“Puteiro em João Pessoa”, “Selim”, “Tora Tora”, “Esporrei na Manivela”, “Eu Quero É Ver o Oco”, “O Pão da Minha Prima”, “Tá Querendo Desquitar (Ela tá dando)”, “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”, “Mulher de Fases”, “A Mais Pedida”, “Me Lambe”, “Reggae do Manero”.
O que dá a real dimensão de uma banda é o número de sucessos lançados. É assim, pelo menos, para muitos fãs e críticos. E se esse for o critério, com todos os altos e baixos de mais de três décadas de estrada, ou, talvez, também por eles, o Raimundos passa com folga no crivo de “banda grande”.
O grupo tem hits às pencas, a maioria do repertório dos cinco primeiros (de 12) álbuns, mas não somente.
No dia 13 de março, um ataque cardíaco levou Canisso (1965-2023), baixista e um dos dois únicos integrantes da formação original do quarteto que ganhou fama por misturar rock pesado com elementos do forró e outras levadas, além de letras maliciosas cheias de hormônio adolescente.
O outro membro é Rodrigo Aguiar Madeira Campos, o Digão, que assumiu os vocais pela primeira vez, sem nunca largar a guitarra, em 2001.
Aos 52 anos, Digão já está há uma “pá de tempo” como bandleader do Raimundos, e foi nessa condição que conversou com exclusividade com o repórter do Correio do Estado, no sábado, horas antes do terceiro show sem a presença de Canisso, realizado no ABC paulista.
Com o roadie e agora novo integrante Jean Moura empunhando o contrabaixo, o grupo se apresenta amanhã e na quinta-feira no Old Sheep Steak Bar (Av. Min. João Arinos, 527, Tiradentes). A dose dupla é para celebrar os dois anos da casa, com direito a shows de abertura de Thiago Ferreira (amanhã) e da banda Plebheus (quinta-feira).
Na quinta-feira, o público terá a chance de curtir dois dos maiores sucessos do Raimundos com a participação de um quinteto de cordas, sob a liderança do maestro Eduardo Martinelli, “Mulher de Fases” e “I Saw You Saying (That You Say That You Saw)”. Os poucos ingressos ainda disponíveis até a noite de ontem custam R$ 300 (individual), R$ 1.500 (mesa para seis pessoas) e R$ 2.000 (mesa para quatro pessoas). Reservas: (67) 3306-9636 (WhatsApp).
Confira os principais trechos do papo com o Digão.
O que vão mostrar nos shows em Campo Grande?
Será um show rock acústico. Não será nos moldes do nosso DVD, que é mais intimista. Tocaremos as músicas praticamente no mesmo pique de um show normal, mas com uma roupagem de lual. Fizemos nesse formato em Floripa para 30 mil pessoas e foi lindo.
Como tem sido as primeiras apresentações sem o Canisso?
A primeira foi difícil para todo mundo da banda e a equipe, todo esse sentimento da perda e saudade foi muito intenso! A expectativa de algo que não sabíamos que ia acontecer mexeu bastante, mas, a partir do momento em que passou o vídeo em homenagem ao Canisso, a plateia trouxe uma leveza e um carinho imenso que nos carregou no colo! Tocar foi um passo importante para começar o processo de cura da dor. Sentimos que o Canisso estava ali, e isso fez um bem e deu uma segurança a todos que estavam lá!
E para você? O que diria do parceiro de velha data?
O Canisso foi a pessoa com quem eu mais convivi na vida. Passamos por muitas coisas juntos, boas e ruins, mas sempre com aquele espírito de união, gratidão e superação. Canisso era uma pessoa ímpar, extremamente engraçado, inteligente e espirituoso. Tivemos nossas divergências, mas sempre superamos e permanecemos juntos. Um grande irmão!
Como definiria a pegada dele?
Canisso sempre foi o melhor baixista para o Raimundos, não era virtuoso, mas fazia o que tinha de ser feito e muito bem. Tinha pegada e uma palhetada muito particular que fazia o som do Raimundos ser único! Sem contar a figura que era em cima do palco e fora dele.
E o Jean? Qual o maior desafio para essa nova formação?
O Jean é um fenômeno, um músico extremamente habilidoso e que já havia substituído o Canisso e o Caio, na bateria, também em algumas ocasiões. Jean sempre foi um fiel escudeiro na equipe e que se encaixou muito bem. Tem presença e muita vontade.
