Dia desses eu ouvia um disco da nossa cantora Wanda Brito, em que ela “Canta Mato Grosso do Sul”, e fui tomado por uma grande saudade de tempos idos, passados aqui neste rincão onde nasci. É que o repertório contido no CD é todo composto por canções que falam da terra e da gente, de nosso Estado e do velho Mato Grosso.
Ali estão os clássicos “Pé de Cedro” e “A Mato-grossense”, do coxinense Zacarias Mourão, como também “Cidades Mato-grossenses” e “Seriema de Mato Grosso”, de Mario Zan. Em “Cidades Mato-grossenses”, que tem gravações de outros consagrados artistas mais antigos, assim como contemporâneos (Sérgio Reis), a letra começa falando do rasqueado, esse ritmo que contagia os que apreciam a autêntica música sertaneja de raiz: o autor diz que seu “prazer seria ouvir rasqueado a vida inteira”, pois lhe recorda “as noites lindas” que passou na fronteira com o Paraguai, “essa boa terra irmã/Faz lembrar Porto Esperança/Faz lembrar Ponta Porã”. Lembra, ainda, “...Porto Murtinho/Bela Vista e Corumbá/Três Lagoas, Campo Grande/Aquidauana e Cuiabá”. Ouço essas composições desde minha infância.
A inclusão de Cuiabá está no fato, óbvio, de que todas as cidades mencionadas pertenciam a um só Estado, o então grande Mato Grosso. Lembro-me de que, quando estudante no antigo curso primário, as professoras sempre exaltavam a grandeza do Estado, o segundo maior do Brasil em extensão territorial. Mas, aí, veio a divisão do colosso...
Eu, que sou mato-grossense nato e sul-mato-grossense por imposição, pois ninguém foi consultado para opinar se era a favor ou contra a divisão, às vezes me ponho a especular se foi benéfica ou não a medida para ambas as unidades resultantes.
É certo que houve grande progresso nas duas regiões, mas seria ele consequência da separação? Será que não teríamos alcançado grau maior de desenvolvimento aplicando a soma dos recursos das duas unidades com a metade do custeio (apenas uma estrutura administrativa)?
Jardel Barcellos, no ótimo livro “Mato Grosso do Sul (1978 - 1979) – Utopia x Realidade”, editado em 2014 pelo Instituto Histórico e Geográfico de MS, diz que, “Segundo o discurso divisionista, ficava implícito que o SMT (sul de MT) era considerado como uma colônia de exploração da metrópole cuiabana.
Esta, além de longínqua e desprovida de meios adequados de comunicação além do caminho das águas, espoliava, em termos fiscais, a região sul, econômica e culturalmente mais adiantada, prestando-lhe pequena contrapartida em gastos públicos e investimentos, além de impor a ela seus funcionários apaniguados, sendo muitos de trato arrogante e discriminatório com relação aos cidadãos sulistas, principalmente os gaúchos, tidos como filhos de outros estados e desagregadores do meio social”. Bem, eu nunca percebi isso.
Mas, isso é coisa de um passado nostálgico. Hoje somos sul-mato-grossenses, embora ainda lutemos, depois de 37 anos, para impor nossa identidade àqueles que insistem em se referir a nós como habitantes do Mato Grosso.
*advogado e escritor
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