O diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) não impede, por si só, que uma pessoa obtenha ou mantenha o registro de Colecionador, Atirador e Caçador (CAC), desde que sejam comprovadas a capacidade cognitiva, a aptidão psicológica e a habilidade técnica para o manuseio de arma de fogo.
A afirmação da advogada Ariane Lemes Matoso ocorre em meio à polêmica recente na Câmara envolvendo entre outros parlamentares, o deputado federal Marcos Pollon (PL), colecionador e líder do Movimento Pró Armas, uma das peças centrais do motim da última quarta-feira (6), diagnosticado com o transtorno em 2024.
Após a repercussão do fato, em suas redes sociais, destacou que não utilizará a condição como "escudo" diante dos últimos acontecimentos.
Capacitação
Segundo Ariane, o autismo não torna alguém automaticamente incapaz. Apenas um laudo médico poderia atestar incapacidade de compreender determinadas situações, enquadrando a pessoa como incapaz ou relativamente incapaz perante a lei. No caso dos CACs, o procedimento inclui avaliações psicológicas e técnicas obrigatórias, que já são renovadas periodicamente.
Se o diagnóstico ocorrer após a concessão do registro, explica a advogada, o caso pode ser reavaliado. “A comunicação ao Exército só é obrigatória se houver indícios de incapacidade, como comportamento inadequado, incidentes com armas ou denúncias. Nesses casos, pode ser aberto um procedimento administrativo para apurar a aptidão”, disse. Caso haja investigação, o titular do registro deverá apresentar novos laudos para que seja avaliado se o espectro autista afeta a segurança no uso das armas.
Cabe destacar que a legislação federal exige, para o registro de CAC, documentos como certidões de antecedentes criminais, comprovante de ocupação lícita, endereço fixo, declaração de segurança do acervo, laudo psicológico e comprovação de capacidade técnica, além do pagamento de taxas.
O ocorrido
Alvo de representação que será analisada pelo Conselho de Ética e na lista dos parlamentares que podem ser suspensos pela ocupação que impediu o trabalho da Câmara Federal por mais de 30 horas, Pollon se defendeu nas redes sociais dizendo que é autista e que, por isso, não estava entendendo o que acontecia no momento em que o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) tentou retomar a cadeira para comandar a sessão da última semana.
Na ocasião, Pollon e o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) foram os últimos parlamentares a deixarem o espaço no momento em que Motta tentou assumir sua função para iniciar os trabalhos.
"Estão dizendo que ele (Marcel van Hattem) sentou na cadeira do Hugo Motta e que ele me incentivou a ficar lá. Isso é mentira. Olhem as imagens. Eu sou autista e não estava entendo o que estava acontecendo ali naquele momento", argumentou Pollon.
Em março deste ano ele já havia anunciado ter diagnóstico tardio de que é autista. O vídeo traz um trecho de um momento anterior em que ele diz para o colega do Novo: "Eu não entendi. Não vou sair".
Segundo a versão de Pollon, ele afirmou que pediu que Marcel van Hattem o acompanhasse até lá para orientá-lo.
"E eu sentei na cadeira do Hugo Motta e ele sentou ao meu lado pois é uma pessoa que eu confio. E falei: 'Me orienta pois pelo que nós combinanos haveria um rito para a desocupação do espaço e esse combinado não foi cumprido. Nós desceríamos antes que o presidente subisse", afirmou.
Dias antes, o deputado chamou o presidente da Casa, Hugo Motta, de "bosta" e "baixinho de um metro e 60".
A declaração foi dada em discurso inflamado durante manifestação em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no domingo (3) no Estado.
Após o fato, o parlamentar afirma que tem sido alvo de ataques preconceituosos e capacitistas, com falas retiradas de contexto, e que a questão estaria sendo usada para desviar o foco de sua principal pauta -anistiar aos presos pelos atos de 8 de janeiro.
“Não vamos descansar enquanto não conseguirmos soltar todas as vítimas do 8 de janeiro. Pessoas estão sendo torturadas. Manifestantes já morreram dentro da cadeia. A anistia é necessária com urgência”, afirmou Pollon, fato confirmado pelo Correio do Estado.
No vídeo alvo de críticas, Pollon relata que pediu a Van Hattem que o acompanhasse para lhe dar suporte como autista, já que não havia compreendido um acordo prévio sobre a desocupação de um espaço. “Eu não estava entendendo e só sairia dali quando tivéssemos uma resposta positiva para as vítimas do 8 de janeiro”, disse.
O episódio levou Motta a sugerir a suspensão de até seis meses do mandato de Pollon, Van Hattem, Zé Trovão (PL-SC) e Júlia Zanatta (PL-SC) por motim. Outros parlamentares envolvidos devem receber advertências, enquanto a deputada sul-mato-grossense Camila Jara (PT) será alvo de análise separada por suposta agressão ao deputado Nicolas Ferreira (PL-MG).
Nesta segunda-feira (11), a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados alterou o prazo para analisar a denúncia contra os 14 parlamentares que ocuparam o plenário da Casa na quarta-feira, de 48 horas para 45 dias.


