Em mais uma “carona” em ata de registro de preços, a sexta, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) de Campo Grande fechou contrato com uma empresa paranaense para compra de instrumentos musicais que vão custar R$ 3,5 milhões aos cofres municipais, conforme informações disponibilizadas em edição extra do Diogrande desta sexta-feira (22). Este é o segundo contrato milionário com o mesmo empresário.
A licitação para o registro do preço dos instrumentos musicais foi realizada pela Associação dos Municípios da Microrregião do Médio Sapucaí (Amesp), uma entidade com sede na cidade mineira de Pouso Alegre e que agrega outros 27 municípios.
A empresa escolhida, que vai faturar exatos de R$ 3.533.579,00, é Brink Mobil Equipamentos Educacionais. Ela é controlada por Waldemar Ábila, empresário que também aparece como proprietário da Empresa Onda Pro Importadora de Multivariedades e Suprimentos, que no começo de novembro do ano passado fechou um contrato no valor de R$ 15,78 milhões para entrega de brinquedos e parquinhos às 205 escolas municipais de Campo Grande.
Em dezembro de 2019 este empresário paranaense foi um dos pivôs de uma operação do Ministério Público da Paraíba que resultou na prisão do ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho, e de uma série de servidores públicos e empresários por conta de indícios de cobrança de propina.
A prisão do ex-governador paraibano ocorreu em 19 de dezembro 2019, quando o MPE apontou desvios da ordem de R$ 134 milhões na administração estadual. Uma das empresas envolvidas era a Brink Mobil, que agora vai fornecer instrumentos musicais à Semed.
Essa empresa, conforme a investigação pontou à época, recebeu R$ 98.997.102,06 entre 2013 e 2018 do governo paraibano em contratos com a secretaria de educação, principalmente para entrega de material de robótica.
Na época, Ivan Burity, um dos delatores do esquema, relatou ao MPE que “após determinação de Livania, fui a Curitiba por meio de voo de carreira e me hospedei em um hotel próximo ao Centro Cívico (hotel Bristol). Fui até o escritório da Brink Mobil na Rua Ricardo Lemos 404, bairro Ahú, de táxi, à tarde, acertar detalhes da entrega do dinheiro e do voo de volta para João Pessoa”.
“Na oportunidade, fui informado por Waldemar que ele dispunha de um jatinho que decolaria de um aeroporto secundário em Curitiba a partir de um hangar de um amigo do genro dele (Waldemar), onde eu não precisaria me preocupar com fiscalizações. No dia seguinte, Waldemar foi ao Hotel Bristol, cedo da manhã, e me levou uma mala com aproximadamente R$ 1 milhão”, detalhou o delator.
“Esse dinheiro se referia a uma licitação realizada na Secretaria de Educação para aquisição de material de robótica. Ao encontrar com Waldemar no saguão do hotel, rumamos juntos para um aeroclube onde ele me direcionou a um hangar de onde embarquei em um jato e voei até o hangar do Estado da Paraíba em JPA. Detalhe: Fiquei preocupado com o desembarque, mas Livania me tranquilizou afirmando que o Governador Ricardo havia determinado que o chefe da Casa Militar (Coronel Chaves) iria comandar, pessoalmente, a operação. O que de fato ocorreu”.
Colocado em liberdade dois dias depois da prisão, Ricardo Coutinho passou a usar tornozeleira eletrônica e não foi julgado até hoje, mas uma série de ações tramitam na Justiça. Em 2020 chegou a disputar a prefeitura de João Pessoa, mas ficou em sexto lugar, com 10% dos votos.
O empresário empresário Waldemar Ábila e os demais denunciados na Operação Calvário- Juízo Final, considerado um dos maiores escândalos na política da Paraíba, também não foram julgados ainda.
CARONAS
Normalmente, a compra por meio de ata de registro de preços é para produtos de uso contínuo, como merenda escolar e material escolar e medicamentos. Por exemplo, se uma prefeitura precisa comprar canetas para as escolas, mas não sabe a quantidade exata que precisa, caso a demanda exceda o estimado, a prefeitura pode se beneficiar da Ata de Registro de Preços para adquirir um novo lote sem a necessidade de fazer um novo procedimento licitatório.
Porém, nos últimos meses a Semed utilizou este tipo de licitação em pelo menos seis oportunidades para compras que já somam pouco mais de R$ 127,3 milhões. Todas foram feitas com intermediação de consórcios de municípios das mais diferentes regiões do país.
Ao menos uma destas licitações, que resultou na compra de 166 salas modulares por R$ 42 milhões de um consórcio de Belo Horizonte, virou alvo de investigação do Ministério Público Estadual de Coxim. A promotoria recebeu denúncia de que a licitação foi uma espécie de “jogo de cartas marcadas”.
