A irmã de Francisco Cezário, Francisca Rosa de Oliveira, saiu em defesa do irmão após ele ter sido preso novamente na manhã desta quarta-feira (28), na residência onde a família mora, em Campo Grande.
Segundo Francisca, o "imperador" do futebol estadual, investigado na Operação Cartão Vermelho, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), que apura o desvio de mais de R$ 6 milhões da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul (FFMS), está sendo vítima, e não há provas de desvio de dinheiro.
"Até agora nós estamos sendo vítimas de uma coisa que nós não estamos nem sabendo, porque não existe nada que diga que houve esse desvio de dinheiro", disse Francisca, ao deixar a residência da família nesta manhã.
Vale lembrar que, conforme informado pelo Gaeco logo após a operação, realizada em maio, foram encontrados R$ 800 mil em espécie na residência de Cezário.
Francisca alega que não há envolvimento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e nem da Federação Brasileira de Bancos (Febrapan) na investigação, o que estaria "descredibilizando" as ações do Ministério Público Estadual (MPE) e do Gaeco na investigação.
"A Coaf é quem realmente investiga desvios e atividades financeiras. Não existe Coaf, não existe Febrapan, não existe imposto de renda, Receita Federal, então ninguém entende o porquê desse tipo de ação", defende Francisca.
A fala também contradiz o que apontam as investigações do Gaeco, já que havia sido identificado que uma das formas de desvio de dinheiro era por meio de saques em espécie nas contas bancárias da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul, em valores inferiores a R$ 5.000,00 justamente para que os órgãos de controle não fossem alertados.
Segundo o Gaeco, foram realizados mais de 1.200 saques, que somados ultrapassaram o valor de R$ 3 milhões.
Questionada sobre o que teria motivado a "nova prisão", a irmã disse não saber. No entanto, informações iniciais apuradas pela reportagem apontam que Cezário teria descumprido ordens judiciais, fato que, segundo Francisca, não procede.
"Nós estamos, inclusive, evitando todo e qualquer motivo para isso, pela idade dele, né? E pela saúde dele, que está fazendo fisioterapia. Ele está com má circulação nas pernas, é cardíaco, é uma pessoa doente e que está sendo vítima de tudo isso", conclui.
Relembre o caso
Cezário foi preso na manhã do dia 21 de maio deste ano, também em casa, por ser um dos alvos da Operação Cartão Vermelho, do Gaeco, que investiga o desvio de mais de R$ 6 milhões da Federação de Futebol de MS, somente entre os anos de 2018 e 2023. Somente na casa de Cezário, foram apreendidos mais de R$ 800 mil.
Menos de uma semana após a Operação, ele pediu afastamento do cargo.
Desde o dia 6 de julho, o "chefão" do futebol de MS teve liberdade concedida, com o uso de tornozeleira eletrônica por 90 dias, e proibição de contato com demais acusados e testemunhas.
Decisão da desembargadora Elizabete Anache, da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, também o proibia de se ausentar da comarca por mais de oito dias sem o prévio conhecimento e anuência do juízo natural, de mudar de endereço sem autorização e de comparecer à sede da FFMS, além de fazer qualquer atividade relacionada à federação.
A liberdade só foi concedida porque no dia 5 de junho, Cezário deixou o Presídio Militar com um princípio de infarto, e precisou realizar um cateterismo, procedimento que trata doenças cardíacas por meio da introdução de um tubo flexível, o cateter. O problema aconteceu logo após ele tomar conhecimento falecimento da irmã, Maria Rosa Cezário, de 81 anos, que morreu naquele mesmo dia, vítima de um Acidente Vascular Cerebral (AVC).
Histórico
Oficialmente, Cezário comandou a entidade futebolística pela primeira vez em 1987, 37 anos atrás.
Neste período, ele ficou, em tese, fora do do comando da associação por quatro anos, entre 2001 a 2004, quando assumiu a prefeitura de Rio Negro, cidade distante 150 quilômetros de Campo Grande. Mesmo assim, controlava a Federação.
Cezário tentou reeleger-se prefeito, mas não conseguiu. Ele voltou para a FFMS e não saiu mais. Normalmente, ele concorre sozinho, sem adversários.
Votam nas eleições da FFMS dirigentes de associações (clubes profissionais), associações (clubes praticantes do futebol amador da capital e do interior) e ligas municipais amadoras. Em torno de 35 pessoas participam do pleito.
Segunda vez
A operação Cartão Vermelho não chega a ser uma novidade no histórico de Francisco Cesário. Ele já havia sido condenado, em 2009 em primeira instância e em 2010 a 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) ratificou a decisão para que cumprisse pena de quatro anos e cinco meses, em regime semiaberto, por desviar algo em torno de R$ 56 mil Federação de Futebol.
De acordo com a assessoria de imprensa do TJ, à época Cezário foi denunciado pelo Ministério Público por ter supostamente transferido recursos da FFMS para a conta particular.
Dizia ainda a denúncia que parte do dinheiro o presidente investiu em campanha política, quando era candidato a prefeito da cidade de Rio Negro, no fim da década de 90.
Na época, a denúncia foi baseada em provas levantadas pela PF em meio a uma CPI que investigou as relações entre a CBF e a Nike.
Operação Cartão Vermelho
Na manhã de 21 de maio, o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO), do Ministério Público de Mato Grosso do Sul, passou sete horas na Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul em ação para deflagrar a Operação Cartão Vermelho, que tinha como alvo não apenas o presidente da FFMS, Francisco Cezário, mas também demais integrantes de uma suposta organização criminosa envolvida em lavagem de dinheiro.
Segundo o balanço, divulgado pelo Gaeco, as investigações já aconteciam há 20 meses, e constataram que foi instalada na Federação uma organização criminosa que desviava valores recebidos do Governo do Estado (via convênio, subvenção ou termo de fomento) e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A quantia desviada era utilizada para benefício dos envolvidos no grupo, e não chegava a ser investida no futebol estadual.
"Uma das formas de desvio era a realização de frequentes saques em espécie de contas bancárias da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul – FFMS, em valores não superiores a R$ 5.000,00, para não alertarem os órgãos de controle, que depois eram divididos entre os integrantes do esquema", diz nota do Gaeco.
Usando desse mecanismo, os integrantes da organização realizaram mais de 1.200 saques, que somados ultrapassaram o valor de R$ 3 milhões.
A investigação também aponta que os suspeitos também possuíam um esquema de desvio de diárias dos hotéis pagos pelo Estado de MS em jogos do Campeonato Estadual de Futebol.
"Esse esquema de peculato estendia-se a outros estabelecimentos, todos recebedores de altas quantias da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul. A prática consistia em devolver para os integrantes do esquema parte dos valores cobrados naquelas contratações (seja de serviços ou de produtos) efetuadas pela Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul", explicou o Gaeco.
De setembro de 2018 a fevereiro de 2023, foram desviados da Federação de Futebol de Mato Grosso do Sul mais de R$ 6 milhões.
A operação batizada como “Cartão Vermelho” cumpriu 7 mandados de prisão preventiva, além de 14 mandados de busca e apreensão, nos municípios de Campo Grande, Dourados e Três Lagoas. Somente nesta manhã, foram apreendidos mais de 800 mil reais.
Saiba: O nome da operação, Cartão Vermelho, é autoexplicativo e faz alusão ao instrumento utilizado pelos árbitros para expulsar os jogadores que cometem faltas graves durante as partidas de futebol.
Colaborou: Neri Kaspary