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Vitória das mães autônomas e as novas regras do salário-maternidade

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O Supremo Tribunal Federal (STF) deu um passo fundamental para a equidade de direitos entre mulheres trabalhadoras ao declarar inconstitucional a exigência de 10 contribuições para que seguradas autônomas tivessem acesso ao salário-maternidade. Em resposta, o INSS publicou a Instrução Normativa nº 188/2024, eliminando a carência mínima e garantindo o benefício a partir de uma única contribuição, equiparando as autônomas às trabalhadoras com carteira assinada.

Trata-se de uma reparação histórica. Durante mais de duas décadas, a Lei nº 9.876/1999 impôs critérios desiguais para mulheres em situação idêntica de maternidade, em nítida violação ao princípio da isonomia. O artigo 25 da norma – agora derrubado por 6 votos a 5 na ADI nº 2.110 – exigia das autônomas, incluindo MEIs e contribuintes facultativas, ao menos 10 contribuições mensais. Já às empregadas com registro bastava apenas uma.

A decisão, ainda que tardia, corrige uma distorção jurídica grave. A maternidade jamais poderia ter sido tratada como privilégio de quem detém vínculo formal de trabalho. O nascimento de um filho acarreta o mesmo impacto físico, emocional, social e financeiro para todas as mulheres, independentemente da forma como contribuem para a Previdência Social.

A instrução normativa do INSS representa avanço não só jurídico, mas também social. Todas as seguradas que requererem o salário-maternidade a partir de 5 de abril de 2024 – data da publicação do acórdão do STF – não precisam mais cumprir carência. Além disso, aquelas que tiveram o benefício negado nesse período podem pedir revisão administrativa pelo Meu INSS ou recorrer ao Judiciário. Até pedidos ainda em análise poderão ser revisados à luz do novo entendimento.

A mudança traz alívio para milhares de mulheres que, em um dos momentos mais vulneráveis da vida, encontraram portas fechadas na Previdência Social. Embora o governo estime um impacto imediato de R$ 2,7 bilhões em 2025 – com projeção de R$ 16,7 bilhões até 2029 –, o que se vê é um investimento em dignidade, proteção à infância e apoio efetivo às famílias brasileiras.

Mais do que custo, estamos diante da reparação de um direito fundamental. O salário-maternidade é uma proteção constitucional, assegurada não apenas às mães biológicas, mas também às adotantes, aos pais viúvos e aos casais homoafetivos que comprovem guarda ou adoção. O afastamento é de até 120 dias – podendo chegar a 180 dias em empresas participantes do Programa Empresa Cidadã – e, no caso das autônomas, o pagamento é responsabilidade direta do INSS.

O efeito prático da decisão será imenso, e a advocacia previdenciária terá papel crucial para orientar essas mães, garantindo que a conquista não fique restrita ao papel. Importante ressaltar que a decisão do STF tem repercussão geral, ou seja, deve ser observada pela administração pública em todo o País. O Judiciário, inclusive, poderá e deverá intervir sempre que o INSS deixar de cumprir esse novo entendimento.

Além de reparar um erro histórico, o julgamento lança luz sobre um debate essencial: a necessidade urgente de modernizar a legislação previdenciária, adequando-a às novas formas de trabalho. Vivemos uma era de empreendedorismo, gig economy e trabalhos autônomos. Ignorar essa realidade significa perpetuar injustiças. A sociedade brasileira é múltipla, e a legislação não pode seguir penalizando quem empreende ou trabalha de forma informal.

Essa decisão também alerta para um ponto crítico: reformas legislativas, quando mal desenhadas sob o pretexto de equilíbrio financeiro, acabam gerando exclusões inconstitucionais. O salário-maternidade vai além de benefício previdenciário – é instrumento de justiça social, proteção à infância e redução da desigualdade de gênero.

Por tudo isso, a vitória no STF é muito mais do que uma mudança normativa: é o reconhecimento do valor da maternidade em todas as suas formas e um marco civilizatório no sistema de seguridade social. Com vigilância jurídica e atuação firme da advocacia, é possível assegurar que nenhuma mãe seja novamente discriminada ou privada de proteção justamente no momento em que mais necessita.

Essa é uma vitória das mulheres brasileiras – especialmente daquelas que constroem o País a partir do próprio esforço. Que seja também um alerta para que o Direito Previdenciário caminhe lado a lado com a dignidade, a equidade e o respeito às novas realidades do trabalho.

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EDITORIAL

Judiciário não é palco nem mercado

Restringir a atuação como coach e impor limites a determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental

13/12/2025 07h15

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A decisão do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Edson Fachin, de proibir que magistrados atuem como coaches, seja nas redes sociais ou fora delas, não é apenas correta como necessária.

Trata-se de um freio institucional que chega em boa hora a um Judiciário que, nos últimos anos, tem convivido com excessos de exposição, vaidade e práticas que colocam em xeque a sobriedade exigida da magistratura.

Não é de hoje que esse limite vem sendo testado.

Há cerca de dois anos, causou perplexidade o caso de um ex-juiz federal que passou a vender cursos na internet ensinando “táticas” para ganhar recursos judiciais. O paradoxo salta aos olhos: quem julgava recursos passou a faturar dinheiro “por fora” ensinando advogados a vencê-los.

Ainda que se alegue liberdade profissional após deixar a toga, a prática é, no mínimo, eticamente questionável e contribui para corroer a confiança da sociedade na imparcialidade do sistema de Justiça.

