Eles nasceram no Nordeste, mas o mundo é o limite. À frente do Estúdio Mula Preta, os potiguares André Gurgel, 37, e Felipe Bezerra, 55, transformaram uma ideia provocativa em uma das marcas mais sólidas, premiadas e desejadas do mobiliário autoral brasileiro, sem jamais perder o bom humor, o sotaque e a visão afiada para os negócios.
Fundado em Natal, em 2012, o estúdio começou com uma proposta que chamou atenção de cara: peças com nomes irreverentes, estética ousada e muita originalidade. Mas o que parecia uma brincadeira de design logo se revelou um projeto ambicioso, estratégico e à prova do tempo. De lá para cá, o Mula Preta abriu lojas em São Paulo e no Rio Grande do Norte, conta mais de 30 pontos de venda no Brasil e é presença em eventos internacionais e prêmios como o iF Design Award (Alemanha), o Good Design Award (EUA) e o A’ Design Award (Itália).
Entre uma provocação e outra, o estúdio foi afinando sua linguagem e abrindo espaço para uma linha autoral contemporânea e, ao mesmo tempo, versátil, que hoje transita com facilidade entre projetos minimalistas e produções maximalistas de interiores. O que não mudou? A assinatura cheia de personalidade e o rigor técnico das peças.
Por trás desse sucesso, está a combinação rara entre sensibilidade criativa e mentalidade empresarial. André Gurgel é designer de produto, mas também cofundador da startup de tecnologia Synco, voltada para soluções em IoT. Já Felipe Bezerra é designer de produto e arquiteto com décadas de atuação e sócio do EMA Arquitetura. Juntos, eles conduzem o estúdio com olhar cirúrgico para branding, diferenciação e construção de valor.
“O Mula Preta é um estúdio que virou negócio, uma estética com identidade própria que se tornou uma marca com valor de mercado e que hoje inspira uma nova geração de empresários criativos brasileiros”, define Felipe. Já André vai além: “Design, pra gente, não é só forma. É posicionamento, narrativa e relevância no tempo. O desafio sempre foi unir criação com estratégia, estética com gestão.”
Com uma loja na capital paulista — que completa cinco anos em 2025 —, o Mula Preta intensificou o contato direto com o consumidor final e o público especificador. O espaço virou não só vitrine para as peças da marca, mas ponto de encontro entre design, moda, arte e cultura. Em 2024, a loja foi palco de lançamentos e desfiles de marcas como Carolina Herrera e Mondepars. Tudo com aquele tempero nordestino que virou marca registrada dos sócios.
Hoje, o estúdio se prepara para um novo salto: expansão internacional, novas collabs e coleções que reforcem sua vocação para o atemporal com alma brasileira. E, claro, mantendo o espírito livre e criativo que fez o Mula Preta conquistar o Brasil e mirar no mundo.
Destaque B+: Do RN para o mundo: designers-empresários reinventam design brasileiro - DivulgaçãoConfira a entrevista:
CE - Como nasceu o Estúdio Mula Preta?
MP - O Mula Preta nasceu em 2012, em Natal (RN), da minha parceria com o arquiteto e designer Felipe Bezerra. O Felipe já tinha uma trajetória sólida e premiada em projetos autorais, e eu vinha do design de produto e tecnologia. Juntos, decidimos criar um estúdio que unisse estética ousada, identidade cultural e visão estratégica de negócios. A ideia era simples, mas ambiciosa: reposicionar o design brasileiro no mapa global, sem perder a essência da nossa cultura regional.
CE - De onde veio o nome “Mula Preta”?
MP - O nome veio da canção “Mula Preta”, de Luiz Gonzaga, e escolhemos justamente por causa do impacto que ele causa. É provocativo, memorável e traduz a força cultural do Nordeste. Sempre digo que, numa lista de designers, ele salta aos olhos: desperta curiosidade e convida à pesquisa. Desde o início, nossa proposta foi criar peças que combinassem ousadia, sofisticação e humor, explorando tanto a produção artesanal quanto processos industriais. O nome é, na verdade, a nossa primeira provocação.
CE - Qual foi o tamanho do investimento inicial?
MP - O maior investimento não foi financeiro, e sim criativo: tempo, dedicação e ousadia para desenvolver um portfólio que se destacasse. Nossa estratégia sempre foi crescer de forma consistente, sem abrir mão da essência autoral.
CE - Em algum momento bateu o medo de a ideia não dar certo?
MP - Medo não. O que tínhamos era consciência dos riscos e clareza de que o mercado não perdoa repetição ou falta de posicionamento. O desafio era transformar um conceito provocativo em um negócio sólido. Nunca trabalhamos pensando “e se não der certo?”, mas sim “o que podemos fazer para dar certo?”.
CE - Qual a importância de trazer a essência do Nordeste para o design brasileiro?
MP - O que nos move é representar um Nordeste globalizado, contemporâneo e sofisticado. Não seguimos o clichê estético do mercado. Nossa regionalidade está no humor, na alegria, na leveza e na ousadia. A nossa flagship em São Paulo, por exemplo, poderia estar em qualquer capital do mundo, mas carrega no DNA essa energia nordestina, traduzida em experiências e não apenas em materiais ou formas.
CE - Como foi criar um cenário sofisticado sem abrir mão das raízes nordestinas?
MP - Foi um exercício de tradução cultural. Nossa sofisticação vem da forma como reinterpretamos símbolos, gestos e emoções das nossas origens, sem literalidade. É uma curadoria de elementos intangíveis — humor, acolhimento, ritmo e cor — filtrados por um olhar global.
CE - Ainda existe preconceito com essa estética?
MP - Menos do que há dez anos, mas ainda existe. Muitas vezes, o design com características regionais precisa provar que pode estar nas mesmas mesas de negociação que marcas europeias de luxo. Por isso, nossa estratégia sempre foi não pedir licença, mas chegar com consistência e qualidade técnica impecável.
CE - As coleções Xaxado e Celeiro trazem referências diretas à cultura nordestina. Como é para você ver essa estética ganhando força, não só nas peças do estúdio, mas também no cenário do design e da arte contemporânea?
MP - É emocionante. Ver o Nordeste ganhar espaço, não como tendência passageira, mas como expressão legítima de cultura, nos enche de orgulho. Quando criamos peças como o banco Xaxado ou a mesa Celeiro, sabíamos que estávamos fazendo mais do que design. Estávamos contando histórias, projetando memória e identidade para o futuro.
CE - Quais são os principais desafios para entrar e se manter no mercado de luxo, normalmente tão exclusivo?
MP - O maior desafio é conquistar credibilidade e consistência. No mercado de luxo, não basta ter um produto bonito — é preciso ter história, qualidade e entrega impecáveis. Além disso, o luxo é um jogo de relações: é fundamental construir uma rede sólida de parceiros e clientes para se manter relevante.
CE - Como foi receber Mondepars e Carolina Herrera no estúdio?
MP - Foi natural e, ao mesmo tempo, simbólico. O Mula Preta sempre buscou integrar moda, arte e design, então receber marcas como Carolina Herrera e Mondepars na nossa loja em São Paulo foi a confirmação de que esse cruzamento é autêntico. Mais do que eventos, foram encontros entre universos criativos que falam a mesma língua.
Destaque B+: Do RN para o mundo: designers-empresários reinventam design brasileiro - Divulgação
Ryan Keberle, trombonista - Foto: Divulgação / Alexis Prappas

Marcio Benevides, Maria José falcão e Fabiana Jallad
Andreas Penate e Monica Ramirez


