O governo federal estuda medidas para reduzir o custo da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), que pode custar até R$ 5 mil em Campo Grande, e uma delas seria acabar com a obrigatoriedade de aulas práticas e teóricas feitas em autoescolas. Para a especialista em Educação no Trânsito Ivanise Rotta, a ideia pode dar certo, desde que feita com base em critérios técnicos.
Nesta semana, o ministro dos Transportes, Renan Filho, anunciou que está em estudo um projeto que prevê suspender a obrigatoriedade de frequentar Centros de Formação de Condutores (CFCs), também conhecidos como autoescolas, para obter a CNH nas categorias A (motocicletas) e B (veículos de passeio).
O novo modelo, segundo o governo federal, pode reduzir o custo do documento em até 80%.
“A medida se inspira em práticas adotadas em países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Japão, Paraguai e Uruguai, onde os modelos de formação são mais flexíveis e centrados na autonomia do cidadão”, afirmou nota do Ministério dos Transportes.
Para Ivanise Rotta, que é secretária do Gabinete de Gestão Integrada de Vida no Trânsito (GGIT), a medida pode funcionar, porém, precisa seguir alguns critérios, como acontece em outros países que já adotaram o modelo.
“Nos Estados Unidos, a pessoa aprende com o pai, com a mãe, com o tio, mas em local apropriado. Depois que ela tira a CNH, ela tem o período que ela não pode pilotar sozinha, então, não pode pegar uma parte de um sistema e não continuar. A avaliação no Detran-MS [Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso do Sul] continuaria, a questão das provas teóricas, tudo continuaria. A pessoa não está livre, ela vai ter que aprender, só que não pode fazer aula em qualquer lugar, continua ilegal colocar o filho no carro e andar com ele pelas ruas. Mas pode ser que funcione, só experimentando para ver”, avaliou.
Segundo ela, a mudança poderia contribuir para um problema recorrente no trânsito de Campo Grande, que é o alto número de pessoas conduzindo sem CNH. Conforme Ivanise, a cada 10 condutores parados em blitze, ao menos 4 não tem o documento ou estão com a CNH irregular.
“Poderia criar uma maneira de que professores ensinassem a pessoa a conduzir veículo, porque hoje nós temos cerca de 40% com a CNH irregular, ou está cassada, ou está vencida, ou não tem CNH. A cada 10 parados em blitz, 4 estão com CNH irregular”, declarou, completando que, dos acidentes com mortes registrados na Capital, 70,8% têm ao menos uma das partes sem carteira de motorista.
Dados do Detran-MS aponta que, no primeiro semestre deste ano, foram flagrados 7,7 mil condutores sem CNH em todo o Estado, em fiscalizações do órgão.
Porém, Ivanise ressalta que nem tudo pode ser resolvido com a redução no valor da habilitação. Ela lembra o programa feito pelo governo do Estado, o CNH Social, que foi lançado em 2022 e, desde então, não conseguiu entregar nem as 5 mil carteiras prometidas no início, por problemas com o público participante.
“São diferentes variáveis que a gente tem que analisar, não é só a questão financeira, tem pessoas que não têm capacidade psicológica e técnica para dirigir veículos”, concluiu.
CONTRÁRIOS
Se, por um lado, a especialista em Educação no Trânsito avalia a alternativa como viável, por outro, o presidente do Sindicato dos Servidores do Detran-MS (Sindetran-MS), Bruno Alves, considera que outros mecanismos poderiam ser utilizados para baratear a obtenção da habilitação.
“Se for simplesmente a questão da redução do custo de carteira de habilitação, ele [governo federal] tem um mecanismo muito mais eficiente, que é empoderar as Escolas Públicas de Trânsito, administradas pelos Detrans, em que os próprios Detrans poderiam fornecer esse curso de formação de condutores, destinando um recurso para isso. Seria uma medida muito mais eficaz, inclusive para garantir a segurança”, avaliou Alves.
“O que me preocupa é que uma autoescola não é simplesmente um local de comércio de vendas de aulas, ela faz a formação, você precisa ter diretores de ensino, responsáveis pedagógicos, não é simplesmente ensinar o condutor a dirigir um carro, como era feito no passado. Com o avanço da tecnologia, com outra série de requisitos que a gente vem tendo e com o avanço do trânsito de veículos sendo conduzidos, nos preocupa muito essas fragilizações do processo de habilitação”, completou o presidente do Sindetran-MS.
Para o mototaxista Darcy Fereira Gomes, de 56 anos, apesar de ser bom para o bolso dos condutores, ele teme um aumento de acidentes, já que, na sua opinião, os motoristas podem não respeitar tanto as leis de trânsito.
“É bom para quem vai fazer, no bolso vai ficar mais barato, mas para o trânsito não é bom. Querendo ou não, a autoescola dá a base para as leis de trânsito”, declarou.
Sobre o estudo, o Detran-MS afirmou que não comenta medidas que ainda não foram efetivadas, porém, a Associação Nacional dos Detrans (AND) já anunciou que é contra a medida, conforme matéria do Correio do Estado, e pretende agendar uma reunião com o ministro dos Transportes para tratar da proposta que elimina a obrigatoriedade de aulas em autoescolas.
Ainda sob análise da Casa Civil, o projeto, quando aprovado, será regulamentado por uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que estabelece as normas do sistema de trânsito brasileiro.
*Colaborou Alison Silva