A medida de Fachin reconhece um problema real: tem faltado comedimento à parte da magistratura brasileira.

Em tempos de redes sociais, palestras remuneradas e cursos de viés mercadológico, alguns juízes parecem ter esquecido uma máxima antiga, simples e ainda extremamente atual: o lugar em que o magistrado mais deve falar é nos autos.

A autoridade da toga não se constrói com likes, seguidores ou discursos performáticos, mas com decisões técnicas, fundamentadas e discretas.

Restringir a atuação como coach e impor limites à determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental. Não se trata de censura nem de cerceamento da liberdade intelectual, mas de preservação da função jurisdicional.

O juiz não é um influenciador digital, tampouco um vendedor de fórmulas de sucesso processual. É agente do Estado, investido de poder para decidir conflitos com independência e imparcialidade.

Isso, porém, não significa defender um Judiciário hermético ou alheio à sociedade. Ao contrário: as cortes precisam, sim, se comunicar melhor nestes novos tempos, explicar decisões complexas, dialogar institucionalmente com a população e prestar contas de seu funcionamento. Comunicação institucional é necessária; autopromoção individual, não.

No fim das contas, o que está em jogo é o respeito à própria instituição. O Judiciário é, talvez, o Poder que mais precisa ser respeitado para que a democracia funcione. E esse respeito não é um privilégio – é uma obrigação que começa dentro de casa.

Seriedade, sobriedade e autocontenção não são virtudes acessórias para magistrados; são requisitos essenciais para quem exerce uma das funções mais sensíveis do Estado.

ARTIGOS

Novas regras do Banco Central sobre ativos virtuais: um marco de maturidade regulatória

Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo

12/12/2025 07h45

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Em 10 de novembro, o Banco Central do Brasil deu um passo histórico ao publicar as Resoluções BCB nº 519, nº 520 e nº 521, que inauguram um novo ciclo de regulação do mercado de ativos virtuais no País.

Com essas normas, o Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLD/FT).

Mais do que um conjunto técnico de regras, essas resoluções representam um amadurecimento institucional do sistema financeiro brasileiro diante da realidade cripto. Até então, o setor operava em uma zona cinzenta regulatória, com supervisão limitada e grande diferenças de informações entre prestadores e usuários.

Agora, o País passa a estabelecer bases claras para a operação de Sociedades Prestadoras de Serviços de Ativos Virtuais (Psav), além de definir, pela primeira vez, o tratamento cambial para operações internacionais com criptoativos.

A Resolução BCB nº 519/2025 impõe um padrão de governança que coloca as Psav sob um nível de exigência comparável ao das instituições financeiras. Exige-se segregação patrimonial, controles internos robustos e políticas de PLD/FT equivalentes às do sistema bancário.

Essa medida mitiga riscos de uso indevido dos recursos dos clientes e reduz o espaço para fraudes e práticas abusivas. Pontos sensíveis em um setor historicamente marcado por volatilidade e escândalos.

Já a Resolução BCB nº 520/2025 institui o processo de autorização prévia para funcionamento das Psav, com vedações expressas à oferta de crédito e à captação de recursos de clientes qualificados.

O objetivo é proteger investidores e garantir que as operações com criptoativos não contaminem o sistema financeiro tradicional com riscos de liquidez e solvência. A exigência de sede no Brasil e critérios rigorosos de idoneidade e gestão de riscos também reforçam o compromisso com a responsabilidade corporativa e a transparência operacional.

Por sua vez, a Resolução BCB nº 521/2025 corrige uma lacuna importante ao enquadrar as operações internacionais com criptoativos, como operações de câmbio, sempre que houver conversão de moeda ou transferência internacional de valores.

Essa regra coloca as transações de cripto sob a mesma lente de compliance cambial que rege outras formas de movimentação financeira internacional, prevenindo brechas para evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Para bancos e instituições financeiras, o novo marco regulatório representa tanto uma oportunidade quanto uma responsabilidade. A integração dos serviços com ativos virtuais ao portfólio bancário passa a ser viável, desde que sejam obedecidos os novos parâmetros de segurança, segregação de recursos e reporte regulatório.

Ao mesmo tempo, essas instituições terão de repensar suas estruturas de governança e compliance para acomodar o ecossistema cripto dentro de uma lógica de controle prudencial.

Alguns pontos, entretanto, merecem atenção especial: a vedação de crédito com recursos próprios em operações cripto, a segregação total de fundos de clientes, o reforço dos controles de PLD/FT, e o tratamento cambial obrigatório em transações internacionais.

Tais exigências sinalizam que o Banco Central, de maneira mais que devida e assertiva, pretende equilibrar o incentivo à inovação com a blindagem contra riscos sistêmicos e ilícitos financeiros.

Contudo, o período de adaptação será curto. As regras entram em vigor a partir de 2 de fevereiro de 2026 e as obrigações adicionais de reporte internacional passam a valer a partir de 4 de maio de 2026.

Empresas que já atuam no mercado precisam, portanto, iniciar imediatamente seus processos de adequação, revisando estruturas societárias, sistêmicas, políticas de custódia e mecanismos de compliance.

Por fim, as novas resoluções não devem ser vistas como um freio à inovação, mas como um sinal evidente de maturidade regulatória do País.

Ao oferecer um ambiente seguro, transparente e supervisionado, o Banco Central cria as condições para que o Brasil se consolide como um polo confiável de desenvolvimento em blockchain e ativos digitais. É o início de uma nova era em que a confiança institucional passa a ser o ativo mais valioso do universo cripto.

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