A previsão inicial era de que estas salas estivessem prontas e abrigassem 6,6 mil novos alunos no início do ano letivo, em 15 de fevereiro, mas até agora somente uma pequena parcela foi entregue. No caso deste contrato, a Semed pegou carona em uma ata de registro de preços coordenada pelo Cointa, um consórcio de municípios da região norte de Mato Grosso do Sul. E é esse consórcio que está na mira do MPE.
HISTÓRICO
No dia 24 de outubro do ano passado foi oficializada a assinatura de contrato da Semed pegando carona com um consórcio de municípios paulistas para investir R$ 27,3 milhões na aquisição de mobília escolar. O fornecedor escolhido foi a empresa paulista Maqmóveis.
Depois, no dia 7 de novembro, foi publicado no Diogrande o investimento de R$ 7,44 milhões para compra de notebooks. Desta vez, a carona foi em uma Ata de Registro de Preços do Consórcio Intermunicipal Multifinalitário para o Desenvolvimento Ambiental Sustentável do Norte de Minas (Codanorte). A empresa fornecedora foi a Trema Brasil.
Quatro dias depois, em 11 de novembro, saiu a publicação no Diogrande informando que a Semed estava investindo R$ 15,7 milhões na compra dos parquinhos e brinquedos. A compra foi feita pegando carona com o Consórcio Público Prodnorte, formado por 12 prefeituras da região norte do Espírito Santo. O fornecedor escolhido para entregar os R$ 15.782.830,49 em brinquedos e parquinhos foi o Onda Pro Importadora e Multivariedades Suprimentos.
Mais adiante, em 15 de dezembro, a Semed pegou “carona” em uma ata de registro de preços e fechou contrato de R$ 34.966.189,39 com a empresa Nexsolar para instalação de equipamentos de energia solar nas 205 escolas da rede.
Desta vez, os preços foram registrados pelo Consórcio Público da Região Nordeste do Estado do Espírito Santo e têm validade por um ano, a partir de 6 de julho de 2023. E, apesar de a ata ter sido registrada no Estado do Sudeste, a empresa vencedora é de Campo Grande, com sede na Rua 1º de Maio.
O Correio do Estado entrou em contato com a assessoria da prefeitura de Campo Grande para obter detalhes sobre o contrato para compra dos instrumentos musicais. Além disso, buscou explicações sobre as razões que levaram a Semed a abrir mão da licitação tradicional e optar pela adesão à ata de registro de preços feito pelo consórcio mineiro. Se houver retorno, as informações serão acrescentadas.
NOTA DA SEMED
Nesta segunda-feira (25), a assessoria de comunicação da prefeitura de Campo Grande enviou a seguinte nota.
"A Secretaria Municipal de Educação (Semed) informa que a aquisição de instrumentos musicais visa compor as bandas de fanfarras das escolas municipais. A adesão à ata de registro de preços se fez necessária para garantir a viabilidade e celeridade do processo, e garante a entrega rápida dos instrumentos às escolas.
A Semed reconhece a importância da música na educação e acredita que a aquisição de novos instrumentos musicais contribuirá para a formação integral dos alunos, além de fomentar a cultura e a cidadania. As salas modulares, por sua vez, ampliaram a capacidade de atendimento das escolas e oferecerão melhores condições de ensino e aprendizagem para os alunos, além de fomentar a cultura e a cidadania. É um projeto para o intuito de montar banda musical em todas as escolas municipais.
São 100 escolas que irão receber os instrumentos, sendo 11 tipos: tuba (1 kit), eufônio (1 kit), trombone de marcha (4 kits), trompetes (4 kits), trompa de marcha (1 kit), par de pratos (1 kit), bumbo (1 kit), caixa tenor de marcha (1 kit), caixa tenor de marcha de aro duplo (1 kit), tambor de fanfarra alfaia (1 kit), estantes para partitura (16 kits) e assim formados por 100 kits cada.
A Secretaria reforça seu compromisso com a educação de qualidade e com a transparência na gestão dos recursos públicos.
Em relação às salas modulares, a Semed informa que elas estão sendo utilizadas conforme a entrega feita pela empresa responsável. A instalação está acontecendo de forma gradual, de acordo com a capacidade de cada escola em recebê-las e adaptá-las às suas necessidades. Entre as unidades escolares que já fazem uso dessas salas, está a Escola Municipal Plínio Barbosa Martins, Escola Municipal José Mauro Messias da Silva, Escola Municipal Maria Regina de Vasconcelos Galvão, Escola Municipal Iracema de Souza Mendonça. A Secretaria está acompanhando de perto o processo nas escolas. "


