Enfrentar as chamadas fake news é um desafio antigo para quem trabalha com saúde. Muita gente tem um fraco por dietas milagrosas e aquela verdade que ninguém deseja que você saiba, mas que está chegando anonimamente até você, direto no celular.
As eleições 2018 levantaram o tema desse tipo de comunicação, mais especificamente a disseminação de informações por WhatsApp. Correntes e mensagens sobre medicina e bem-estar são uma constante nessa plataforma há muito tempo. Desde seu lançamento, em 2009, ela se mostrou um terreno fértil para mostrar que palavras podem ser um inimigo poderoso para a saúde pública.
O caso mais notório que enfrentamos foi quando começou a circular um vídeo em que uma mulher colocava na boca do dr. Drauzio Varella a “informação” de que mamografias poderiam prejudicar a tireoide. Nós precisamos fazer um vídeo rebatendo esse absurdo, mas sabe-se lá o quanto é possível reverter depois que o estrago está feito. Quantas pessoas assistiram ao vídeo dessa irresponsável e jamais viram o desmentido. Quantas deixarão de fazer seus exames e evitar o câncer que mais acomete as mulheres?
Nós temos inclinação para acreditar em verdades mais fáceis. Quimioterapia e radioterapia são tratamentos difíceis, é muito mais confortável crer que alguma fruta pouco conhecida no Brasil opera milagres. O caldo da mentira fica ainda mais atraente se acrescentarmos que se trata de uma conspiração da indústria para que ninguém descubra.
Sejamos mais humildes. Uma verdade desse porte não ficaria restrita a grupos de WhatsApp. O mais provável é que uma empresa patenteasse e produzisse a cura fácil do câncer em larga escala e se tornasse a indústria do século. Isso não acontece porque, infelizmente, a fruta não cura câncer.
Não foi na base do boca a boca que a medicina (e a ciência como um todo) se desenvolveu enormemente, principalmente a partir do século 19. O modelo científico, que coloca cada descoberta à prova com regras rígidas, é o que torna possível você tomar um comprimido com segurança e se ver livre de uma dor de cabeça ou tomar um vacina e não pegar uma doença gravíssima, como a poliomielite.
Tratamentos médicos podem ser caros e o sistema público pode ter falhas de acessibilidade, mas nenhum desses problemas tem a ver com a ciência. E, diferentemente de superstições mais antigas, como a que prega o perigo de comer manga com leite, as fake news contemporâneas podem efetivamente matar. Cabe a cada um de nós não compartilhar.