Mais de 13 milhões de brasileiros sem privada. Parece engraçado, mas não é. Enquanto o País alcança o status de sétima maior economia do mundo, permanece com o 9º pior sistema de saneamento do planeta. Hoje, o Brasil investe em média R$ 6 bilhões por ano em saneamento e, se continuar nesse ritmo, só alcançará a universalização do serviço daqui a longínquos 60 anos.
Que para cada R$ 1 investido em saneamento se economizam R$ 4 em saúde, você já deve saber. O que talvez você não saiba é que, só em 2009, o País amargou um prejuízo de aproximadamente R$ 240 milhões por conta de doenças transmitidas pelo esgoto. “Cerca de 217 mil trabalhadores se afastaram do trabalho, durante aquele ano, para se tratar ou tratar dos filhos, vítimas da falta de saneamento. Isso significou mais de 3,6 milhões de horas pagas e não trabalhadas”, calcula o engenheiro químico Édison Carlos, presidente-executivo do Instituto Trata Brasil, organização, que trabalha para que o País possa atingir a universalização do acesso à coleta e ao tratamento de esgoto.
De acordo com Édison, a situação chegou a esse ponto graças à absoluta falta de prioridade política que o assunto teve nos últimos 20 anos, criando um vácuo no Governo federal quanto à responsabilidade pelo saneamento, sem falar na burocracia para investimentos no setor e a despreocupação com a agilidade na aplicação dos recursos. “Somente com a criação do Ministério das Cidades e da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental é que passamos a ter um endereço para falarmos sobre o assunto no governo”, pondera.
Os Programas de Aceleração do Crescimento (PACs) 1 e 2 trouxeram um pouco de esperança para o setor. Mas estão devagar, quase parando. Dos R$ 40 bilhões previstos no PAC 1, menos da metade foi executada. Já o PAC 2, que prevê mais R$ 21,2 bilhões, sequer saiu do lugar.
O Trata Brasil faz um levantamento sobre o PAC 1 e descobriu que, das 101 obras de saneamento realizadas em municípios que têm mais de 500 mil habitantes, apenas 3% foram concluídas. Muito diferente do discurso do Governo federal de que 60% estariam prontas até o final de 2010.
Fato é que os investimentos precisam aumentar e o processo precisa ser desburocratizado, do projeto até a obra. “Seriam necessários R$ 270 bilhões para levar o serviço ao País todo. Se falamos em universalizar os serviços em 20 anos, que eu acho um bom prazo, seria necessário um investimento entre R$ 13 e 15 bilhões por ano”, alerta Édison. Número bem superior aos R$ 6 bilhões investidos hoje.
Copa “verde”
Reiterando: o Brasil ocupa o 9º lugar no “ranking mundial da vergonha”, ao lado de países como Etiópia e Nepal, com 13 milhões de habitantes sem acesso a banheiroS. Será que ele está pronto para realizar uma “Copa Verde” em 2014, como os governantes gostam de alardear?
Para Édison, isso não é possível. “Das 12 regiões das cidades-sede, algumas até têm a metrópole atendida por redes de esgoto, mas as periferias, as regiões metropolitanas, não estão. A cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, conta com um serviço razoavelmente bom de coleta e tratamento de esgoto, só que a baía de Guanabara recebe os efluentes de todos as cidades da baixada fluminense”, exemplifica.
As cidades-sede precisam perceber que se trata de uma oportunidade única de receber investimentos e aplicá-los em projetos de saneamento. Senão, corre-se o risco de ter estádios belíssimos, de primeiro mundo, e o turista sair do estádio e pisar no esgoto. “A Copa do Mundo deveria deixar como legado a melhoria da saúde da população, tão importante quanto portos, aeroportos e estádios, é o problema dos esgotos. Eu acho muito difícil que a Copa seja “Verde” se você não olhar todos os aspectos da sustentabilidade. Se a Copa realmente quer ser sustentável, como o termo realmente significa, esgoto deveria ser o primeiro ponto a ser tratado”, reitera o engenheiro.