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O antagonismo normativo do Sistema Financeiro Nacional: a crise no Banco Master

Episódio é apenas mais um reflexo das tensões que vêm se acumulando no Sistema Financeiro Nacional

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Na manhã do dia 18, o Banco Central (BC) do Brasil decretou a liquidação extrajudicial do Banco Master S/A e de outras instituições do conglomerado, e submeteu o Banco Master Múltiplo S/A ao Regime de Administração Especial Temporária.

Esse episódio é apenas mais um reflexo das tensões que vêm se acumulando no Sistema Financeiro Nacional (SFN), especialmente após a tentativa frustrada de aquisição de parte do Banco Master pelo Banco Regional de Brasília (BRB), proposta que foi protocolada com o BC, mas não recebeu aprovação.

Além disso, o noticiário econômico tem sido marcado por casos de fraudes milionárias, especialmente envolvendo fintechs, e pelo uso indevido dessas instituições por organizações criminosas, o que levanta sérias preocupações sobre a solidez e a segurança do sistema.

Diante desse cenário, torna-se essencial analisar o arcabouço legal que rege tanto a regulação quanto a resolução das instituições que atuam no SFN.

O Conselho Monetário Nacional (CMN) atua como órgão normativo, enquanto o Banco Central exerce a função de entidade supervisora.

No campo da regulação, ambos têm competência para estabelecer regras sobre o capital mínimo exigido das instituições financeiras, conforme previsto no artigo 4º, inciso XIII, da Lei 4.595/1964.

Essa prerrogativa foi recentemente exercida com a publicação da Resolução Conjunta nº 14, em novembro de 2025, que reformulou a metodologia de apuração do limite mínimo de capital e patrimônio líquido das instituições autorizadas a funcionar pelo BC.

A nova resolução representa uma mudança significativa, pois estabelece limites mínimos de capital com base nas atividades desenvolvidas pelas instituições, como captação, investimento e operações, além de considerar o uso intensivo de tecnologia.

Essa atualização surge em resposta às fraudes recentes que abalaram o sistema, especialmente aquelas envolvendo fintechs, e busca fortalecer a estrutura financeira das instituições. Até então, as exigências de capital estavam defasadas, sem qualquer correção inflacionária, e eram determinadas apenas pelo tipo de instituição.

Com a Resolução Conjunta nº 14, passa-se a exigir capital mínimo também para cobrir os custos iniciais de operação e os serviços intensivos em infraestrutura tecnológica.

Essas novas exigências impõem um capital mínimo específico para instituições que operam com tecnologia intensiva, variando entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões. Além disso, há valores adicionais conforme as atividades desenvolvidas, o que pode elevar significativamente o montante necessário para operar.

Um exemplo claro é o caso das instituições que utilizam o termo “banco” em sua nomenclatura, que devem adicionar R$ 30 milhões ao capital apurado. Com isso, operar como banco comercial passou a exigir um capital mínimo mais de 300% superior ao anteriormente exigido.

Com medidas modernas e robustas, o mesmo não pode ser dito sobre os mecanismos de resolução. O BC possui autonomia para implementar regimes de resolução, dentro de três opções: Regime de Administração Especial Temporária (Raet), Intervenção e Liquidação Extrajudicial.

Esses regimes são amparados por leis antigas, como a Lei 6.024/1974, que trata da intervenção e liquidação extrajudicial, e a Lei 2.321/1987, que institui o Raet. Em 1997, a Lei 9.447 introduziu a responsabilidade solidária dos controladores das instituições sujeitas a esses regimes.

No entanto, essas normas não acompanharam a evolução do mercado financeiro, especialmente no que diz respeito à tecnologia e à complexidade das operações atuais.

O resultado é um sistema de resolução que falha em seus objetivos principais: salvar instituições viáveis e liquidar rapidamente as inviáveis. Muitas vezes, instituições com potencial de recuperação não são salvas, enquanto outras permanecem em um limbo jurídico por anos, prejudicando investidores e depositantes.

