Leilão marcado para 17 de junho, oferecerá 332 blocos de petróleo e gás, sendo 34 na bacia de Pelotas e 47 na foz do Amazonas
A possibilidade de prospecção de petróleo na bacia de Pelotas, área marítima que se estende do sul de Santa Catarina até a fronteira com o Uruguai, pode colocar a região sul do Rio Grande do Sul no mapa da exploração de combustíveis no país.
No fim de janeiro, o Ibama abriu uma consulta pública visando atualizar as normas para a transferência de petróleo de um navio para outro, as chamadas operações STS (Ship-to-Ship). Dentre as atualizações, está a exclusão do impedimento dessas operações nas bacias de Pelotas e da foz do Amazonas, na chamada margem equatorial, o que foi criticado por ambientalistas.
Na última terça-feira (11), a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) anunciou que um novo leilão, marcado para 17 de junho, oferecerá 332 blocos de petróleo e gás, sendo 34 na bacia de Pelotas e 47 na foz do Amazonas.
A descoberta de reservas de petróleo offshore, estimadas em até 11 bilhões de barris na Namíbia em 2023, chamou a atenção para o que pode ser encontrado seguindo em linha reta para o outro lado do oceano Atlântico. A região da bacia de Pelotas apresenta formação geológica semelhante à do país africano, consequência de uma antiga fronteira que os dividia no supercontinente Gondwana há 140 milhões de anos.
Em dezembro de 2023, a bacia de Pelotas teve 44 blocos arrematados, com perspectiva de investimentos na casa de R$ 1,5 bilhão e pagamento de bônus de R$ 298,7 milhões à União.
A Petrobras arrematou 29 áreas, sendo 26 em consórcio com a americana Shell, que detém 30%. As outras três têm participação da estatal chinesa CNOOC. Já a Chevron, em operação solo, levou 15 blocos.
"Na indústria do petróleo, não há certezas absolutas. Há certezas relativas. Dizer ‘aqui vamos achar petróleo, gás’, isso não existe", disse Edson Silva, ex-diretor-geral da ANP e consultor da ES Petro. Segundo ele, só será possível saber após a abertura dos primeiros poços de prospecção, que devem ficar prontos apenas em 2028, ou depois.
Entretanto, ele nota uma mudança na abordagem nos últimos anos, desde as descobertas na Namíbia, em uma região estudada pela Petrobras desde a década de 1950, sempre sem sucesso.
"O que há de mais avançado em tecnologia de sísmica, coisa que nunca tinha acontecido, está sendo aplicado ali", diz. "Se as multinacionais, principais players da indústria petrolífera, fizeram essa investida, elas não iam fazer às cegas."
A empresa norueguesa Shearwater realiza, desde janeiro, pesquisas sísmicas em 3D no local, com um navio especializado de 112 metros de comprimento.
No dia 12 de fevereiro, a Petrobras firmou um termo de cooperação de R$ 100 milhões com a Marinha para expandir a Remo (Rede de Modelagem e Observação Oceanográfica), ampliando o uso de gliders, robôs de monitoramento que podem chegar a 1 km de profundidade.
Silva vê a exploração como uma possibilidade de garantir que o Brasil não fique sem reservas, que devem diminuir a partir de 2030. "Se não fizermos isso, vamos passar de exportador a importador", diz.
Ele defende que o Ibama faça "exigências significativas" para a exploração da área e sugere que o aumento de receita seja utilizado para estimular a indústria de transição energética. "O Brasil não vai deixar de consumir derivados de petróleo de uma hora para outra", disse.
"Não é contradição a preocupação com a transição para combustíveis renováveis e o investimento na produção de novas jazidas. Nós não vamos deixar de consumir derivados de petróleo, vamos diminuindo."
O desenvolvimento de um polo petroleiro pode recuperar a combalida economia do Rio Grande do Sul.
Mesmo com a suspensão do pagamento da dívida com a União até 2027 e o perdão de R$ 12 bilhões em juros após a catástrofe climática de maio, o estado tem capacidade restrita de investimentos devido à adesão ao Regime de Recuperação Fiscal, sucessivas estiagens nas últimas quatro safras e às demandas da reconstrução.
Atualmente, o Rio Grande do Sul não tem poços ativos. A última perfuração na bacia de Pelotas ocorreu em 2001, sem sucesso. A maior atividade da indústria petroleira no estado está limitada à Refap (Refinaria Alberto Pasqualini), em Canoas, e a Refinaria de Petróleo Riograndense, unidade em Rio Grande que tem Petrobras, Braskem e Ultra como acionárias.
Entretanto, a ideia de transformar o Rio Grande do Sul em um polo explorador, especialmente em um estado símbolo das consequências das mudanças climáticas, preocupa ambientalistas.
"A queima de elementos fósseis é uma das principais atividades humanas responsáveis pela crise climática. Continuar insistindo é um crime contra a humanidade", disse Heverton Lacerda, presidente da Agapan (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural).
Segundo Lacerda, além dos problemas climáticos, produtos derivados do petróleo, como o plástico, impactam os oceanos, ampliando a degradação ambiental e comprometendo a resiliência natural do meio ambiente.
"A transição energética precisa ser financiada com bons projetos e bom senso, não com dinheiro embebido em petróleo. Isso vale tanto para a margem equatorial quanto para a Bacia de Pelotas", disse Heverton.
De acordo com o oceanólogo Eduardo Secchi, professor da Furg (Universidade Federal do Rio Grande), a atividade exploratória inicial pode interferir no comportamento e, eventualmente, na integridade física de algumas espécies devido ao tráfego das embarcações e aos disparos dos equipamentos de prospecção sísmica.
"Entretanto, nesta fase, é possível mitigar, por exemplo, evitando ou reduzindo áreas ou épocas de maior diversidade biológica, especialmente quando essa diversidade inclui espécies já em estado de conservação mais crítico", diz.
(Informações da Folhapress)