Artigos e Opinião

ARTIGO

Antônio Carlos Siufi Hindo: "As supostas gravações e as forças das instituições"

Promotor de Justiça aposentado

Continue lendo...

Quando um médico se encontra com um colega, certamente, a conversa principal do colóquio versará sobre a medicina. O raciocínio vale para outras tantas profissões que embelezam a inteligência dos seus protagonistas. Com os operadores do Direito, a direção não é diferente. Essa introdução, embora concisa, é importante para melhor compreender e interpretar as supostas trocas de mensagens entre o ex-juiz Sergio Moro e o procurador-chefe da Lava Jato em Curitiba acerca dos processos que envolvem o ex-presidente Lula e que o site The Intercept Brasil divulgou. Cada cidadão e cidadã tem o direito de exarar o seu juízo de valor sobre o tema. Trata-se de algo delicado, desafiador, mas que precisa ser regularmente apurado para se chegar com segurança à verdade. A perícia é o melhor caminho. Este é um fato incontestável. 

Mas esse tipo de relação não é algo inusitado. Protagonizamos essa relação em duas situações. No exercício da advocacia e depois no Ministério Público. Na primeira, o fato foi singular, precioso, autêntico. Instalaram a Comarca de Naviraí no dia 5 de janeiro de 1975 sem nenhuma estrutura material para funcionar adequadamente o Judiciário. O prédio da Câmara Municipal abrigou o Judiciário. A sala das sessões foi transformada no gabinete do Juiz. Ali, o magistrado recebia as autoridades e os senhores advogados e despachava os inquéritos, os processos, realizava as audiências e sentenciava nos feitos. O promotor de Justiça nem sala tinha. Sua mesa ficava na mesma sala do magistrado. Seu titular Gevair Ferreira Lima enobreceu sua instituição com o seu trabalho competente e limpo. Mas não era só isso. As casas do juiz e do promotor eram geminadas. Uma ao lado da outra e distante apenas alguns metros do local de trabalho. 

Nestas circunstâncias físicas, era impossível evitar o relacionamento entre o promotor e o juiz. O desembargador aposentado Rêmolo Leteriello também judicou naquela pequenina sala. O juiz José Carlos Correa de Castro Alvim era o titular da Comarca de Iguatemi. Despachava em Naviraí uma vez por semana por absoluta falta de magistrados. Eram os advogados que se revezavam semanalmente nos deslocamentos de ida e volta do juiz. Esses relacionamentos eram saudáveis. Não tinham nenhum indicativo de dúvidas quanto ao andamento dos processos. A força do conjunto probatório ditava os rumos da sentença. No exercício da nossa função ministerial, a vertente era a mesma. Naquela época, não existia avanço tecnológico. O contato era pessoal e diário. A verdade é uma só. Esse tipo de relação nasce e avança sempre escorada nos propósitos. Juízes, advogados e membros do Ministério Público só se desvirtuam das suas funções se ignorarem os ensinamentos que receberam de suas instituições. 

Elas não empurram seus membros para o abismo da decepção, do desrespeito e da vergonha. Foi isso que aprendi com João Antônio de Oliveira Martins, então chefe da Instituição Ministerial, no ato em que tomei posse no cargo de 1º promotor de Justiça da Comarca de Bataguassu. Privilegiar o trabalho sempre. A família, em especial. Escolher os relacionamentos. Eles pavimentam a estrada de uma carreira exitosa, concluiu o procurador de saudosa memória. Nesse contexto, as supostas de trocas de mensagens entre as autoridades não comprometem a força da marcha processual. São as provas colhidas dentro da lei que determinam os rumos das decisões. São passíveis de recursos. Não existe conspiração. 
Dizer que os promotores não conversam com os juízes e esses com os senhores advogados é alimentar uma grande hipocrisia. A Justiça segue altaneira. A denúncia é sempre do promotor de Justiça nos casos de ação pública. Ele representa a sociedade. A sentença é competência exclusiva do juiz. Ele representa o Estado. Trabalhei com muitos juízes.

