Sem renegar a conexão que sempre manteve com a cidade grande, Paulo Simões costuma dizer que sua “base sensorial”, desenvolvida a partir da música folclórica, sertaneja e caipira, é uma decorrência do que considera ser a sua “audição de interior”.
Nascido no Rio de Janeiro, o cantor e compositor de 68 anos cresceu em Campo Grande e, além do envolvimento com a cultura da Capital, foi também menino de fazenda, abrindo-se a uma vivência do ambiente rural que muito nutriu a sua arte e somou-se às referências mais cosmopolitas dos tempos de faculdade, quando voltou ao Rio para o curso de comunicação.
Após o hiato forçado por esse longo período de restrições relacionadas à Covid-19, o menestrel, autor de “Trem do Pantanal”, com Geraldo Roca, “Mês de Maio”, com Almir Sater, e outras belas canções que se confundem com a alma sul-mato-grossense, está de volta para uma miniturnê de três apresentações – em Corumbá, Dourados e Ponta Porã.
Acompanhado de uma superbanda, Simões põe o pé na estrada nesta semana. A turnê começa neste fim de semana, na sexta-feira (19) com show na Praça Generoso Ponce, em Corumbá. O compositor levou ao público o show “Sonhos Guaranis”, que repassa uma carreira de cinco décadas.
No fim de semana seguinte, as apresentações serão realizadas na Praça Antônio João, em Dourados (sexta-feira, 26/11), e no Parque dos Ervais, em Ponta Porã (sábado, 27/11).
Com acesso gratuito e recursos do Fundo de Investimentos Culturais da Fundação de Cultura de Mato Grosso do Sul (FIC 2019), as três apresentações estão marcadas para as 20h.
Gilson Espíndola, Romário Amorim e Leandro Perez (os três nos violões), Renan Nonato (acordeon), Ju Souc (bateria) e Marcelo Ribeiro (baixo) são os instrumentistas escalados para, juntamente a Simões, retomar a turnê, projeto de 2019 interrompido por causa da pandemia.
SONHANDO EM GUARANI
Subirão ao palco a cantora Maria Alice e os dançarinos Ana Vieira e Érico Bispo. A dupla vai mostrar uma releitura do cururu, do siriri e outras expressões do folclore de MS.
A equipe conta ainda com outros nomes expressivos, como Andréa Freire e Lula Ricardi na direção artística e o baterista de jazz Adriel Santos (El Trio) na técnica.
A grande família reunida para reviver os “Sonhos Guaranis” de Paulo Simões inclui a produção Vaca Azul, responsável pelo webdesign, fotografia e filmagem.
O show é dividido em três momentos, costurando uma narrativa que busca dar conta da história da música de Mato Grosso do Sul, desde a folclórica “Cuitelinho”, até o blues “D de destino”, parceria de Simões, Almir Sater e Renato Teixeira.
O nome da turnê é uma referência à música composta por Simões e Almir Sater no início da década de 1980.
A composição tem um papel fundamental para os dois, pois sedimentou a amizade e a profícua parceria entre os dois e se tornou emblemática para a cultura musical do Estado, sendo regravada por diversos músicos nacionais e internacionais.
Mas, Paulo, com toda a licença poética, como seria, afinal, sonhar em Guarani?
“É muito mais colorido, não tem a fumaça das fábricas, das queimadas, não tem a poluição dos metais pesados, dos minérios”, devolve o bardo, na mesma moeda, em entrevista exclusiva ao Correio.
“É bem legal sonhar em guarani. Espero que as pessoas que venham aos shows aprendam a sonhar desse jeito, e que esse sonho se amplie, e a gente possa atingir as novas gerações por meio dos acordes e versos de todos que já passaram por aqui”. O músico diz ser comum as pessoas questionarem o teor da canção.
“Desde que Almir e eu fizemos a música, as pessoas ouvem, geralmente gostam e muitas fazem perguntas que não são fáceis de responder sobre o que essa música significa. Ela significa um monte de coisas”, comenta Simões, que estreou na cena musical de Campo Grande ainda adolescente, em 1968, com Geraldo Espíndola, Maurício Barros e outros amigos, com o grupo de rock Os Bizarros, que participava de festivais na época.
Música não se explica
“Músicas não são feitas para serem explicadas, mas eu acho que elas são bem-sucedidas na medida em que elas passam alguma coisa para as pessoas que as faz sentirem emoções diferenciadas, favoráveis ou não tão favoráveis. De qualquer forma, desde que o Estado fez 40 anos, eu imaginei esse show, e agora vai ser possível levá-lo ao público. Fico muito feliz com isso”, afirma.
Simões conta que, com o show, pretendeu fazer um resumo sob a sua ótica pessoal de como a música popular, “a música feita de e para o povo”, evoluiu na região desde antes da chegada do homem branco.
“Na verdade, desde as nossas heranças indígenas tão dispersas no ar”, prossegue, “e às vezes um de nós, um compositor, como Geraldo Espíndola, por exemplo, consegue captar e trazer aqui para nosso plano alguma coisa que a gente não sabe bem o que é, mas emociona”.
Parceiros
É um percurso de que o artista fala com conhecimento de causa. A sua longa e mais que reconhecida trajetória, com direito a indicação ao Grammy e gravações internacionais, confunde-se com a própria história que quer contar.
“São canções que começaram a ser ouvidas aqui na medida em que Mato Grosso do Sul ia sendo ocupado por mineiros, paulistas, depois gaúchos e, a partir de um certo momento, eu mostro a contribuição que a minha geração, da qual fazem parte Geraldo Espíndola, Geraldo Roca, e mais tarde os outros irmãos espíndolas, Tetê, Alzira, são tantos. E gente mais nova, como Almir e muitos outros que foram chegando”, reflete o cantor, deixando a emoção correr.
“Com cada parceiro, eu procurei desenvolver uma linha ou várias linhas de pensamento, de análise ou simplesmente de sentimento. As três plateias foram escolhidas por viverem em cidades emblemáticas dentro dessa nossa natureza fronteiriça. A ideia do show é passar um resumo musical de uma longa e interessante história”.
Justamente, por isso, além dos shows, Simões está retomando o projeto Diálogos Musicais, com acesso gratuito.
Diálogos
“O intuito dos Diálogos Musicais com Paulo Simões é o de aproximar o público do artista, de suas canções, seus parceiros e estilos representativos de uma linguagem musical contemporânea do qual ele é um dos pioneiros”, explica a diretora artística da turnê, Andréa Freire.
“Os encontros serão direcionados a músicos, artistas, produtores, gestores, jornalistas, universitários, professores e demais pessoas. Todos são bem-vindos!”, complementa Freire.
Em Corumbá, a conversa vai ser realizada no Museu de História do Pantanal (Muhpan), com mediação da artista e produtora Márcia Rolon. Em Ponta Porã, será no Centro de Convenções, com mediação do músico John Caetano e em Dourados, no Parque dos Ipês, com mediação do poeta Emmanuel Marinho.



Helio Mandetta e Maria Olga Mandetta
Thai de Melo


