O acordo judicial assinado por vários representantes do poder público no fim do mês passado, que mudou os critérios de ocupação, preservação e desmatamento do Parque dos Poderes, deverá ser referendado por lei estadual, cujo projeto de lei será enviado pelo governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel (PSDB), até o fim deste ano. A intenção é preservar o cinturão verde que atualmente cerca o complexo administrativo estadual e manter o local sem conexão direta com bairros vizinhos e blindado dos novos empreendimentos imobiliários.
A nova lei que Riedel enviará deverá substituir a Lei nº 5.237/2018, que trata da ocupação do Parque dos Poderes e foi sancionada pelo antecessor dele, Reinaldo Azambuja. A necessidade de uma nova legislação foi mencionada no acordo firmado entre representantes dos poderes Executivo e Judiciário, do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul (MPMS) e da Defensoria Pública.
O Correio do Estado apurou que a redação do acordo e a elaboração de uma nova lei (prevista no mesmo acordo) foram a saída encontrada pelas autoridades estaduais para garantir a preservação do Parque dos Poderes sem ter de submetê-lo a um tombamento pelo patrimônio histórico.
A própria ação civil pública a que o acordo põe fim e da qual o Ministério Público já vinha se saindo vitorioso já pedia o tombamento do Parque dos Poderes.
No primeiro semestre deste ano, a vereadora Luiza Ribeiro (PT) chegou a ir mais além, solicitando o tombamento não apenas do Parque dos Poderes, mas também do Parque das Nações Indígenas e ainda do Parque Estadual do Prosa, o qual é uma reserva natural que independentemente de qualquer tombamento já tem a sua preservação garantida.
A nova lei atenderá ao pleito do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS), que é construir uma nova sede, e faz com que o governo do Estado abra mão de áreas afetadas que ele tem o direito de usar (e que atualmente são ocupadas por matas) para garantir a preservação delas.
O cinturão verde abrange uma área contígua, que separa o Parque dos Poderes do Jardim Veraneio e que era reservada para a construção de uma sede para a Procuradoria-Geral do Estado de Mato Grosso do Sul (PGE-MS), para a Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz) e para o Batalhão de Choque. Essa área, de aproximadamente 11 hectares, ficará intacta, conforme os termos do acordo e da lei que será redigida em breve.
Em troca, o governo recebe o direito de desmatar oito pequenos quadrados, os quais somam em torno de 2 hectares, para a ampliação dos estacionamentos atrás das secretarias.
A construção dos novos estacionamentos, porém, ainda não é um projeto consolidado, há várias alternativas mais sustentáveis em estudo, como a construção de anexos administrativos em áreas adjacentes ao Parque dos Poderes ou mesmo a construção de edifícios verticais para estacionamento, para se preservar o máximo possível de mata na região.

“Trata-se de um acordo importante, que cria um cinturão verde, corredores de passagem para a fauna, e ainda protege as características pelas quais o Parque dos Poderes é conhecido”, explica o procurador-geral de Justiça, Alexandre Magno Benites de Lacerda, um dos signatários do acordo.
Além de Alexandre Magno, o acordo, ainda passível de homologação pelo Poder Judiciário, também tem como signatários de Justiça Luiz Antônio Freitas de Almeida, que propôs a ação civil pública que deu origem ao processo; a secretária de Estado de Administração, Ana Carolina Araújo Nardes; o presidente do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), André Borges Barros de Araújo; a procuradora-geral do Estado, Ana Carolina Ali Garcia; o procurador-geral-adjunto do Estado do Contencioso, Márcio André Batista de Arruda; o presidente do TJMS, Sérgio Fernandes Martins; e o defensor público-geral de Mato Grosso do Sul, Pedro Paulo Gasparini.
A NOVA LEI
O acordo assinado no mês passado, que será homologado em breve e que obriga o Poder Executivo a redigir nova lei para a ocupação do Parque dos Poderes, aumenta a área de preservação obrigatória em relação à lei de 2018 que está vigente, assinada pelo antecessor de Eduardo Riedel, Reinaldo Azambuja (PSDB).
A legislação atual prevê a proteção de 164,61 hectares de área nativa no Parque dos Poderes. A inclusão do cinturão verde – que abrange as áreas reservadas à PGE e ao Batalhão de Choque e duas áreas destinadas a pretensões futuras do Executivo, em troca das áreas liberadas para o Tribunal de Justiça, e para estacionamento nas adjacências das secretarias – eleva o total de área preservada no parque para 175,66 hectares de mata nativa.
Atualmente, segundo levantamento do Ministério Público, o Parque dos Poderes tem 243 hectares de área total, dos quais aproximadamente 185 hectares são cobertos de mata nativa e outros 57,9 hectares já estão antropizados (ocupados pelo homem, seja na forma de construções, seja desmatados).
O acordo que será transformado em lei ainda libera 19 hectares para serem ocupados pelo poder público. Apesar dessa permissão, existem áreas que dificilmente o Poder Executivo fará uso do seu direito no médio prazo. É o caso de duas áreas reservadas ao governo, de 15 mil m² cada uma, e de outra área, de 37 mil m², reservada para a construção de um futuro Palácio do Governo. Também há áreas afetadas à Defensoria Pública e à sede da Prefeitura do Parque, que também não há planos para a construção delas.
A única área que certamente será ocupada será um terreno afetado ao Tribunal de Justiça e outro que pertencia ao Corpo de Bombeiros e que foi transferido ao Tribunal de Justiça que, contíguos, formam uma área de 67 mil m². A área, porém, está parcialmente antropizada (nela funciona stand de tiros das forças especiais da Polícia Militar), e todo o desmatamento que ocorrer nela o TJ se compromete a reflorestar área vizinha ao Parque dos Poderes, no Município de Campo Grande.
SEM CLÁUSULA PENAL
Perguntado sobre a falta de cláusula penal no acordo, o procurador-geral de Justiça, Alexandre Magno Benites de Lacerda, explicou que uma cláusula que impusesse multa ao próprio Poder Executivo em caso de descumprimento dos termos do acordo poderia ser inócua. “Cobra-se um valor, que vai para um fundo, mas que há o prazo de um ano para se elaborar um projeto para esse valor, caso contrário, o recurso volta para o próprio governo”, explica. “Cláusulas penais em acordos ambientais são muito eficazes quando entes particulares estão envolvidos”, comenta.
Além disso, o PGJ ressalta que o compromisso do governo do Estado de criar uma lei que legitimará a criação de um cinturão verde no Parque dos Poderes e que não permitirá qualquer outro tipo de desmatamento além do acordado recentemente é um ganho muito maior do que qualquer cláusula penal.
“Bairros vizinhos ao Parque dos Poderes estão em franco desenvolvimento, e a tendência é de que eles avancem rumo ao parque nos próximos anos. Esse acordo e essa futura lei garantem a preservação do parque e ainda dão ao governo flexibilidade para fazer a manutenção de sua estrutura administrativa sem a burocracia de um tombamento”, explica.



Carro ficou completamente destruído. Foto: divulgação