Todos íntegros e capazes. Outros tantos nomes poderiam ser declinados. O ex-juiz Sergio Moro disse na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal que não pode confirmar as gravações e que deixou o cargo de juiz federal para fortalecer o combate ao crime organizado, ao tráfico de drogas, ao contrabando de armas e munições e à corrupção no ministério da Justiça. Disse ainda não ter apego ao cargo e fez um indicativo precioso para o enfrentamento do tema. Indicou o Supremo Tribunal Federal como órgão responsável para a realização das perícias das supostas mensagens. É assim que a verdade é desvendada. 

As opiniões esclarecidas. Eventuais vícios de forma e de objeto não podem prejudicar a perfeição possível dos sistemas de legalidade. Cada qual é responsável pelos seus atos. As instituições não podem ser tisnadas. Elas são perenes, soberanas e inatingíveis. Seus membros, não. São passageiros, efêmeros e fugazes.

ARTIGOS

O papel da IA no bem-estar moderno

21/03/2025 07h45

Arquivo

Continue Lendo...

Os últimos anos foram marcados por transformações em várias esferas da sociedade, e um dos conceitos que mais mudou e ganhou novos significados foi o de bem-estar. Se antes ele era relacionado principalmente com a saúde mental e física, hoje em dia já abrange diversos outros fatores, como qualidade de vida, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, segurança e experiências personalizadas.

Esse cenário levou ao crescimento da economia do bem-estar, que, segundo dados do Global Wellness Institute (GWI), alcançou US$ 6,3 trilhões em 2023, montante 25% maior do que o valor avaliado em 2019 (US$ 4,9 trilhões). Para 2028, a expectativa é que o setor chegue a US$ 8,9 trilhões, o que reforça como essa pauta já é uma forte tendência.

Porém, vale destacar que os avanços nesse mercado foram possíveis, entre outros fatores, por conta da evolução da tecnologia, que ampliou o acesso a soluções inovadoras, otimizou processos e possibilitou a personalização do bem-estar de acordo com as necessidades individuais. Nesse contexto, a inteligência artificial (IA) tem desempenhado um papel fundamental, contribuindo ainda mais para que o bem-estar seja mais acessível e flexível.

Temos diversos exemplos que comprovam como as soluções inovadoras trazidas pela popularização da IA impactam diretamente o autocuidado e a forma como interagimos com o mundo: no setor da saúde, startups brasileiras como a Pipo Saúde utilizam a tecnologia para oferecer suporte a diagnósticos e otimizar o atendimento médico, permitindo que milhões de pessoas tenham acesso a serviços de saúde de forma mais eficiente. O bem-estar emocional também foi impulsionado com soluções como a da Vittude, uma plataforma que conecta pacientes a psicólogos por meio de IA, democratizando o acesso a cuidados mentais.

No que diz respeito ao bem-estar corporativo, ferramentas desenvolvidas por empresas como a Gupy ajudam organizações a monitorar o nível de satisfação dos funcionários e sugerem ações para melhorar o ambiente de trabalho, reduzindo o estresse e, consequentemente, aumentando a produtividade.

Outro exemplo do impacto positivo da IA no bem-estar moderno está na personalização do entretenimento, com plataformas como Spotify e Netflix, que usam IA para sugerir conteúdos que correspondem aos interesses do usuário, e do aprendizado, com ferramentas como o Duolingo, que usam IA para personalizar o ensino, tornando essa jornada mais eficaz e menos desgastante para os estudantes.

Acredito que essa tendência de sofisticação das tecnologias baseadas em IA vai tornar a busca pelo bem-estar completo ainda mais fácil. Desde aplicativos que monitoram padrões de sono e alimentação a assistentes virtuais que ajudam a gerenciar tarefas cotidianas, é fato que a tecnologia seguirá transformando a forma como cuidamos do nosso corpo, mente e relações.

Porém, não podemos esquecer que o segredo para o uso eficaz da IA nesse contexto inclui necessariamente o desenvolvimento ético dessas tecnologias, para que sejam seguras, inclusivas e realmente focadas no bem-estar humano.

Assine o Correio do Estado

ARTIGOS

Financiamento rural e a reforma tributária

21/03/2025 07h15

Arquivo

Continue Lendo...

