amplia suas zonas de conforto, outra é pressionada a fazer mais com menos, arcando com o desgaste político e social das escolhas difíceis.

Trata-se de um desequilíbrio que aprofunda a sensação de injustiça e distancia ainda mais as instituições da realidade vivida pela população.

Seria desejável que integrantes das instituições que recebem repasses de duodécimo saíssem de suas bolhas. Que vivessem mais intensamente a realidade fora de gabinetes, relatórios e planilhas.

Que entendessem que, em tempos de dificuldades financeiras, reforçar privilégios e ampliar confortos institucionais não é apenas insensível, é socialmente injusto.

Romper bolhas não é simples, mas é necessário. Para indivíduos, para grupos e, sobretudo, para instituições públicas. A democracia e a justiça social exigem mais contato com a realidade concreta e menos acomodação em mundos protegidos. Caso contrário, seguiremos administrando percepções, e não problemas reais.

ARTIGOS

A Interpol e as lições do roubo ao Louvre: quando a cultura exige proteção global

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural

16/12/2025 07h45

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A Interpol é amplamente reconhecida por seus sistemas de avisos e pela atuação no combate ao crime organizado transnacional.

O recente episódio envolvendo o Louvre, porém, recoloca em evidência um ponto ainda subestimado no debate público: crimes não violentos, como o roubo de bens culturais, também demandam tutela internacional qualificada.

O tráfico de obras de arte e de patrimônio histórico segue sendo um delito de baixo risco e alto lucro, alimentado pela opacidade do mercado e pela fragmentação das respostas estatais.

O que alguns insistem em tratar como luxo é, na verdade, expressão de identidade coletiva, memória histórica e soberania cultural. A Interpol parte dessa premissa, ao reconhecer a cultura como interesse jurídico protegido, merecedor da mesma atenção dedicada à vida, à segurança e à integridade física.

Nesse contexto, o Banco de Dados de Obras de Arte Roubadas da organização cumpre papel central: dar rastreabilidade a um mercado em que o patrimônio cultural pode, com facilidade, converter-se em saque.

A existência do banco de dados não é apenas simbólica. Ela permite a identificação de peças subtraídas, inibe a circulação ilícita e oferece suporte técnico às investigações nacionais.

Ainda assim, a eficácia do sistema depende de algo que nem sempre acompanha a velocidade do crime: cooperação internacional efetiva e compartilhamento ágil de informações entre agências de aplicação da lei.

Há espaço evidente para aprimoramentos. A ampliação do banco de dados com atualizações em tempo real, a integração mais ampla de museus, casas de leilão e colecionadores privados, além de protocolos obrigatórios de verificação de procedência, fortaleceriam significativamente o combate ao tráfico ilícito.

Do mesmo modo, penalidades mais rigorosas e treinamento especializado para forças policiais e autoridades alfandegárias são medidas indispensáveis para reduzir a atratividade econômica desse tipo de crime.

O episódio do Louvre serve como alerta. Proteger bens culturais não é capricho elitista nem pauta secundária: é defesa da memória, da identidade e do patrimônio comum da humanidade.

Quando uma obra é roubada, perde-se mais do que um objeto, perde-se um fragmento da história coletiva. A resposta, portanto, precisa ser global, coordenada e à altura desse valor.

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