O debate sobre investimentos em logística e infraestrutura no Brasil passa inevitavelmente pela comparação entre capital privado e investimento público. Em um cenário ideal, o privado assume os riscos, injeta recursos, constrói e melhora a estrutura, e, em contrapartida, é remunerado pelo retorno que o empreendimento gera.
Esse modelo funciona bem em áreas de alta demanda, como se vê em São Paulo, onde rodovias e aeroportos foram modernizados e ampliados por meio de concessões, criando uma rede que serve de referência nacional. Mas esse “universo ideal” não cobre todas as realidades brasileiras.
A questão que se impõe é: como ficam os investimentos em regiões ou setores onde a perspectiva de retorno imediato é frágil? É nesse ponto que o poder público deve assumir protagonismo. Afinal, não se pode esperar que apenas o mercado resolva gargalos estruturais em locais ainda em desenvolvimento.
Entretanto, o Brasil tem adotado, nos últimos anos, uma lógica anticíclica e até antidesenvolvimentista, marcada pelo dogma de que só há crescimento com dinheiro privado. Isso ignora o óbvio: onde há retorno, o capital naturalmente se apresenta. Onde não há, a ausência de ação estatal perpetua o atraso.
A Malha Oeste é um exemplo emblemático. Operada pela Rumo, cuja concessão expira no próximo ano, tornou-se símbolo de abandono e falta de visão estratégica. Em fevereiro, o trecho terá nova chance de concessão
O problema é que, ao longo da malha, há trechos sem demanda expressiva, mas também existem áreas de forte potencial, como em Campo Grande e em corredores agrícolas. A concessionária, no entanto, não investe nesses pontos, por já explorar outra ferrovia mais rentável no Estado. Assim, a lógica privada prevalece sobre o interesse coletivo.
Se o governo federal tivesse assumido a responsabilidade de garantir a infraestrutura nos trechos menos atrativos, hoje a realidade poderia ser outra.
Uma ferrovia funcional cruzando Mato Grosso do Sul de leste a oeste não só teria movimento, como ajudaria a criar nova demanda, impulsionando o transporte de mercadorias, combustíveis, produtos do agronegócio e até mesmo contêineres de exportação.
O desenvolvimento gera movimento – não o contrário. Quando o governo abdica de investir nas partes “menos rentáveis”, sabota o futuro de regiões inteiras.
A solução consensual proposta para a Malha Oeste, ao ignorar trechos vitais sob o argumento da inviabilidade, mostra a miopia de quem só enxerga números imediatos. É preciso olhar além da rentabilidade de curto prazo e considerar o potencial de integração regional e nacional que uma ferrovia pode proporcionar.
O Estado brasileiro não pode ser mero espectador da lógica privada. Deve assumir a responsabilidade de garantir infraestrutura em áreas estratégicas, pois somente assim o ciclo virtuoso de geração de demanda se concretiza.
O governo federal precisa tratar o caso com a atenção que merece. Concessões privadas são importantes, mas não podem ser vistas como a única via. Onde o capital privado não chega, cabe ao Estado abrir o caminho.
Afinal, sem infraestrutura, não há desenvolvimento. E sem desenvolvimento, o Brasil continuará a conviver com bolsões de atraso em pleno século 21.


