Rio atingiu 5,72 metros e Porto Murtinho e alagou boa parte do trecho de 13 quilômetros do ramal de acesso entre a BR-267 e a cabeceira da ponte
Depois das chuvas intensas que atingiram a região sudoeste de Mato Grosso do Sul e boa parte do Paraguai durante a Semana Santa, o nível do Rio Paraguai chegou a 5,72 metros em Porto Murtinho no último sábado (03) e depois disso recuou dois centímetros, ficando em 5,70 metros nesta segunda-feira (5)
Além de invadir dezenas de residências do lado Paraguio, em Ilha Margarida, as águas do Rio Paraguai se esparramaram no lado brasileiro e estão tomando conta de boa parte do trecho por onde está sendo construído o ramal rodoviário de 13 quilômetros entre a BR-267 e a cabeceira da ponte sobre o Rio Paraguai.
De acordo com Toninho Ruiz, jornalista de Porto Murtinho que acompanha de perto as obras e a alta no nível do rio, parte dos pilares que já foram instalados nos trechos mais baixos da alça de acesso à ponte estão com 1,8 metro sob a água.
Durante os últimos dias de abril foram em torno de 450 milímetros de chuva na região e tanto os rios do lado paraguaio quanto brasileiro que desembocam no Rio Paraguai transbordaram. Depois disso, o próprio Rio Paraguai subiu e agora está represando a água de rios como o Amonguijá e Criminosa.
E, a água destes dois rios é que se espalhou e parte da região onde estão sendo construídos os 13 quilômetros da alça de acesso à ponte está submersa. Mesmo assim, segundo Toninho Ruiz, os cerca de 350 operários seguem trabalhando em regiões onde o terreno é mais alto.
Imagens feitas por drone pelo jornalista Toninho Ruiz mostram dezenas de imóveis do lado paraguaio tomados pela água. Segundo ele, porém, estas casas e estabalecimentos comerciais já estão sobre palafitas e adaptadas para enfrentar as cheias.
Com 5,72 metros, a cidade de Porto Murtinho não correu risco de ser alagada, pois desde 1982 está protegida por um dique de 11 quilômetros que somente é superado se o nível chegar a 10 metros, o que nunca ocorreu.
Porém, depois que o nível alcança 5,35 metros a água já fica no nível da área urbana e duas comportas pelas quais escoa a água da chuva precisam ser fechadas para que o rio não invada a cidade. A partir daí, toda a água da chuva precisa ser drenada por duas bombas elétricas para evitar alagamentos.
Mas do lado paraguaio, depois que o nível passa dos 5,30 metros, praticamente todos os cerca de 80 imóveis da Ilha Margarida estão tomados pela água, explica Toninho Ruiz.
No ano passado, o nível máximo do rio em Porto Murtinho foi de apenas 2,29 metros. O mínimo, por sua vez, foi de apenas 53 centímetros, um dos mais baixos já registrados na região.
OBRA DA PONTE
No local da ponte, às margens do Rio Paraguai, as construtoras se precaveram às possíveis cheias e construíram uma espécie de dique. Por conta disso, a água não atingiu o canteiro de obras e os trabalhos seguem normalmente.
Do lado brasileiro, a torre de 130 metros já está concluída e agora começou a fase do chamado trem de avanço, que é a colocação dos cabos de aço e das primeiras vigas de concreto sobre o leito do rio.
Do lado paraguaio esta torre está em 86 metros, já que apresentou defeito e oito metros tiveram de ser retirados Mas, a partir desta segunda-feira começaram a ser refeitos.
A obra da ponte do lado brasileiro teve início nas primeiras semanas de 2023. Ainda durante o período de preparação do canteiro de obras, o nível do rio chegou a atingir 5,94 metros, em 8 de março.
As obras da alça de acesso, porém, começaram somente em setembro do ano passado e esta é a primeira vez que a região passa por uma cheia. Ou seja, esta é a primeira vez que a obra passa por um teste para saber se passam ilesas por um longo período de alagamento.
Em 2023, a água demorou em torno de dois meses para retornar à calha principal do Rio Paraguai. Agora, como o Rio Miranda, que deságua no Paraguai acima de Porto Murtinho, também está cheio e em Ladário o rio também continua subindo, a tendência é de que a cheia seja ainda mais prolonga.
As obras do complexo aduaneiro e do trecho de 13 quilômetros de rodovia para interligar a BR-267 à ponte sobre o Rio Paraguai, estão orçadas em R$ 472 milhões e são tocadas por um consórcio de empreiteiras de outros estados.