Os Fiagros são os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais. Criados em 2021, são ativos de investimento do agronegócio, seja de natureza imobiliária rural, seja de atividades relacionadas ao setor. O Fiagro acabou se tornando uma fonte alternativa de financiamento para o produtor rural, de modo a não depender exclusivamente dos bancos e do Plano Safra.

Entretanto, em janeiro deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a reforma tributária, mas vetou trechos que previam a isenção de tributos para os Fiagros e para os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs). Esses trechos isentariam tais fundos da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS).

A justificativa do governo para o veto foi a ausência de autorização constitucional para que esses fundos não fossem considerados contribuintes do IBS e da CBS. Isso pode impactar diretamente o crédito para os produtores rurais. É uma insensatez e ilógico o que o presidente fez.

Os Fiagros são fundos em que as pessoas podem investir e que funcionam como fontes de financiamento para o agronegócio. No mundo inteiro, os fundos já são mais representativos do que os bancos. Esse tipo de fundo tem crescido bastante, pois permite também que investidores urbanos participem do setor agroindustrial, aproveitando o potencial do agronegócio brasileiro.

O Brasil conta com cinco grandes bancos e cooperativas de crédito, além de seis linhas de crédito disponíveis para o agronegócio. Há também o Plano Safra, que atende apenas uma pequena parte da produção. Dessa forma, os agricultores ficam nas mãos desses bancos e frequentemente enfrentam desafios para a concessão de crédito, tornando-se dependentes das instituições financeiras, que impõem taxas, garantias e burocracias muitas vezes incompatíveis com a realidade do setor.

Prova maior da importância de financiamentos alternativos é a notícia da suspensão do Plano Safra. O Tesouro Nacional decidiu suspender novas contratações dessas linhas de financiamento 2024-2025. A medida vale a partir de 21 de fevereiro. O governo, sempre correndo para remediar em vez de prevenir, editou a MP nº 1.289/2025, liberando 4,17 bilhões para conter a pressão do segmento. Ainda assim, é insuficiente para o que o setor demanda de fomento. 

Os fundos representam um novo universo, uma nova possibilidade de financiamento com juros menores, pois, muitas vezes, esse capital vem do exterior. Os investidores estrangeiros não estão acostumados com os juros elevados do Brasil e, portanto, taxas mais baixas já são atrativas para eles. O Fiagro é exatamente isso: uma fonte de financiamento. Além de financiar o campo, atualmente beneficia cerca de 600 mil investidores.

No momento, o Fiagro só paga imposto se houver mais de 100 cotistas no fundo, não sendo tributado pelo Imposto de Renda. Caso tenha menos de 100 cotistas, há a incidência de 15% de Imposto de Renda, cobrado apenas no momento do resgate do resultado pelo cotista. Além disso, o Fundo não paga PIS, Cofins ou ISS. Contudo, com esse veto presidencial, os Fiagros passarão a pagar os tributos previstos na reforma tributária, especificamente o IBS e a CBS. Isso significa uma alíquota de até 28,5%, o que inviabilizará completamente esses fundos.

É importante lembrar que a logística no Brasil é muito cara, os produtores gastam muito com transporte, e os custos trabalhistas e tributários são elevados. Agora, o governo tenta transferir mais essa responsabilidade para o produtor. Vale ressaltar, mais uma vez, que quanto mais difícil for a vida do produtor, mais difícil será a vida do consumidor, que verá o impacto nos preços dos produtos agropecuários nas prateleiras dos supermercados.

A nossa expectativa é que a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) manifeste firmemente sua discordância com o veto e atue no Congresso para derrubá-lo. A tributação desses fundos compromete a competitividade do setor, aumenta os custos para os produtores, reduz a oferta de crédito no agronegócio e, por consequência, eleva os preços dos alimentos para o consumidor final.

Assine o Correio do Estado

NEWSLETTER

Fique sempre bem informado com as notícias mais importantes do MS, do Brasil e do mundo.

Fique Ligado

Para evitar que a nossa resposta seja recebida como SPAM, adicione endereço de

e-mail [email protected] na lista de remetentes confiáveis do seu e-mail (whitelist).