Nesta quinta-feira, agentes da Polícia Federal vistoriaram endereços ligados a Francisco em sua cidade natal, em Rio do Sul, SC
Em Rio do Sul, uma cidade do interior de Santa Catarina com pouco mais de 70 mil habitantes, o homem que levou artefatos explosivos para a praça dos Três Poderes era chamado apenas de "França" e não era visto pelos vizinhos e conhecidos há pelo menos dois meses.
França tinha decidido trabalhar com um dos seus filhos em Barra Velha (SC), em um negócio envolvendo consertos de elevadores, e não foi visto mais na vizinhança, hoje atônita com o atentado em Brasília.
Francisco Wanderlei Luiz, o França, era visto pelos colegas como "boa gente" e integrante de uma família bastante conhecida na cidade e envolvida com comércio.
Um dos irmãos tem uma loja tradicional de instrumentos musicais no centro sua filha, a sobrinha de França, abriu uma imobiliária. Nesta quinta-feira (14), a loja do irmão amanheceu fechada, ao contrário de todo o comércio da região.
França era chaveiro, mas também já foi dono de discoteca, negócio que fechou na esteira de problemas como brigas entre frequentadores e PM constantemente acionada.
Mas França era visto como uma "pessoa tranquila e disposta a ajudar", na descrição de Lourdes Fernandes, 62, uma das funcionárias de um restaurante onde ele costumava almoçar. "Era uma pessoa normal para nós. Ele aparentava ser gente boa. Oferecia ajuda, auxiliava. E a família dele toda é assim", diz.
Colegas mais próximos não entenderam o atentado em Brasília e nem sabiam que França transitava pela capital do país. Também não davam atenção para conversas sobre política.
"Eu nem me lembrava mais que ele tinha sido candidato", diz Valdir Farias, 59, comerciante. "Ele até falava de política, mas a gente dava pouca brecha para este assunto. Como a gente tem comércio, era melhor não dar espaço", revela.
Farias conhecia França "das antigas, da discoteca". "Temos a mesma idade. Ele era simpático, todo mundo se dava com ele. Não sei como ele foi fazer um troço deste. Estamos em choque", afirma.
Farias tem uma loja de carros próxima ao último endereço de França na cidade, no bairro Budag, uma região que sofreu com as enchentes no final de 2023. "Ele ficou meio desnorteado na época, meio triste, deu uma depressão. Meu negócio aqui também ficou embaixo d'água", lembra.
Outro colega, o jardineiro Fernando Santos de Souza, 57, conta que às vezes França "falava por aí em salvar a pátria". "Mas não tinha conversa de política, era uma pessoa calma", diz.
"Uma pessoa do bem, na dele, nunca desaforou nem humilhou ninguém. Eu não sei o que deu nele", afirma o jardineiro.
França foi candidato a vereador pelo PL em 2020, mas conseguiu menos de cem votos nas urnas e não foi eleito. Em 2024, não se candidatou novamente.
Presidente do PL do Rio do Sul desde junho de 2023, Milton Goetten de Lima disse à reportagem que não conhecia França. "Sei que a família dele é boa, conhecida na cidade. Mas não tenho nenhuma informação a mais, que eu possa acrescentar", diz.
O candidato do PL à Prefeitura do Rio do Sul, Manoel, venceu nas urnas de outubro.
Camila Regiane Santos, 30, que trabalha com redes sociais, afirma que "a grande maioria aqui é de direita, mas é um povo pacífico". "Ser de direita, e ser de direita e fazer o que ele fez, é uma diferença muito grande. Foi uma surpresa para todo mundo", conta ela.
Nas eleições de 2022, Jair Bolsonaro (PL) foi o candidato mais votado na cidade, no segundo turno da disputa contra Lula (PT) para a presidência da República. Bolsonaro recebeu 76,5% dos votos válidos, contra 23,5% do petista.
Moradores observam com apreensão os desdobramentos do episódio em Brasília. Temem que a cidade seja associada a terroristas.
"Hoje [14, quinta-feira] de manhã estava um alvoroço porque a Polícia Federal estava aqui. E isso não é comum. Aqui é uma cidade sem assalto, a gente deixa as portas das casas abertas", afirma Camila.
"Dá um medo. A gente não sabe mesmo quem é seu vizinho", acrescenta.
A Polícia Federal esteve em endereços ligados ao autor do atentado na parte da manhã desta quinta.
Um dos locais foi um terreno no bairro Budaq, onde há duas construções simples e aparentemente abandonadas. Uma pequena bandeira do Brasil colada em uma das paredes externas está entre os vestígios. Também estão presentes os paineis apontando que ali havia um chaveiro.
Na parte da manhã, a ex-companheira de França estava no local. Ela disse à PF que os planos de França incluíam matar o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). A reportagem, que esteve no endereço à tarde, não encontrou a mulher.
Os vizinhos relatam que ela teria voltado para o endereço depois que França seguiu para Barra Velha, mas que não possuem contato com ela. Também relatam que França teria cortado a rede elétrica do imóvel, para que ele não fosse usado, mas o contexto não é claro.
Colegas de França também contam que ele teria dois filhos com a primeira esposa além do filho em Barra Velha, também uma filha que moraria em outro país. Ele teria também um enteado, um adolescente que o ajudava no comércio de chaves e que seria filho da mulher encontrada no endereço em Budaq.
A reportagem tentou falar com os filhos nesta quinta, mas não teve respostas.
Antes do atentado, França publicou nas redes sociais referências a bombas e explosões e disse que a Polícia Federal teria que desarmar o equipamento.
"Vamos jogar??? Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas de merda", disse ele, em capturas de tela de celular publicadas em sua página no Facebook.
(Informações da Folhapress)