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Caso do Banco Master: a responsabilidade dos distribuidores na venda do risco

Oferta de CDBs de bancos médios foi massificada com um discurso sedutor, que prometia taxas elevadas combinadas à suposta segurança conferida pelo Fundo Garantidor de Créditos

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A liquidação do Banco Master expõe uma responsabilidade que vai muito além dos gestores da instituição. Ela coloca sob os holofotes o papel dos distribuidores – plataformas, corretoras e agentes autônomos – que intermediaram a venda de seus produtos ao investidor de varejo.

Nos últimos anos, a oferta de CDBs de bancos médios foi massificada com um discurso sedutor, que prometia taxas elevadas combinadas à suposta segurança conferida pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC). O problema é que essa narrativa muitas vezes ignorou, ou deliberadamente minimizou, os riscos reais envolvidos.

Do ponto de vista jurídico, a atuação desses intermediários será examinada sob aspectos cruciais. O primeiro é o dever de informação.

A comercialização de um produto de risco acompanhada de frases como “100% garantido” ou “tão seguro quanto um bancão”, sem esclarecer de forma clara que a proteção do FGC é limitada a R$ 250 mil por CPF e que qualquer valor excedente está integralmente sujeito ao risco de insolvência do emissor, constitui falha grave de transparência.

Soma-se a isso a análise de suitability (adequação ao perfil do investidor): é legítimo questionar se a recomendação para que investidores conservadores concentrassem parcelas relevantes de seu patrimônio em um único ativo mais arriscado respeitou seus perfis, ou se foi motivada pela busca de comissões.

O cenário se torna ainda mais sensível diante das investigações que apontam para possível fraude com ativos financeiros, tipificada no artigo 171-A do Código Penal, envolvendo a emissão de títulos sem lastro para inflar artificialmente o balanço do banco.

Esse contexto eleva substancialmente o dever de diligência dos distribuidores. Não é admissível alegar desconhecimento quando havia sinais de irregularidades estruturais.

Nesses casos, sua conduta pode gerar responsabilização não apenas cível, mas também penal.

Para os investidores com valores acima do limite do FGC, a responsabilização dos distribuidores representa um caminho adicional, e mais concreto, para a recuperação das perdas, especialmente diante da incerteza e da morosidade inerentes ao processo de liquidação.

O reconhecimento da fraude coloca o investidor na posição de vítima, amparado tanto pela Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro quanto pelo Código Penal.

O caso do Master, portanto, não é um episódio isolado. Ele expõe a fragilidade de um modelo de distribuição que, ao priorizar a taxa mais alta como argumento de venda, pode ter negligenciado seu dever fundamental de cuidado.

Para preservar a integridade do mercado e proteger o investidor, é imprescindível que a responsabilidade seja estendida a todos os elos da cadeia. Afinal, o investidor é um sujeito de direitos, não um mero canal de captação de recursos.

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Trump e Maduro: uma questão de legitimidade

O campo para debate a respeito da conduta das duas figuras políticas é fértil e tende a ativar muitas paixões

05/12/2025 07h45

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O tensionamento da relação entre Estados Unidos e Venezuela nos últimos tempos tem produzido uma série de reflexões sobre os motivos (reais ou alegados) acerca de tal panorama e o impacto que a disputa pode produzir no Brasil em termos geopolíticos, dado o posicionamento do governo federal atual sobre a situação e, especificamente, sobre os mandatários Donald Trump e Nicolás Maduro. Em última análise, a questão diz respeito ao conceito de legitimidade, ponto que merece alguma discussão.

A noção de que algo é legítimo se refere ao fato de que uma determinada situação está de acordo com o direito ou com a concepção social de justiça, ou seja, além da mera aferição formal de legalidade. Assim sendo, o campo para debate a respeito da conduta das duas figuras políticas é fértil e tende a ativar muitas paixões.

Primeiramente, há que se verificar a legitimidade do mandato presidencial de Maduro para, na sequência, refletir acerca da legitimidade da ação de Trump em relação à Venezuela. Ainda que sejam assuntos teoricamente independentes, parece difícil negar a vinculação existente entre os assuntos, com maior ou menor relevância, a depender da ótica do analista.

A eleição presidencial na Venezuela, ocorrida em 2024, colocou diante de Nicolás Maduro a oposicionista María Corina Machado, que foi impedida de concorrer, sendo substituída por Edmundo González Urrutia como figura principal de contraponto ao presidente durante o pleito.

Sob acusação da oposição e de observadores internacionais de falta de clareza na contagem de votos, não houve o reconhecimento da vitória de Maduro, que está no cargo desde 2012, primeiro interinamente (em substituição a Hugo Chávez) e, depois, por meio de eleições, realizadas em 2013 e 2018, mas a última vitória também havia sido objeto de muita discussão em decorrência da suspeita de fraude.

Nos últimos meses, sob o argumento de combate ao tráfico de drogas na América Latina, o governo norte-americano tem aumentado a pressão sobre maduro, alegando que ele teria ligação com o Cartel de los Soles, inclusive estabelecendo uma recompensa de US$ 50 milhões por informações aptas a levar à captura do atual presidente venezuelano.

