Ao menos 450 alunos, entre crianças e adolescentes índios estão sem aulas desde o início dos conflitos envolvendo indígenas e fazendeiros na região de Antônio João, cidade sul-mato-grossense, na fronteira com o Paraguai. Com a escola fechada dentro da aldeia e sem ônibus para transportá-los até a cidade, restaram aos estudantes guarani-caiuás, com idades de até cinco anos de idade, juntarem-se aos adultos e equiparem-se com flechas, feitos guerreiros.
Índios e fazendeiros travam há 11 dias um duelo pelo domínio de fazendas que teriam sido declaradas território indígena, em 2005, pelo ex-presidente Lula, mas a medida fora contestada judicialmente pelos ruralistas. No sábado à tarde, um índio foi morto baleado na cabeça.
A reportagem do Correio do Estado notou que no dia mais delicado do confronto, anteontem, crianças corriam e espalhavam-se pela mata com os adultos, assim que viram camionetes indo para as fazendas que haviam sido invadidas dias atrás.
Um garotinho pequeno, segurava uma flecha, provavelmente feita por ele mesmo, com gravetos. Outro maior, com aparência de dez anos de idade, vestido com uniforme escolar, também agitava-se com uma flecha.
Sábado, anteontem, os ruralistas que ocupavam ao menos 40 camionetes, entraram dentro de duas fazendas invadidas, a Barra e a Fronteira. Quando perceberam os fazendeiros, os índios recuaram. Policiais foram para o local depois que um índio já havia morrido com tiro no rosto. Para a polícia, ainda não se sabe de onde partiu o tiro que matou o guarani.
Além da morte do índio Simeão Vilhalva, outro índio de 27 anos foi levado para o hospital com ferimento na cabeça. Uma mulher e uma criança de um ano de idade foram feridas com balas de borracha.
SEM AULAS, SEM COMIDA
Somente na aldeia Campestre, 7,5 quilômetros da área urbana de Antônio João, cidade distante 400 de Campo Grande, cursam o ensino infantil, fundamental e educação indígena, ao menos 370 índios na Escola Municipal M’bo Eroy Tupã I Arandu Renoi, fechada desde o dia 21, data do início das ocupações das fazendas. Os índios guarani ocuparam sete áreas que seriam deles, mas duas delas já foram retomadas pelos fazendeiros.
A reportagem tentou entrar na aldeia Campestre, onde fica a escola, mas não foi autorizada pelos líderes da comunidade. Sem aulas, as famílias das crianças índias estariam com dificuldades de alimentar os filhos, pois eles dependem da merenda escolar. A comunidade recebem o Bolsa Família, programa do governo federal que paga a elas parcela mensal de até R$ 175.
Além dos cerca de 370 alunos da M’bo Eroy, outros 80 alunos que cursam o ensino médio e o Educação de Jovens e Adultos, o EJA, precisam transporte escolar até as escolas de Antônio João. Ocorre que os veículos não têm circulado durante os conflitos.
Alunos índios estudam nas escolas estaduais Pantaleão Coelho Xavier, Aral Moreira e ainda na escola municipal Maicka Sanabria Pinheiro.
A diretora da escola Aral Moreira, Selzanet Ramirez, onde ao menos dez índios estudam à noite, disse que além do risco de os alunos reprovarem por faltas, há uma perda maior a eles. “Reprovar pela falta é mais difícil, mas eles vão ficar com defasagem no aprendizado”, disse a diretora.