Perícia realizada num pen-drive apreendido pela Polícia Civil junto ao guarda municipal Marcelo Rios, 42 anos, encontrou verdadeiro dossiê de um produtor rural da região de Bonito. O homem, de 50 anos, natural de Itu (SP), pode ser um dos alvos do grupo de extermínio investigado pela Delegacia Especializada de Repressão a Roubos a Bancos, Assaltos e Sequestros (Garras), em conjunto com o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco).
Rios foi preso no dia 19 de maio, com arsenal de armas, e é suspeito de integrar quadrilha de pistolagem em Campo Grande.
Conforme documentos anexados a processo relativo ao caso, a perícia realizada pelo Instituto de Criminalística do Estado no aparelho encontrou sete imagens, um documento de texto e dois arquivos em PDF, entre outros arquivos.
Em meio aos documentos, havia uma pesquisa realizada sobre o produtor rural de Bonito na Receita Federal, com diversos dados pessoais. Também a respeito do fazendeiro, foi encontrada a imagem de uma busca feita por um advogado, no Sistema de Informações Criminais (Sinic).
INVASÃO
O Correio do Estado apurou que o advogado em questão é réu numa ação de interdito proibitório, juntamente do fazendeiro, cujo nome consta nos arquivos do pen-drive. Interdito proibitório é um mecanismo processual de defesa utilizado para impedir agressões iminentes que ameaçam a posse de alguém. É um instrumento que a Justiça comum utiliza principalmente contra ocupações de imóveis ou propriedades rurais.
No caso, consta em processo no site do Tribunal de Justiça que, no dia 18 de outubro de 2013, o advogado teria se dirigido até uma fazenda na região de Jardim, na companhia de outros homens, que portavam armas de fogo. No local, o advogado teria arrebentado o cadeado da porteira da fazenda e rendido o capataz da propriedade. Consta no processo, ainda, que o advogado ameaçou o trabalhador e o colocou dentro de um veículo, contra sua vontade. O funcionário disse que foi levado para a cidade, onde recebeu um cartão do advogado e foi orientado a não retornar à propriedade rural.
A fazenda invadida pertence à Associação das Famílias para Unificação e Paz, entidade criada por Sun Myung Moon, conhecido como reverendo Moon, que morreu aos 92 anos, em 2012. Moon morava na Coreia do Sul, onde foi estabelecida a sede de sua igreja, denominada Unificação e Paz, no entanto, boa parte do seu patrimônio foi construída em Mato Grosso do Sul, principalmente, no município de Jardim, onde o reverendo chegou em 1996.
Moon adquiriu grandes propriedades rurais no Estado, inclusive na região do Pantanal, e diversos imóveis. Além da igreja, ele criou o Instituto Nova Esperança, mantido na fazenda New Hope, e anunciou a construção de um hospital spa, em Guia Lopes da Laguna, com recursos previstos de R$ 58 milhões. O reverendo também foi o fundador de um time de futebol do Estado, o Clube Esportivo Nova Esperança (Cene), que chegou a jogar na série D, da primeira divisão.
Mas, junto do império, Moon adquiriu dívidas milionárias em Mato Grosso do Sul, sendo a maior parte em decorrência de infrações ambientais e pendências trabalhistas, como dívidas com advogados. Anos antes de o reverendo morrer, as terras mais valiosas pertencentes a ele foram alvo de um impasse jurídico. Por meio de um contrato considerado abusivo, um advogado transferiu parte das propriedades para o seu próprio nome. O impasse acabou reduzindo o império do coreano a apenas 17 propriedades, e a atividade religiosa, em mera burocracia.
Procurado pela reportagem, o delegado Fábio Peró, do Garras, explicou: “Por enquanto, não podemos adiantar nada. O que posso dizer é que ele [fazendeiro] já foi intimado para depor em Campo Grande, só que não apareceu. Mas ainda pretendemos ouvi-lo nos próximos dias”.
*Os nomes do produtor rural e do advogado foram preservados, uma vez que eles não são suspeitos de participação nos crimes em questão.