Por Flávia Viana
Colaborou Denise Neves
Claudia é baiana de Salvador. Uma mulher forte, linda e inspiradora. Essa grande e talentosa atriz começou seu caminho na arte do teatro em 1986, mais precisamente no teatro baiano onde também é premiada. “A importância do teatro é quando você entende que ele é um poder de transformação.
Eu sempre usei o teatro como uma tribuna política social e vislumbro também em poder usá-lo como uma tribuna econômica, que, por enquanto, ainda não somos, ainda não temos isso”, explica.
Claudia Di Moura brilhou muito com a marcante Zefa, sua personagem na novela “Segundo Sol” da TV Globo, onde foi indicada ao “Prêmio Melhores do Ano” como Atriz Revelação.
Depois dela, um sucesso atrás do outro na televisão e também no cinema, onde em breve veremos Claudia brilhar novamente, pois a atriz já esteve em mais de 20 produções nas telonas.
Claudia está de volta na trama das 19h da Globo “Cara e Coragem” no papel de Martha Gusmão, uma empresária poderosa dona de uma siderúrgica e mãe dos personagens de Ícaro Silva e Taís Araújo.
“Foi gerada uma grande expectativa em torno desse papel, no qual a gente tira a mulher negra de um lugar cristalizado pelo audiovisual na subserviência e a coloca numa posição de comando. E isso é uma inspiração para nós, mulheres pretas, que continuamos clamando por personagens que tenham força em qualquer história”, ressalta a atriz.
Além da atual trama das 19h, a atriz também pode ser vista na quarta temporada de “Sob Pressão” (Globoplay) como Dona Maria, personagem que, segundo Lucas Paraizo, autor da série, pode ser considerada a “Avó do Brasil”.
Claudia protagoniza a história da avó de um menino gravemente ferido por arma de fogo após tentar protegê-la.
“Dona Maria é esse rosário de amor, uma mulher encharcada de esperança. Para mim, é muito emocionante falar da garra dessa mulher. Mas, assim como as outras personagens que interpretei como Martha e Zefa, ela também foi abraçada e preparada para ser o grande papel da minha carreira que eu faço com a minha verdade”, explica.
Claudia Di Moura é a Capa desta semana no Correio B+.
Ela fala com exclusividade para o Caderno sobre sua trajetória, escolhas, personagens, televisão, maturidade e também de novos projetos.
Confira a entrevista completa...
CE: No ar como Martha Gusmão em “Cara e Coragem”, como tem sido interpretar a personagem?
CM: “Foi gerada uma grande expectativa em torno desse papel, no qual a gente tira a mulher negra de um lugar cristalizado pelo audiovisual na subserviência e a coloca numa posição de comando. E isso é uma inspiração para nós, mulheres pretas, que continuamos clamando por personagens que tenham força em qualquer história. Mesmo não sendo uma narrativa que parte da gente, mas os personagens negros podem sim ser complexos e fundamentais em uma novela e a gente está provando isso com a Martha.”
CE: Qual tem sido a repercussão da personagem pelo público?
CM: “Que carinho, que amparo, que alegria das pessoas com aquela cara de ‘Hoje algo de novo está acontecendo, está surgindo...’ é assim que eu vejo as pessoas que me olham, que se aproximam para me parabenizar. E não é só um elogio ou um parabéns, é a história que está sendo contada. É um fato histórico que está acontecendo. A gente ter essa novela tão diversa. Então, o público está acolhendo, o público fala muito dos looks da Martha, ela vem orientando tendências, mostrando que ela é uma mulher fina, chique, elegante e livre. E o público vibra muito com essa liberdade e essa força dela.”
CE: Por ocupar um lugar de destaque como uma atriz negra, espaço que tem pouca representatividade na TV... O que isso representa para você?
CM: “Eu sou uma comunicadora através da arte, todas as linguagens artísticas eu já pude experimentar e hoje eu estou vivendo um momento histórico. É muito importante para mim acreditar nesse momento que está acontecendo. Estar interpretando um personagem que há tanto tempo era quase inverossímil de estar com o controle remoto na mão e mostrar essa mulher com essa força.”
CE: Diferente da maior parte dos atores, você foi revelada na TV depois de uma certa idade. Como você avalia o mercado da teledramaturgia para os atores menos jovens?
CM: “Eu acredito que cheguei na hora certa. É um espaço de vaidade, um espaço de poder que pode ser perigoso, mas cheguei madura. Eu cheguei no auge da minha maturidade.”
CE: Para você, qual a importância do teatro na formação de um artista?