A chegada do gigantesco porta-aviões USS Gerald Ford à região do Mar do Caribe reforçou a tensão e a possibilidade de que uma atitude mais drástica possa ocorrer a qualquer momento. A caracterização de grupos criminosos ligados ao narcotráfico como terroristas, responsáveis por efeitos nocivos no território norte-americano, é utilizada como argumento por Trump para justificar a ação mais incisiva.

O Brasil, como principal potência regional da América do Sul, é claramente agente interessado no desenrolar dos fatos, pois o conflito envolve a nação mais forte militar, política, cultural e economicamente do mundo e um país fronteiriço.

A grande questão é que está se aproximando, cada vez mais, o momento em que o posicionamento brasileiro pode trazer consequências concretas mais efetivas ao País, do ponto de vista político e econômico, muito além da questão da ampliação das tarifas.

A legitimidade de Maduro e Trump com relação a suas ações é pressuposto inafastável para a consideração desse complexo contexto internacional. O Brasil não pode se furtar a tomar uma posição em relação a isso em algum momento, pois muitos dos agentes envolvidos têm ligação com o País, seja historicamente ou por meio de organismos internacionais.

Ainda que, algumas vezes, certas figuras influentes politicamente queiram passar a falsa impressão de que determinadas situações complexas possam ser resolvidas de modo simples, com uma conversa, é evidente que o caso envolvendo Trump e Maduro pode ter implicações muito sérias para a sociedade brasileira, dado o problema nacional envolvendo o narcotráfico.

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Nova lei da prisão preventiva: entre a eficiência processual e a garantia individual

Inovação mais sensível está na positivação de critérios objetivos que orientam a conversão do flagrante em prisão preventiva na audiência de custódia

05/12/2025 07h30

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A sanção da Lei nº 15.272, em 26 de novembro de 2025, representa um marco na evolução do processo penal brasileiro e inaugura uma fase de pragmatismo legislativo na gestão da segregação cautelar.

Ao alterar dispositivos estruturais do Código de Processo Penal, notadamente os artigos 310 e 312, o legislador tenta resolver uma tensão histórica: conferir objetividade aos critérios de prisão preventiva sem ignorar a necessidade de contenção da criminalidade reiterada.

Trata-se de uma reengenharia dos requisitos do periculum libertatis, que exige dos operadores do direito uma leitura menos automática e mais conectada à realidade social do risco apresentado pelo custodiado.

A inovação mais sensível está na positivação de critérios objetivos que orientam a conversão do flagrante em prisão preventiva na audiência de custódia. O novo § 5º do artigo 310 retira o magistrado de uma zona de conforto subjetiva, impondo um roteiro de análise vinculado à reiteração delitiva e à gravidade concreta da conduta.

Ao prever que a prática de crimes durante a tramitação de inquéritos ou ações penais, bem como a reincidência específica após liberação anterior, são vetores para o encarceramento, o dispositivo desafia diretamente a jurisprudência consolidada, especialmente a Súmula nº 444 do STJ.

A opção legislativa é clara: priorizar a tutela da ordem pública em uma dimensão de proteção imediata, mitigando, ainda que de forma excepcional e cautelar, a rigidez absoluta do princípio da não-culpabilidade para interromper ciclos criminais habituais.

A reforma também aprimora o conceito de periculosidade no artigo 312 ao afastar, de modo definitivo, a fundamentação baseada na gravidade abstrata do delito. A exigência de demonstração concreta do modus operandi, da participação em organização criminosa ou da natureza lesiva dos materiais apreendidos – como o potencial ofensivo de armamentos ou a variedade de entorpecentes – eleva o padrão de motivação judicial.

O movimento é ambivalente: de um lado, fornece instrumentos legais para manter presos indivíduos de comprovada periculosidade; de outro, protege o sistema contra a prisionização automática e baseada apenas na tipificação penal, exigindo risco real e individualizado à ordem pública.

No eixo da produção de prova e da inteligência investigativa, a criação do artigo 310-A moderniza o aparato estatal ao tornar obrigatório o requerimento de coleta de material biológico para identificação genética em casos de crimes violentos, sexuais ou praticados por organizações criminosas armadas.

A medida alinha o Brasil a práticas internacionais contemporâneas, afastando impasses doutrinários sobre autoincriminação em nome da precisão científica e da resolução de cold cases.

A tecnologia passa a compor a cadeia de custódia desde a prisão, fortalecendo o lastro probatório e reduzindo a margem de erro, tanto para condenações injustas quanto para absolvições decorrentes de falta de materialidade.

Assim, a Lei nº 15.272/2025 não deve ser lida sob a ótica simplificadora do punitivismo, mas como uma tentativa de racionalizar o sistema de justiça criminal. O texto legal entrega ao juiz de garantias e ao juiz da instrução parâmetros claros para justificar a medida extrema da privação de liberdade, restringindo o voluntarismo judicial.

A aplicação prática, contudo, especialmente no tocante à valoração de inquéritos em andamento como indicativo de risco, inevitavelmente estimulará debates constitucionais intensos.

Caberá às Cortes Superiores modular esses dispositivos, garantindo que a busca por eficiência e segurança pública não sufoque as garantias fundamentais que estruturam o Estado democrático de direito.

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