Entregue no dia 12 de setembro, o relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou o contrato do transporte coletivo de Campo Grande conta com denúncias dos problemas que cercam o serviço e indiciamentos de ex-diretores e de agentes públicos.
Porém, mais de um mês depois da conclusão da investigação, nenhum efeito prático foi realizado até agora, tanto para os usuários como para os pedidos administrativos.
Nas ruas, as reclamações continuam. Marilda Sanches, de 59 anos, anda pela cidade utilizando o transporte público coletivo todos os dias. Ela cita que a superlotação é o maior problema e que chega a perder o seu ônibus por causa disso.
“Está muito lotado. Tem um horário que é antes do meu, às 17h15min, ele quase não para, aí só passa esse das 17h30min, que, às vezes, você não consegue nem entrar”, disse.
Uma das denúncias da CPI era justamente a superlotação e foi sugerida a elaboração imediata da Matriz Origem-Destino atualizada, essencial para o planejamento técnico-operacional, a fim de solucionar este e outros problemas relacionados. Mas, de acordo com Marilda, “não mudou nada, continua do mesmo jeito”.
Desde pequeno, com o benefício do passe de estudante, Gabriel Rodrigues, de 18 anos, utiliza o transporte coletivo, que agora ele usa para ir e voltar do trabalho. Diferente de Marilda, ele comenta outros dois problemas dos ônibus: preço da passagem e sujeira.
“Às vezes, os ônibus estão sujos, muito pichados, o que deixa o ônibus meio feio para mim. Além do preço”.
Hoje, a tarifa de ônibus está custando R$ 4,95. Gabriel também insiste em falar que não houve nenhuma mudança de setembro para agora, afirmando que os problemas continuam.
ENROLAÇÃO
Após apresentado à população, o relatório final foi encaminhado ao Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS), Ministério Público Federal (MPF), Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso do Sul (MPT-MS) e ao Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul (TCE-MS).
De acordo com os protocolos de envio, a Câmara Municipal demorou 18 dias até encaminhar o documento aos órgãos, visto que data do dia 1º de outubro. Ao Correio do Estado, o TCE-MS informou que não recebeu o relatório final da CPI.
Já o Ministério Público informou que o recebeu o documento, porém, ainda não dedidiu sobre os pedidos de indiciamentos.
“Em relação ao relatório da CPI do Transporte Coletivo, o material foi encaminhado à 25ª e à 43ª Promotorias de Justiça de Campo Grande, que estão analisando o conteúdo”, disse o MPMS em nota.
Já o MPT-MS informou que desde o dia 12 de junho abriu uma investigação sobre relatos feitos por ex-funcionários a respeito do Consórcio Guaicurus durante oitivas da CPI do Ônibus.
“Com base na compilação dos fatos relatados pelas testemunhas, mencionados tanto em ofício da Câmara Municipal, bem como nas publicações da imprensa, o MPT entendeu que havia necessidade de aprofundar as investigações e, desta forma, no dia 23 de junho, converteu a notícia de fato em um procedimento preparatório”, diz nota do MPT-MS.
“No dia 16 de outubro, foi juntado aos autos do procedimento o relatório final da CPI do Transporte Público, remetido ao MPT pelo presidente da Câmara Municipal de Campo Grande, vereador Epaminondas Neto.
Diante desse novo elemento, o MPT está analisando o conteúdo do documento para identificar se existem eventuais irregularidades não contempladas no escopo atual da investigação, para, eventualmente, incluí-las no procedimento e, então, definir os próximos encaminhamentos. Seguimos à disposição”, completou o órgão.
O QUE O RELATÓRIO DIZ?
Ao todo, o documento conta com cerca de 200 páginas, com constatações, apontamentos e indiciamentos, do qual cada vereador tirou suas conclusões e encaminhou as sugestões individuais para o documento final. Integraram a comissão os parlamentares Dr. Lívio (União Brasil), Ana Portela (PL), Júnior Coringa (MDB), Maicon Nogueira (PP) e Luiza Ribeiro (PT).
Entre os apontamentos feitos por eles, a comissão pediu para que o Consórcio Guaicurus esclareça a venda de um imóvel da Viação Cidade Morena, justifique a movimentação financeira de R$ 32 milhões entre a Viação Cidade dos Ipês – que não integra o consórcio – e explique as despesas de manutenção com percentual de 84% e das despesas não operacionais, que saltaram de R$ 250 mil para R$ 11 milhões em 2021.
Além desses três tópicos, a CPI também solicitou o encaminhamento dos dados financeiros, contábeis e operacionais para fiscalização.
Também, foi sugerida a substituição imediata de 197 ônibus que já estariam com idade útil de cinco anos vencida e a realização de uma revisão tarifária “justa e favorável à população”, diante da ausência de uma retificação ordinária de 2019, prevista para acontecer a cada sete anos.
Isso posto, foi constatado, de acordo com o relatório, que o município de Campo Grande tem negligenciado a fiscalização do transporte público, “deixando de investir em infraestrutura, modernizar a legislação e realizar concursos para reforçar as equipes da Agereg [Agência Municipal de Regulação dos Serviços Públicos] e Agetran [Agência Municipal de Transporte e Trânsito]”, as principais envolvidas no caso do Consórcio Guaicurus.
O documento também sugere o indiciamento de Odilon de Oliveira Júnior e Vinicius Leite Campos, ambos ex-diretores da Agereg, de Janine de Lima Bruno e Luís Carlos Alencar Filho, ex-diretores da Agetran, e de diretores do Consórcio Guaicurus.
*SAIBA
Entre os apontamentos do relatório, os vereadores indicaram que, caso os pedidos não sejam atendidos, há a possibilidade de intervenção municipal na concessão do transporte coletivo.