A previsão inicial é de que os trabalhos se estendam por dois anos e a meta é que ainda antes do final de seu terceiro mandato o presidente Lula venha a Porto Murtinho para inaugurar tanto a alça de acesso quanto a ponte.
Os R$ 472 milhões estão sendo bancados integralmente pelo governo federal e a obra da ponte, que deve custar pouco mais de meio bilhão de reais, está sendo custeada com recursos da hidrelétrica de Itaipu.
O resultado da licitação das obras de acesso foi oficializado pelo DNIT em 16 de novembro do ano passado e o vencedor foi um consórcio denominado PDC Fronteira, formado pelas empreiteiras Caiapó, Paulitec e DP Barros, de Goiás e São Paulo, que venceram por terem oferecido o menor preço.
ALTO CUSO
Mas o que explica esse alto valor para uma obra de apenas 13 quilômetros de asfalto e que também prevê a construção de uma estrutura aduaneira? Conforme a proposta vencedora, o item mais caro será a terraplanagem, que vai consumir impressionantes R$ 145,9 milhões.
A obra é no meio do Pantanal, região sujeita a inundações pelo Rio Paraguai. Por isso, os 13 quilômetros terão de ser construídos parcialmente sobre uma espécie de dique para que fique acima do nível de possíveis inundações.
Em outra parte, justamente a que agora está submersa, a rodovia ficará sobre pilares, o que permitirá o escoamento das águas em períodos de cheia, que em alguns anos se estendem de janeiro a julho.
A cidade de Porto Murtinho, por exemplo, é protegida por um dique de 11 metros de altura, construído depois de uma grande cheia em 1982, quando boa parte da cidade ficou submersa. Depois disso, na maior cheia que se tem registo, a de 1988, quando o nível do Rio Paraguai atingiu 6,64 metros na régua de Ladário, a cidade ficou a salvo por causa desta barragem.
E não é somente a estrada que terá de ser construída no alto. O aterro também vai abrigar toda a obra da aduana. E é exatamente esse centro aduaneiro que terá o segundo maior custo de todo o projeto. Dos R$ 472,4 milhões, um total de R$ 126,6 milhões serão somente para essa estrutura.
Outro item do edital que chama a atenção são as chamadas “obras de arte especiais”, as quais vão consumir R$ 101,5 milhões. O edital não especifica o que serão exatamente essas obras.
Mas, parte deste dinheiro deve ser destinado a uma grande área de estacionamento para caminhões, já que existe a previsão de que centenas de veículos de carga passem diariamente pela rota bioceânica, indo ou vindo do Paraguai, Argentina e Chile.
Somente estes três itens (terraplenagem, aduana e obras de arte) vão consumir 79,2% do montante da obra. Ainda de acordo com a licitação, a pavimentação propriamente dita dos 13 quilômetros vai custar “apenas” R$ 23,3 milhões, o que corresponde a 4,9% do custo total.
A ponte sobre o Rio Paraguai terá 1,3 mil metros e cerca de 70% dos trabalhos estão concluídos. E, por conta do atraso de seis Meses no início dos trabalhos do acesso, é provável que a ponte fique pronta bem antes da via de acesso.
Por conta das cheias, o projeto de engenharia prevê a construção de seis pontes de concreto para vazão da água.
Ponte sobre o Rio Paraguai, em Porto Murtinho, está com cerca de 70% dos trabalhos concluídos (foto Toninho Ruiz (arquivo)ROTA
A Rota Bioceânica é um corredor rodoviário com extensão de 2,4 mil quilômetros que ligará os dois maiores oceanos do planeta, Atlântico e Pacífico, partindo do Brasil e chegando aos portos de Antofagasta e Iquique, no Chile, passando pelo Paraguai e pela Argentina.
O projeto que começou a ser debatido em 2014 e que iniciou em 2017 tem a promessa de ampliar a relação comercial do Estado com países asiáticos e sul-americanos.
Conforme estudo da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), os custos para o envio da produção sul-mato-grossense serão reduzidos, além do tempo de viagem, que será encurtado em até 17 dias rumo ao mercado asiático.
A Rota Bioceânica, conforme os mais otimistas, terá potencial para movimentar US$ 1,5 bilhão por ano em exportações de carnes, açúcar, farelo de soja e couros para os outros países por onde passará.
O Correio do Estado procurou o consórcio responsável pelas obras do contorno rodoviário em busca de informações sobre possível atraso no cronograma por conta da cheia do Rio Paraguai, mas até a publicação da reportagem não obteve retorno.