Autor de uma obra que reflete, em sua trajetória literária, uma vida profundamente marcada por contextos de isolamento e resistência, o escritor sul-mato-grossense Lino Villachá (1938-1994) será o tema da terceira edição do projeto Leituras e Conversas, que a Academia Sul-Mato-Grossense de Letras (ASL) realizará amanhã, com entrada franca, no auditório da instituição, às 19h30min.
Coordenado pelas escritoras Lenilde Ramos, Maria Adélia Menegazzo e Sylvia Cesco, que integram o panteão da ASL, o clube de leitura põe em destaque um literato sul-mato-grossense após abordar um escritor nacional – o paranaense Paulo Leminski (1944-1989) – e um estrangeiro – Gabriel García Márquez (1927-2014).
Nesse evento, haverá também a participação de mais uma imortal da ASL, Raquel Naveira, que analisará, com as organizadoras do projeto, a trajetória de Villachá. Para Lenilde Ramos, que estuda e conhece o trabalho de Lino Villachá, tendo convivido com ele em trabalhos no Hospital São Julião, o destaque que a ASL permite ao escritor por meio de suas leituras “é um digno reconhecimento a um homem que teve espiritualidade, esperança, perseverança e uma vida de grande dedicação pelo humanismo”.
ESPIRITUALIDADE
Segundo o presidente da ASL, Henrique de Medeiros, Lino Villachá (1938–1994) “foi um poeta, cronista, educador e servidor público sul-mato-grossense, cuja obra emergiu de um contexto de isolamento e resistência, com trajetória literária profundamente marcada por sua vivência no Hospital São Julião, onde foi internado em razão da hanseníase”.
Sua poesia reflete essa experiência, abordando temas como dor, amor, exclusão social e resistência. Apesar das dificuldades diante de severas limitações físicas impostas pela doença, ele se tornou cronista do hospital e da cidade, registrando histórias e sentimentos daqueles que viviam na instituição.
Sua poesia é considerada um testemunho poderoso da humanidade e da luta contra o esquecimento. Além de poeta, Villachá foi um organizador cultural, promovendo eventos dentro do hospital e incentivando a prática esportiva e cultural entre os internos. Sua obra literária inclui poemas e crônicas, alguns dos quais foram musicados e apresentados em eventos. Publicou cinco livros, e seus textos são marcados por uma profunda espiritualidade e esperança.
Lino também foi responsável por saudações em eventos importantes, como a visita do papa João Paulo II (1920-2005) ao hospital, em 1991, quando representou os pacientes com um discurso emocionado. Em 1987, Lino se casou com Zena Maria, uma enfermeira que conheceu por meio de suas poesias. A cerimônia ocorreu na capela do Hospital São Julião, simbolizando uma união marcada por amor e dedicação mútua.
A antologia “Lino Para Sempre”, relançada em 2024, reúne os cinco livros do autor: “Aos Meus Amigos”, “Luzes do Meu Caminho”, “Uma Janela para os Pássaros”, “Minhas Flores de Flamboyant” e “Conversando com Deus e os Amigos”. Uma de suas obras foi publicada na Itália, refletindo a universalidade de seu trabalho.
Mesmo enfrentando amputações de ambas as pernas, atrofia das mãos, perda auditiva e quase cegueira, Lino manteve-se ativo intelectualmente, utilizando uma lupa para ler e datilografando com lápis amarrados às mãos. Lino Villachá transformou, assim, sua experiência de vida em uma fonte inesgotável de inspiração, mostrando que, mesmo diante das maiores adversidades, é possível encontrar beleza, propósito e contribuir significativamente para a sociedade.
CHOQUE E GRATIDÃO
“Eu e minha sanfona conhecemos o São Julião no segundo domingo de agosto de 1970, Dia dos Pais. Lino Villachá era um dos organizadores da pequena comemoração e me levou até a enfermeira para tocar para os acamados. Foi um choque, e ainda tento entender porque me aproximei daquela realidade. Hoje sou grata pelo privilégio de ter acompanhado e registrado o milagre da transformação humana e material que aconteceu naquele lugar”, relembra Lenilde Ramos.
“Ali fiz grandes amigos, entre os quais, Lino Villachá. Com ele, aprendi o valor do trabalho, a grandeza de se dar valor às pequenas coisas e a cultivar e compartilhar alegria. Com ele, não tinha desculpa para a gente não ser inteiro, como ele mesmo dizia, ‘mesmo faltando-me tudo’. Lino era um homem culto e ao mesmo tempo simples. E sua genialidade está na obra literária que nos deixou”, afirma a escritora, sem esconder a comoção.
SERVIÇO - Leituras e Conversas na ASL
- 3ª edição do clube de leitura da entidade, com tributo ao poeta Lino Villachá
- Amanhã, às 19h30min, no Auditório da ASL, localizado na Rua 14 de Julho, nº 4.653, Altos do São Francisco.
- Entrada franca.
- Evento presencial.
- Traje esporte.

Helio Mandetta e Maria Olga Mandetta
Thai de Melo


