Em “Tempos modernos”, Bosco Brasil pratica o que mais sabe fazer: teatro. Na trama das sete da Globo, o dramaturgo não consegue se desvencilhar da dramaticidade do texto esculpido para os palcos. Com capítulos repletos de frases rebuscadas, erroneamente distantes da coloquialidade exigida pela tevê, o autor peca pelo excesso de diálogos metafóricos em um horário onde é necessário atrair a atenção do público. E o que mais dispersa quem está chegando em casa ou preparando o jantar é uma obra que necessita de muita atenção para ser entendida e assimilada. Na contramão de fazer uma novela popular, o autor ainda insere na história personagens absolutamente farsescos. Quase todos acima do tom em suas composições, o que os aproxima ainda mais dos papéis escritos para os palcos, o figurino de cada personagem também beira o exagero e parece não deixar dúvidas quanto à teatralidade da trama. Com uma luz dramática e em tons quentes, as cenas são conduzidas no mesmo clima pelo diretor José Luiz Villamarim. Desde as marcações teatrais em cena, até os excessivos gestuais dos atores parecem querer atingir quem está na última poltrona do teatro. Diante da crescente compra de enormes televisores de LCD, parte do público pode se sentir na primeira fila do palco das sete. Dentre os pontos mais altos da produção, estão atuações convincentes e viscerais, como da exdançarina Hélia, interpretada por Eliane Giardini. Com a dose certa de emoção em cenas passionais, a conturbada relação da personagem com Leal, de Antônio Fagundes, chega a emocionar e consegue, nesses momentos, mostrar uma das poucas facetas humanizadas da história. Já Grazi Massafera e Guilherme Weber, como Deodora e Albano, também surpreendem na trama, mas em atuações absolutamente diferentes, recheadas de recursos de personagens de “cartoon” e vilões de “Sessão da tarde”. Como a vilã Deodora, sempre paramentada com justas roupas negras e cara de mulher fatal, Grazi tem surpreendido pela atuação correta e uma composição à altura da importância de sua personagem na história. Nesses dois primeiros meses no ar, o que mais tem surpreendido em “Tempos modernos”, além da história ágil e de personagens fora do padrão, é a visível intenção do autor em ir na contramão do naturalismo. Em vez de humanizar seus personagens, o autor parece, a cada capítulo, fazer com que cada papel na história fuja na direção contrária da verossimilhança. O resultado dessa intenção não se reflete em bons números na produção, que capenga com ralos 17 pontos de média. Talvez os tempos antigos valham mais à pena.