Uma análise dos casos de resolução aplicados pela autarquia revela que, entre bancos comerciais, de investimento e múltiplos, foram registrados 111 casos: 20 Raets, 24 intervenções e 67 liquidações extrajudiciais.

Dessas, a maioria resultou no encerramento das atividades, com apenas uma ainda ativa: o Banco Rural S/A, cuja liquidação extrajudicial foi decretada em 2013 e permanece em curso.

No cenário internacional, o Financial Stability Board (FSB) publicou em 2011 os “Atributos-Chave de Regimes Efetivos de Resolução”, endossados pelo G-20. O Brasil comprometeu-se a adotá-los, mas ainda não os implementou integralmente.

Vivemos, portanto, uma contradição normativa: enquanto a regulação avança com medidas modernas, os mecanismos de resolução permanecem presos a normas arcaicas. A esperança é que, diante da atual crise, o Congresso finalmente se mobilize para aprovar o PLP 281/2019 e alinhar o Brasil aos padrões internacionais de estabilidade financeira.

EDITORIAL

Judiciário não é palco nem mercado

Restringir a atuação como coach e impor limites a determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental

13/12/2025 07h15

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A decisão do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Edson Fachin, de proibir que magistrados atuem como coaches, seja nas redes sociais ou fora delas, não é apenas correta como necessária.

Trata-se de um freio institucional que chega em boa hora a um Judiciário que, nos últimos anos, tem convivido com excessos de exposição, vaidade e práticas que colocam em xeque a sobriedade exigida da magistratura.

Não é de hoje que esse limite vem sendo testado.

Há cerca de dois anos, causou perplexidade o caso de um ex-juiz federal que passou a vender cursos na internet ensinando “táticas” para ganhar recursos judiciais. O paradoxo salta aos olhos: quem julgava recursos passou a faturar dinheiro “por fora” ensinando advogados a vencê-los.

Ainda que se alegue liberdade profissional após deixar a toga, a prática é, no mínimo, eticamente questionável e contribui para corroer a confiança da sociedade na imparcialidade do sistema de Justiça.

A medida de Fachin reconhece um problema real: tem faltado comedimento à parte da magistratura brasileira.

Em tempos de redes sociais, palestras remuneradas e cursos de viés mercadológico, alguns juízes parecem ter esquecido uma máxima antiga, simples e ainda extremamente atual: o lugar em que o magistrado mais deve falar é nos autos.

A autoridade da toga não se constrói com likes, seguidores ou discursos performáticos, mas com decisões técnicas, fundamentadas e discretas.

Restringir a atuação como coach e impor limites à determinadas docências, especialmente aquelas transformadas em verdadeiros cursos caça-níqueis, é fundamental. Não se trata de censura nem de cerceamento da liberdade intelectual, mas de preservação da função jurisdicional.

O juiz não é um influenciador digital, tampouco um vendedor de fórmulas de sucesso processual. É agente do Estado, investido de poder para decidir conflitos com independência e imparcialidade.

Isso, porém, não significa defender um Judiciário hermético ou alheio à sociedade. Ao contrário: as cortes precisam, sim, se comunicar melhor nestes novos tempos, explicar decisões complexas, dialogar institucionalmente com a população e prestar contas de seu funcionamento. Comunicação institucional é necessária; autopromoção individual, não.

No fim das contas, o que está em jogo é o respeito à própria instituição. O Judiciário é, talvez, o Poder que mais precisa ser respeitado para que a democracia funcione. E esse respeito não é um privilégio – é uma obrigação que começa dentro de casa.

Seriedade, sobriedade e autocontenção não são virtudes acessórias para magistrados; são requisitos essenciais para quem exerce uma das funções mais sensíveis do Estado.

ARTIGOS

Novas regras do Banco Central sobre ativos virtuais: um marco de maturidade regulatória

Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo

12/12/2025 07h45

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Em 10 de novembro, o Banco Central do Brasil deu um passo histórico ao publicar as Resoluções BCB nº 519, nº 520 e nº 521, que inauguram um novo ciclo de regulação do mercado de ativos virtuais no País.

