A Polícia Federal deflagrou na manhã desta quarta-feira (26) a Operação Balcãs, ação internacional que busca desarticular uma organização criminosa ligada a uma das máfias mais influentes da região dos Balcãs, apontada como responsável por controlar todo o ciclo logístico de envio de cocaína da América do Sul até a Europa.
Mato Grosso do Sul, mais uma vez, apareceu como ponto estratégico do esquema: ao todo, 12 dos 14 mandados de busca e apreensão cumpridos no Brasil ocorreram em municípios pertencentes ao estado.
Veículos sequestrados ultrapassam R$300 milhõesDe acordo com a PF, as medidas foram executadas simultaneamente no Brasil, Holanda e Paraguai, com apoio da Europol, da Senad paraguaia e da polícia holandesa. Além das buscas, três prisões preventivas foram cumpridas. No exterior, houve ainda uma prisão no Paraguai e a emissão de quatro difusões vermelhas.
Somados, os bens sequestrados totalizam 27 veículos e 43 imóveis, ultrapassando R$ 300 milhões. Também houve bloqueio judicial de valores e ativos em instituições financeiras, todos vinculados aos investigados e às empresas usadas pelo grupo criminoso.
Foram sequestrados 27 veículos e 43 imóveis - Polícia FederalAs ações no Estado se concentraram em três municípios da faixa de fronteira, região historicamente utilizada por organizações de tráfico internacional. Em Campo Grande foi cumprido 1 mandado de busca; em Dourados, foram 5 mandados e 1 prisão preventiva; já em Ponta Porã, fronteira direta com o Paraguai, 6 buscas foram realizadas.
As investigações apontam que, do Paraguai, partia uma célula da organização criminosa que mantinha conexão permanente com o traficante europeu identificado como comprador das drogas. Essa estrutura tinha domínio sobre toda a cadeia logística: da aquisição do entorpecente produzido em países andinos até o envio aos portos europeus onde a máfia possuía atuação.
A Operação Balcãs representa a terceira fase da Operação Hinterland, iniciada em 2023. O novo avanço investigativo se concentrou nos compradores das cargas remetidas por meio dos portos brasileiros, especialmente a partir dos desdobramentos da apreensão de três toneladas de cocaína em Pelotas (RS), a maior da história do Rio Grande do Sul.
A PF constatou que o traficante ligado à máfia montenegrina foi o responsável pela encomenda dessa carga e de outras remessas que, ao todo, somam aproximadamente 12 toneladas destinadas ao continente europeu.
Com a cooperação internacional e o avanço das investigações, a PF busca agora aprofundar a responsabilização dos integrantes da organização e estrangular o fluxo financeiro bilionário sustentado pelo tráfico transnacional.
Máfia Montenegrina
A máfia montenegrina (Crnogorska mafija/Црногорска мафија) refere-se às diversas organizações criminosas sediadas em Montenegro ou compostas por montenegrinos. Fora do país, gangues montenegrinas atuam por toda a Europa, principalmente na Sérvia. Essas gangues tendem a se especializar no contrabando de narcóticos, tabaco e armas.
O relatório estratégico da Europol - European Union Serious and Organised Crime Threat Assessment (SOCTA), de 2021, identificou 10 grupos de crime organizado de alto risco no país, com destaque para os clãs Kavač e Škaljari, que desempenham papel central no chamado cartel dos Balcãs.
A maioria dos demais grupos de alto risco em Montenegro são subordinados ou aliados a um dos dois clãs de Kotor mencionados. Os principais grupos criminosos especializam-se no contrabando de narcóticos, com o contrabando de cigarros sendo também foco de várias associações criminosas.
A história da máfia montenegrina está entrelaçada com as transformações dos Bálcãs após a dissolução da Iugoslávia; a localização estratégica de Montenegro e sua proximidade com a Itália e outros países da região favoreceram o desenvolvimento do crime transnacional.
Nos anos 1990 e 2000, grupos montenegrinos fortaleceram ligações com organizações italianas, como a Camorra e a Sacra Corona Unita, inicialmente no contrabando de cigarros e depois no tráfico de cocaína.
A desarticulação das comunicações Sky ECC, em 2021, trouxe à tona crimes antes não solucionados e revelou ligações entre clãs e agentes públicos, enfraquecendo, mas não eliminando, o poder dos clãs Kavač e Škaljari.
Clãs mencionados:
- Clã Škaljari — originário de Škaljari, em Kotor; presença em Bar, Budva, Cetinje e Podgorica; organização mais horizontal.
- Clã Kavač — batizado pela vila de Kavač; presença em Herceg Novi, Podgorica, Nikšić e Cetinje; considerado próximo a remanescentes do clã Šarić.
- Clã Budva — aliado dos Škaljari; lideranças citadas no material.
- Clã Bar — com atuação em Bar e reputação de laços com policiais regionais.
- Clã Bečići — aliado ao clã Kavač.
- Clã Berane — do norte de Montenegro, especializado em narcóticos.
- Panteras Cor-de-Rosa — grupo internacional atribuído a cidadãos montenegrinos em roubos de joias.
O material aponta ainda que os clãs mantêm ramificações e associados em vários países europeus como Espanha, Itália, Holanda, Alemanha, Bélgica, Grécia, Hungria, Ucrânia e Turquia e presença direta na América do Sul, com portos no Brasil, Equador e Uruguai identificados como pontos de carregamento para traficantes montenegrinos.


