Valenciana, marinera, mista, alicantina, de bacalhau ou à francesa? Nenhuma delas.
A paella tem sotaque próprio em Mato Grosso do Sul.
Quem garante é o chef Adriano Gomes, um dos grandes talentos da gastronomia contemporânea do Estado, que, entre as principais atrações do seu livro de delícias, ostenta nada menos que a cobiçada – e já tradicional – receita de paella pantaneira.
Saem os frutos do mar, entra um combinado de carnes de grande apelo por aqui, desde
a linguiça de Maracaju ao bacon, passando pelo frango.
Escreva a legenda aquiEmbora cada vez mais presente nos cardápios regionais, graças, inclusive, ao trabalho incansável de profissionais de mão cheia como Adriano Gomes, a paella pantaneira ainda é novidade para muita gente.
Muitos até já ouviram falar, mas, mesmo assim, ainda reputam o prato com um pedigree exclusivamente espanhol, o que não passa de um desconhecimento.
Antes de cruzar o Oceano Atlântico, a paella, na verdade, é um patrimônio de longa tradição a ser dividido, pelo menos, com mais uma nação europeia: Portugal.
Na costa oriental da Península Ibérica, onde se situa o País Valenciano, comunidade autônoma espanhola no Mediterrâneo, os registros envolvendo a paella data, pelo menos,
do século 18.
Mais remotamente, no século 16, o agrônomo Francisco de Paula Martí anota o que talvez seja uma das primeiras receitas do então chamado arroz à valenciana. Confira a seguir.
“Para que o arroz à valenciana fique igual à maneira como é feito pelos naturais, é preciso cozê-lo em lume [fogo] muito alto, preferindo o de chama, para que não se interrompa a fervura. Para saber qual a quantidade de caldo necessária, seja qual for a que se pretenda guisar [refogar], existe geralmente uma regra de removê-lo com uma colher de pau. Antes de que se deixe repousar, colocam-na no centro do recipiente. Se mantiver sem movimento, adicionam-lhe um pouco mais [de caldo] e repetem até que a colher se mexa sem cair, que é quando há o suficiente”, escreveu Martí, em 1553.
Na sequência, orienta o agrônomo, deve-se manter em fervura até que o caldo fique pronto e o arroz bem cozido.
Não estando ainda nesse ponto, “adicionam-lhe mais caldo, desde que esteja quente para que não se interrompa a fervura, porque se isso acontece, o resultado é que o caldo não penetra no arroz, ficando o coração dos grãos duros. Quase nunca é necessário adicionar mais caldo do que o que dissemos ao princípio, e se alguma vez acontecer, é porque o arroz está muito bem granado e precisa de mais alguma umidade para que seja bem penetrado”.
Um entrecho da receita de Martí abre caminho para inovações como as que propõe o chef Adriano Gomes: “As demais circunstâncias do condimento ficam ao critério de quem o guisa. Será tanto melhor quanto mais delicada seja a substância que contenha, como ficou denotado”. Ou seja, está valendo a apropriação pantaneira.
Para começar, a dica perfeita é deixar todos os ingredientes higienizados e cortados antes de iniciar o prato.
E, primeiramente, fritar as carnes suínas, depois as bovinas. São palavras do próprio mestre culinário, um apaixonado pelos roteiros gastronômicos do Pantanal e que costuma apresentar a paella pantaneira em turnês por Mato Grosso do Sul e outros estados.
“Gosto muito de viajar e ver a maneira que os seus moradores desenvolvem a ligação com o terroir pantaneiro. Uma ligação forte com os alimentos da terra. O gosto pela história das comitivas e pelas curiosidades de sua culinária tão peculiar”, derrama-se Adriano Gomes.
O chef diz ainda que é necessário evitar o excesso de temperos e observar com cautela o tamanho do corte das carnes e legumes.
“Para que, na finalização do prato, tenha uma harmonia completa entre os ingredientes. Para favorecer e exaltar o sabor do prato”, fundamenta o artista do avental nascido em Amambai e que, além dos cursos de formação (Senac) e pós-graduação (Unigran) em Gastronomia, é graduado em História.
Em seu currículo, ele traz consultorias e sua assinatura em cardápios de restaurantes locais, de São Paulo e Santa Catarina.
“A paelha pantaneira, como a valenciana, é um prato completo, que une as pessoas em volta à mesa, traz beleza e inspira os convidados”, descreve Adriano Gomes, que prefere a grafia da receita em português brasileiro, com L e H mesmo.
“Um prato que aguça o paladar e que, após uma garfada, nos traz à memória afetiva lembranças que a comida nos trouxe durante a vida, resgatadas por meio de cheiros, sabores e texturas”. Por favor, chef, pare. Hora de colocar em prática vossos ensinamentos.
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Ryan Keberle, trombonista - Foto: Divulgação / Alexis Prappas

Marcio Benevides, Maria José falcão e Fabiana Jallad
Andreas Penate e Monica Ramirez