CM: “A importância do teatro é quando você entende que ele é um poder de transformação. Eu sempre usei o teatro como uma tribuna política social e vislumbro também em poder usá-lo como uma tribuna econômica, que, por enquanto, ainda não somos, ainda não temos isso.”
CE: Já no streaming, você também pode ser assistida na série “Sobpressão” no Globoplay, como a Dona Maria. Como foi para você se preparar para viver uma personagem com uma história tão forte?
CM: “Dona Maria é esse rosário de amor, uma mulher encharcada de esperança. Para mim, é muito emocionante falar da garra dessa mulher. Mas, assim como as outras personagens que interpretei como Martha e Zefa, ela também foi abraçada e preparada para ser o grande papel da minha carreira que eu faço com a minha verdade.”
CE: No cinema, você vai estrear em “Terapia da Vingança” e em “Arcanos”. O que podemos esperar nesses dois longas-metragens? Pode contar um pouco sobre cada personagem?
CM: “Ainda não tenho autorização para falar muito sobre as personagens, mas o que posso dizer é que foram duas experiências incomparáveis.”
CE: Se pudesse destacar uma personagem que você já interpretou no cinema ou na TV que mais te marcou, qual seria e por quê?
CM: “Eu seria muito ingrata se destacasse uma só. Como eu disse, todas as personagens foram abraçadas carinhosamente sendo um grande papel na minha vida. Mas, tem três que me marcaram: a Martha, a Zefa e a Dona Maria. A Martha está em um dilema de um outro patamar social, eu estou amando fazer ela, estou descobrindo várias camadas, cada cortina que se abre da Martha você vê um detalhe diferente, uma mulher que sabe engrenar a emoção de uma forma elegante e leve. A Zefa vem daquele lugar da mulher subserviente, mas que dá a volta por cima, que acredita, que tem fé, que no final dá um tapa na cara do patriarcado. E a Dona Maria acreditando que a fé dela salva, que a esperança pode salvar o mundo... Então, é muito difícil colocar uma personagem só em um pódio.”
CE: Nas novelas, há algum outro projeto depois de “Cara e Coragem”?
CM: “Tenho convites para algumas séries e cinema, mas, a novela vai até dezembro, então, ainda é muito cedo para fazer alguns planos. Eu tenho um projeto pessoal no teatro, mas ainda não posso falar de datas. Eu costumo fazer teatro de dois em dois anos, só que veio a pandemia e isso já se estendeu para quase quatro e eu sinto muita falta, porque teatro é a minha fonte de vida, minha nascente principal, então, eu preciso voltar para ele.”
CE: Como é a sua rotina?
CM: “De casa para o Projac, do Projac para casa (risos).”
CE: O que te tira do sério?
CM: “Desigualdade. Isso é uma coisa que me entristece, me amortece... A fome me desespera, também.”
CE: O que te inspira?
CM: “A minha fé. Quem me conhece, sabe, que eu tenho uma fé gigante em Deus. Eu costumo dizer que eu sou a filha caçula de Deus. Quando eu abro os olhos, a primeira coisa que eu faço é sorrir para Deus, para ele sorrir de volta para mim. É isso que me inspira. Deus me inspira.”
CE: Ultimamente, temos visto um número maior de atores negros na TV, se comparado há alguns anos atrás... Se você pudesse deixar um recado para quem busca ocupar o espaço que você ocupa hoje de tamanha representatividade no cinema e na televisão, qual seria?
CM: “Eu prefiro deixar o recado para quem tem o comando na mão. Porque as profissões audiovisuais estão sendo muito impactadas pela crescente representatividade que estamos vendo crescer através das redes sociais. A televisão é branca. Nós, pretos, estudamos, queremos mudanças, entramos nas universidades, nós estamos preparados. É o mercado que tem que se abrir para receber a gente. É possível sim ter personagens pretos, desde que a porta esteja aberta. Não adianta falar: ‘Vai dar certo, vai em frente, estude...’, isso, já está sendo feito. Nós temos uma negrada aí mandando muito bem, preparadíssimos só esperando a oportunidade. E a oportunidade tem que ser gerada pelo branco, pelo comando. Eu gostaria de destacar, para além da quantidade de atores negros, ‘Cara e Coragem’ tem sido uma novela histórica pela frente ampla de mulheres. Nós temos autora, diretoras, produtoras, que chegam destravando esse campo minado pelo preconceito. Algo está mudando. É todo um processo de construção e desconstrução, e eu me sinto honrada em poder fazer parte disso.”




