Há filmes que nascem de roteiros. Outros, de silêncios e escutas. “Kaguateka: Aquelas que Resistem” nasceu do encontro, da força das palavras que atravessam gerações, da memória que insiste em permanecer viva, mesmo quando a cidade parece querer apagá-la.
O curta-metragem documental, dirigido por Gleycielli Nonato Guató, é uma celebração da resistência feminina indígena em contexto urbano e, ao mesmo tempo, um marco histórico, pois se trata, segundo a produção, do primeiro filme dirigido por uma mulher guató.
A previsão é de que a obra tenha 15 minutos de duração, e as gravações ocorreram no fim do mês de outubro na capital sul-mato-grossense.
O documentário acompanha cinco mulheres – Suzie Guarani, Luana Kadiweu, Matilde Kaiowá, Mirian Terena e Gleycielli Nonato Guató – que vivem em Campo Grande e integram o Coletivo de Mulheres Indígenas Kaguateka, grupo formado por mulheres de diferentes povos que se unem para fortalecer a cultura, o território, o pertencimento e a dignidade.
O documentário acompanha cinco mulheres: Suzie Guarani, Luana Kadiweu, Matilde Kaiowá, Mirian Terena e Gleycielli Nonato - Foto / DivulgaçãoO curta-metragem busca “tecer”, em gesto coletivo, o cotidiano, as lutas e os sonhos dessas mulheres que reexistem entre o concreto e a ancestralidade.
“Esse documentário surgiu como uma forma de manifestar a nossa união. É uma maneira de registrar as histórias das nossas ancestrais e mostrar as dificuldades que nós, mulheres indígenas, enfrentamos nas cidades. É um fortalecimento, um resgate da nossa história e uma semente para que mais mulheres venham somar conosco”, afirma Suzie Guarani, produtora e uma das roteiristas do filme.
CAMPO GRANDE ANCESTRAL
A partir da convivência, da escuta e da partilha de histórias, “Kaguateka: Aquelas que Resistem” nasce como um gesto político e afetivo. Não é um filme que fala sobre mulheres indígenas, é um filme que fala e é feito por mulheres indígenas, em primeira pessoa, recusando os olhares folclorizantes e as narrativas externas.
Afeto, cumplicidade, partilha e empoderamento - Foto / Divulgação“Esse filme é feito em coletivo. Eu assino a direção e sou uma das roteiristas, mas quem realmente conduz é o próprio grupo Kaguateka. Essas mulheres sabem o que dizer porque vivem isso todos os dias. Elas conhecem suas dores e suas forças. E é uma honra imensa estrear no cinema com um filme feito por mulheres indígenas, sobre mulheres indígenas e para mulheres indígenas”, diz Gleycielli, emocionada.
Campo Grande, uma das cidades com maior presença indígena em contexto urbano no Brasil, aparece no filme não como cenário, mas como território ancestral.
A terra de asfalto e árvores abriga histórias de migração, saudade, adaptação e luta. São histórias que revelam um paradoxo: a cidade que acolhe e, ao mesmo tempo, desafia; o lar que precisa ser reinventado a cada passo.
FILMAR COM O CORAÇÃO
“Durante as conversas do coletivo, percebemos que havia muitas histórias guardadas – de migração, de saudade do território, de dor e também de reconstrução. Essas falas não cabiam só na palavra oral. O cinema se mostrou o caminho para que essas vozes ecoassem mais longe, como um gesto político e poético de resistência”, explica Marcus Teles, diretor-assistente e um dos roteiristas do filme.
Em cada plano, há o cuidado de quem filma com o coração. As imagens foram construídas com consentimento e respeito, acompanhadas por rezas, cantos e fragmentos de línguas ancestrais.
“Cada mulher trouxe um pedacinho de sua cultura, da sua reza, da sua espiritualidade”, conta Gleycielli. “O equilíbrio veio do sentimento de pertencimento. Ninguém de fora disse o que deveria ser feito. Cada uma fez conforme o que sentia”, afirma a educadora, atriz e documentarista estreante.
MEMÓRIA EM FUTURO
A estreia do filme, prevista para acontecer na Aldeia Urbana Água Bonita, será um momento simbólico, de retorno das imagens à comunidade que as inspirou. Após a exibição, uma roda de conversa entre as mulheres do coletivo promete ecoar a força dessas histórias e inspirar novas alianças.
“A expectativa é grande. Queremos que as mulheres indígenas se reconheçam nas nossas falas e venham se juntar a nós, para continuar construindo políticas públicas e fortalecendo nossa presença na cidade”, reforça Suzie Guarani.
Mais do que um filme, “Kaguateka: Aquelas que Resistem” é um registro de um tempo e de um gesto bem singulares, com o protagonismo de mulheres que transformam a dor em memória e a memória em futuro. É também um convite para escutar – com os olhos, com a pele, com o coração – as vozes que o cinema, finalmente, começa a enxergar.
Diretora Gleycielli Nonato Guató estreia na direção e marca pioneirismo guató no cinema - Foto / DivulgaçãoPODER
“O audiovisual é uma ferramenta poderosa. Há muitos filmes com indígenas, mas poucos feitos por indígenas. Este documentário é uma força ancestral histórica. Ele vai levar nossas vozes para muitos lugares”, conclui Gleycielli Guató.
O curta-metragem “Kaguateka: Aquelas que Resistem” é uma realização do Coletivo de Mulheres Indígenas Kaguateka – CGRMS, com investimento da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (Pnab), do governo federal, por meio do Ministério da Cultura (Minc), operacionalizada pela Prefeitura de Campo Grande, por meio da Fundação Municipal de Cultura.
>> Serviço
“Kaguateka: Aquelas que Resistem”
Ficha Técnica
Direção: Gleycielli Nonato Guató.
Direção assistente: Marcus Teles.
Roteiro: Gleycielli Nonato Guató, Marcus Teles, Mirian Terena, Suzie Guarani.
Produção: Suzie Guarani.
Direção de fotografia: Marcio Padilha.
Assistente de fotografia: Luan Iturve.
Som direto: 4real.wav.
Assistente de som: Anderson Kaiowá.
Assistentes de produção: John Terena, Jefley M. Cano.
Assistente de produção executiva: Lucas Moura.
Trilha sonora original: Gian Markes.
Edição de som e imagem: Rafael Viriato.
Produção executiva: Marcus Teles.
Assessoria de imprensa/comunicação: Lucas Arruda, Aline Lira.
Elenco: Suzie Guarani, Luana Kadiweu, Matilde Kaiowá, Mirian Terena, Gleycielli Nonato Guató.





