O juiz Marcelo Andrade Campos Silva, da 4ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos, condenou o Estado de Mato Grosso do Sul e o Município de Campo Grande, por danos morais e materiais aos pais da menina Sophia de Jesus Ocampo, assassinada aos dois anos de idade, pelo padrasto e pela mãe em janeiro de 2023.
A Justiça responsabiliza os órgãos por falhas na prestação do serviço público, quanto às denúncias de maus-tratos e às providências que haveriam de ter sido tomadas em relação à menina.
Jean Carlos Ocampo da Rosa, pai biológico, e Igor de Andrade Silva Trindade, pai afetivo, receberão indenização por danos morais no valor total de R$ 430 mil, sendo R$ 350 mil para Jean e R$ 80 mil para Igor, com atualização pela Taxa Selic.
Jean Ocampo, pai biológico da menina SophiaAlém da indenização por danos morais, a condenação inclui:
- pagamento de indenização por danos materiais, na forma de pensão na proporção de 70% para Jean e de 30% para Igor, do valor equivalente a 2/3 do salário-mínimo - de 02/06/2034 (quando Sophia completaria 14 anos) até a data de 02/06/2045 (quando a menina teria 25 anos). A partir desta data, o valor será reduzido para 1/3 do salário-mínimo, cessando definitivamente em 02/06/2095, quando Sophia estaria com 75 anos de idade, ou na data do óbito dos beneficiários, o que ocorrer primeiro, sem inclusão de 13º salário e abono de férias;
- o Estado e o Município terão que incluir Jean e Igor em folha de pagamento, a partir de junho de 2034, para o pagamento da pensão mensal na mesma data em que realizarem a contraprestação de seus servidores públicos, ficando cada um responsável ao pagamento de 50% do valor das pensões ora fixadas.
Entendimento da Justiça
Em relação a pensão vitalícia, com base no entendimento Superior Tribuinal de Justiça (STJ), mesmo que a vítima falecida seja menor de idade, se proveniente de uma família de baixa renda, entende-se que, quando fosse adulta, não deixaria os pais desamparados, razão pela qual estes teriam direito ao recebimento de pensão vitalícia.
A análise das provas produzidas nos autos conclui que, de fato, houveram seguidas e sucessivas falhas e omissões dos agentes públicos municipais e estaduais, durante e após os atendimentos das ocorrências envolvendo Sophia.
A Justiça alega que eles deixaram de tomar as providências mínimas efetivas para resguardar a segurança da criança, mesmo diante das várias denúncias realizadas pelo pai biológico, dos indícios materiais de maus-tratos e das lesões corporais múltiplas que vinha sofrendo, até culminar em seu assassinato.
Jean buscou constantes meios para fiscalizar a situação, mas foi encaminhado de um órgão para o outro, em jogo de empurra-empurra que se repete nas alegações de ambas as contestações, onde o Estado imputa a responsabilidade ao Município e vice-versa.
A decisão também levou em conta a situação econômica dos pais, bem como o montante do prejuízo moral sofrido, considerando que eles e a vítima tentaram, e aguardaram por um ano a tomada de medidas de proteção das autoridades competentes, enquanto a menor vivenciava constantes maus-tratos na casa da mãe.
O caso
No dia 26 de janeiro de 2023, Stephanie de Jesus da Silva, de 25 anos, levou a pequena Sophia de Jesus Ocampo para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Coronel Antonino, em Campo Grande. As enfermeiras que realizaram o primeiro atendimento constataram que a menina já apresentava rigidez cadavérica quando chegou à unidade.
Posteriormente, a perícia constatou que a criança havia morrido 7 horas antes de chegar à UPA. O laudo necroscópico do Instituto de Medicina e Odontologia Legal (Imol) indicou que Sophia morreu por um traumatismo na coluna causado por agressão física. Além das diversas lesões no corpo, a criança apresentava, ainda, sinais de estupro, causado por Christian Campoçano Leitheim, o padrasto de Sophia.
Os primeiros hematomas percebidos pelo pai biológico datam do final de 2021, e tornaram-se recorrentes até o assassinato. A mãe falava que os machucados eram referentes a quedas sofridas pela criança.
A partir de então, Jean e Igor buscaram inúmeras formas de fiscalizar a situação da criança, por meio do Conselho Tutelar e boletins de ocorrências na na Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente (DEPCA). Contudo, nenhuma providência fora tomada pelos órgão públicos competentes, seja municipais ou estaduais, para resguardar a integridade física de Sophia.
Stephanie de Jesus e Christian Campoçano


