Moradores de oito bairros da região oeste de Campo Grande enfrentam há décadas o mau cheiro causado por parte da operação de uma unidade da JBS, localizada no Indubrasil. Na tentativa de buscar uma solução definitiva para o cheiro de “carniça”, o deputado estadual Pedrossian Neto (PSD) propôs a suspensão da licença de funcionamento das linhas de produção de farinha de sangue e farinha de ossos da fábrica.
A medida foi apresentada nesta quinta-feira (10) na sessão da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul (ALEMS), após denúncias de moradores, dados de uma Ação Civil Pública e constatações do próprio parlamentar, que tem acompanhado o caso.
De acordo com ele, cerca de 100 mil pessoas estão sendo afetadas diretamente pela emissão de gases da combustão desses dois produtos, cuja fabricação, segundo Pedrossian, “não é nem a atividade principal da unidade”.
“São extremamente fedidos. Eu peguei as duas farinhas, com a ideia de trazer e mostrar, mas confesso que não tive coragem. Ia inviabilizar o trabalho na Assembleia. Infelizmente 100 mil pessoas têm que aguentar isso dia e noite. Não basta mover 300 ações judiciais”, denunciou o parlamentar.
A proposta foi apresentada por meio de um Projeto de Decreto Legislativo, que susta parcialmente os efeitos da Licença de Operação nº 002241/2023 e da Licença de Instalação e Operação nº 002408/2023, concedidas pelo Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) à empresa.
A intenção é que a suspensão atinja apenas as atividades ligadas à produção das farinhas, até que sejam adotadas medidas para controle de odores.
Segundo o deputado, a unidade já foi multada anteriormente, mas não fez adequações no sistema de tratamento de gases. Ele também exibiu vídeos com relatos de moradores que sofrem com problemas respiratórios, dores de cabeça e náuseas causadas pelo cheiro constante.
“É o momento para a empresa se pronunciar sobre o que ela está fazendo. A logística está suja e mal vedada. Quem está falando isso é o Ministério Público Estadual, que já moveu ação civil pública cobrando soluções, como a revisão do sistema de exaustão. Desde 1985 tem relatos do problema”, destacou.
O deputado Pedro Kemp (PT) se somou à denúncia e lembrou que já havia tratado do assunto em 1998, quando ainda era vereador em Campo Grande. “Na época, nada foi feito. Precisamos exigir do MPE, da Secretaria de Meio Ambiente e da Saúde para que atuem. A população e os comerciantes estão cansados de reclamar”, disse.
Entre os bairros afetados estão: Vila Nova Campo Grande, Jardim Carioca, Jardim Itália, Aeroporto, Jardim Zé Pereira, Vila Popular, Vila Silvia Regina e Bosque Santa Mônica II.
Pedrossian Neto reforçou que não se trata de uma medida contra a empresa em si, mas contra a fabricação de dois produtos em área urbana.
“Não queremos fechar a fábrica, é uma empresa importante. Só não pode fazer isso nesse lugar. Ou muda a fabricação ou muda as pessoas. A Vigilância Sanitária fecha uma padaria se estiver irregular. Por que aqui é diferente?”, questionou.
Se aprovado pelos parlamentares, o decreto vai suspender temporariamente as atividades até que a JBS apresente soluções técnicas. “Essa Casa pode, sim, fazer justiça para essas pessoas que têm a cidadania ferida por não terem seus direitos respeitados”, concluiu o deputado.
JBS ignora denúncias
Em março, exatamente um ano depois da primeira vistoria e da constatação de que o mau cheiro proveniente do Frigorífico da JBS na Avenida Duque de Caxias é insuportável, o Ministério Público Estadual entrou na justiça para tentar obrigar a empresa a adotar medidas que reduzam o desconforto provocado a milhares de moradores de bairros como Nova Campo Grande, Jardim Carioca e Vila Popular.
Na Ação Civil Pública, com pedido de liminar, a promotoria deixa claro que o problema começou bem antes da vistoria feita em 7 de março do ano passado, embora o abatedouro tenha todas as licenças ambientais para operação.
Em outubro de 2023, por exemplo, o Imasul, órgão ambiental do Governo do Estado, chegou a emitir um laudo dizendo que a indústria estava dentro da regularidade. Porém, em meio a uma série de protestos de moradores, os fiscais do Instituto retornaram à indústria em 17 de fevereiro do ano passado e constataram, principalmente, vazamento de gases que supostamente eram os responsáveis pelos odores.
Dois dias depois, porém, segundo o Imasul, os vazamentos haviam sido estancados e a indústria continuou funcionando normalmente, levando multa de R$ 100 mil.
Mesmo assim, as reclamações continuaram e por conta disso o próprio MPE enviou técnicos ao local em março e outubro do ano passado. Eles confirmaram o mau cheiro e concluíram que o principal responsável é a fábrica de farinha para ração animal, da qual exala o gaz mal cheiroso.
Entre as sugestões apresentadas foi a transferência desta farinheira para o Núcleo Industrial, uma região menos habitada. A empresa, porém, não acatou a proposta.
A JBS também se recusou a assinar, em maio do ano passado, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) no qual teria de assumir uma série de compromissos para acabar com o mau cheiro.
A empresa alegou que já cumpre tudo o que os órgãos ambientais exigem. Mesmo assim, o problema persiste e continua sendo alvo de protestos de moradores das imediações, os quais alegam que a situação está cada vez pior.
E esta piora possivelmente é resultado do aumento no abate de bovinos. Até o primeiro semestre do ano passado a autorização era para 1.250 abates por dia. A partir de agosto, esta autorização subiu para 1,7 mil abates diários.
Mato Grosso do Sul está em alerta para tempestades (Reprodução / Inmet)