Com essas normas, o Brasil consolida seu papel de protagonista na integração entre inovação financeira e solidez regulatória, aproximando-se dos padrões internacionais de governança e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo (PLD/FT).

Mais do que um conjunto técnico de regras, essas resoluções representam um amadurecimento institucional do sistema financeiro brasileiro diante da realidade cripto. Até então, o setor operava em uma zona cinzenta regulatória, com supervisão limitada e grande diferenças de informações entre prestadores e usuários.

Agora, o País passa a estabelecer bases claras para a operação de Sociedades Prestadoras de Serviços de Ativos Virtuais (Psav), além de definir, pela primeira vez, o tratamento cambial para operações internacionais com criptoativos.

A Resolução BCB nº 519/2025 impõe um padrão de governança que coloca as Psav sob um nível de exigência comparável ao das instituições financeiras. Exige-se segregação patrimonial, controles internos robustos e políticas de PLD/FT equivalentes às do sistema bancário.

Essa medida mitiga riscos de uso indevido dos recursos dos clientes e reduz o espaço para fraudes e práticas abusivas. Pontos sensíveis em um setor historicamente marcado por volatilidade e escândalos.

Já a Resolução BCB nº 520/2025 institui o processo de autorização prévia para funcionamento das Psav, com vedações expressas à oferta de crédito e à captação de recursos de clientes qualificados.

O objetivo é proteger investidores e garantir que as operações com criptoativos não contaminem o sistema financeiro tradicional com riscos de liquidez e solvência. A exigência de sede no Brasil e critérios rigorosos de idoneidade e gestão de riscos também reforçam o compromisso com a responsabilidade corporativa e a transparência operacional.

Por sua vez, a Resolução BCB nº 521/2025 corrige uma lacuna importante ao enquadrar as operações internacionais com criptoativos, como operações de câmbio, sempre que houver conversão de moeda ou transferência internacional de valores.

Essa regra coloca as transações de cripto sob a mesma lente de compliance cambial que rege outras formas de movimentação financeira internacional, prevenindo brechas para evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Para bancos e instituições financeiras, o novo marco regulatório representa tanto uma oportunidade quanto uma responsabilidade. A integração dos serviços com ativos virtuais ao portfólio bancário passa a ser viável, desde que sejam obedecidos os novos parâmetros de segurança, segregação de recursos e reporte regulatório.

Ao mesmo tempo, essas instituições terão de repensar suas estruturas de governança e compliance para acomodar o ecossistema cripto dentro de uma lógica de controle prudencial.

Alguns pontos, entretanto, merecem atenção especial: a vedação de crédito com recursos próprios em operações cripto, a segregação total de fundos de clientes, o reforço dos controles de PLD/FT, e o tratamento cambial obrigatório em transações internacionais.

Tais exigências sinalizam que o Banco Central, de maneira mais que devida e assertiva, pretende equilibrar o incentivo à inovação com a blindagem contra riscos sistêmicos e ilícitos financeiros.

Contudo, o período de adaptação será curto. As regras entram em vigor a partir de 2 de fevereiro de 2026 e as obrigações adicionais de reporte internacional passam a valer a partir de 4 de maio de 2026.

Empresas que já atuam no mercado precisam, portanto, iniciar imediatamente seus processos de adequação, revisando estruturas societárias, sistêmicas, políticas de custódia e mecanismos de compliance.

Por fim, as novas resoluções não devem ser vistas como um freio à inovação, mas como um sinal evidente de maturidade regulatória do País.

Ao oferecer um ambiente seguro, transparente e supervisionado, o Banco Central cria as condições para que o Brasil se consolide como um polo confiável de desenvolvimento em blockchain e ativos digitais. É o início de uma nova era em que a confiança institucional passa a ser o ativo mais valioso do universo cripto.

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