O maior desafio seria uma rejeição ao Jean, mas ele é muito querido pelos fãs, o que é algo difícil de acontecer. Ele já tinha uma história muito legal com o Canisso, e isso ajudou bastante.
O rock e seu contexto de gênero dominante, com toda a militância, irreverência e inovação, parecem ter ficado no passado. Olhando para trás, como vê o som do Raimundos hoje?
Acredito que o Raimundos hoje seja um exemplo de algo que não deve ser esquecido no rock. Uma irreverência consciente e sem mimimi! Hoje vivemos uma polarização que não está fazendo bem para ambos os lados: irmãos, amigos, parceiros brigando por causa de políticas e ideologias cheias de defeitos e manipulações de gente ruim que está no poder e se beneficiando dessa desunião. Toda essa discussão política é muito recente ainda no Brasil, carecemos de uma maturação maior.
Como se deu tanta mistura de estilos na consolidação do som da banda?
Nunca me prendi a um estilo, gosto de tudo que fazemos dentro do Raimundos e até mais. Não fomos e nunca seremos uma banda de um estilo só. Punk rock, hardcore, ska, metal, repente, reggae e etc. estão presentes no nosso som. Somos uma síntese do que é o Brasil, uma mistura sadia e feliz.
O primeiro álbum completa três décadas em 2024. Topa dar uma geral na cena rocker de lá para cá?
Desde que acabou a década de 1990, o rock perdeu uma força considerável na música que o jovem consome, mas jamais a ponto de, entre aspas, morrer. Sempre tivemos o nosso espaço e, ultimamente, sinto que está havendo uma nova ebulição. Estão rolando grandes eventos de rock pelo País, e acredito que isso fará eclodir boas bandas novas que vão fortalecer mais ainda a cena. É só se aterem mais em fazer música boa que discurso para lacrar.
O que é que você costuma ouvir?
As velharias de sempre. Todas aquelas bandas que me influenciaram a ser roqueiro, desde Iron Maiden e AC/DC, passando por Ramones, Suicidal [Tendencies], Dead Kennedys e indo pelo Red Hot Chili Peppers, Sublime, SOAD e mais uma “pá” de coisa legal que não necessariamente é rock.
Como é a sua rotina no varejo do cotidiano?
Sou marido e pai presente. Ajudo a cuidar da família, faço mercado, levo na escola, enfim, quando sobra um tempo, entro no estúdio para fazer material novo e, fim de semana, é show atrás de show.
O que você mais gosta e menos gosta de fazer?
Tudo que faço no meu cotidiano eu amo. Até lavar pratos! O que não gosto é ver meu dinheiro suado indo para o bolso de político corrupto que faz muito menos do que deveria pelo Brasil.
Você sente falta da cena musical pré-Spotify e redes sociais?
Na nossa época, a dificuldade de conseguir chegar lá funcionava como um filtro que selecionava melhor as coisas. Dava-se mais chance e valor ao que estava se escutando pela primeira vez. Existe uma grande diferença entre o que é bom e o que é fácil.
O imediatismo tomou conta das almas juvenis, e isso não tem sido bom de forma geral. Nos shows vejo pessoas mais preocupadas em filmar e mostrar que estão ali no Insta do que curtir o show, o momento, a experiência, a interação real das pessoas.
Concorda que o público do Raimundos mudou pacas? Qual o perfil atual do fã da banda?
O perfil só mudou para quem ficou velho de alma. Nosso público é quem é de boa com a vida, e a cada dia aparece mais gente nova curtindo e resgatando o som da banda.
O que se pode esperar da banda em termos de novidade?
Podem esperar honra e compromisso com nosso som e história. Tenho material para dois discos, muitas coisas que cabem no Raimundos, e outras, não. Compor é um exercício cheio de infinidades.
Há novas gravações, parcerias e outros projetos à vista?
Muitos! A pandemia me trouxe de volta ao campo da criação e estou extremamente feliz e satisfeito com o que estou produzindo.
Para encerrar, peço que mande um alô para a galera de Campo Grande. Pode ser?
Realmente, Campo Grande é um lugar que fomos muito pouco [em 2001 e 2011, além de um show solo do músico, em 2015]! Difícil vai ser lembrar de algo aí, não lembro nem o que fiz ontem [risos]. Mas fico muito feliz em voltar e fazer duas datas seguidas para vocês. Vai ser demais. Espero toda a galera massa de Campo Grande lá!




