O início de uma gestão municipal é sempre um momento propício para corrigir distorções históricas e adotar medidas impopulares, porém necessárias, com menor desgaste político. Em Campo Grande, a prefeita tem agora uma oportunidade rara de interromper um ciclo nocivo que se arrasta desde a década passada: o populismo tarifário no transporte coletivo.
Esse mecanismo, que consiste em manter artificialmente baixas as tarifas para agradar o eleitorado, sem garantir o devido equilíbrio econômico do contrato, tem causado prejuízos duradouros à qualidade do serviço.
Nesta edição, revelamos, em primeira mão, que o Consórcio Guaicurus – que está longe de ser um exemplo de eficiência no cumprimento de suas obrigações – cobra da prefeitura o repasse de subsídios atrasados e solicita o aumento da chamada tarifa técnica.
Este valor contratual é calculado para remunerar o serviço prestado, considerando tanto a arrecadação direta com passageiros quanto o aporte previsto em contrato. Quando não é pago corretamente ou quando a tarifa pública fica muito distante da tarifa técnica, instala-se um desequilíbrio que compromete toda a operação.
É preciso reconhecer que a responsabilidade pelo quadro atual não é exclusivamente da concessionária. O poder concedente também falhou, ao não honrar integralmente as contrapartidas financeiras previstas.
O resultado é um impasse em que ninguém cumpre a sua parte: o serviço segue aquém do esperado e o contrato, em sua essência, é descumprido por ambos os lados. Essa relação conflituosa, marcada por desconfiança mútua, só leva à deterioração do transporte público.
Romper com o populismo tarifário não significa aumentar tarifas de forma descontrolada ou ignorar a capacidade de pagamento da população. Trata-se, sim, de estabelecer parâmetros realistas e sustentáveis, que permitam ao contrato ser cumprido e ao serviço operar sem o risco constante de colapso financeiro.
Isso exige transparência nos cálculos, previsibilidade nos reajustes e disciplina na execução orçamentária do Município para garantir o repasse de subsídios acordados.
Se a tarifa pública for ajustada de forma responsável e os subsídios forem pagos em dia, é possível que o transporte coletivo de Campo Grande não alcance a excelência desejada pela população, mas, ao menos, atinja um patamar minimamente satisfatório.
Isso significa reduzir atrasos, melhorar a frequência dos ônibus e, principalmente, evitar que a operação seja considerada inviável pelos próprios prestadores. É chegada a hora de encarar o problema sem subterfúgios.
Seguir adiando a correção dessa distorção apenas empurra o sistema para uma situação ainda mais crítica, na qual nem mesmo a tarifa cobrada nas catracas nem o aporte público serão capazes de sustentar o transporte coletivo.
A prefeita tem a chance de entrar para a história como quem, logo no início do mandato, rompeu um ciclo de desgaste e reconstruiu as bases para um serviço público mais estável e confiável.


