Ao dar preferência à repressão em detrimento da prevenção e da ostensividade, a Polícia Militar e outras forças com o mesmo dever assumem ônus de chegarem atrasadas sempre
Nesta semana, a população do Jardim Carioca, em Campo Grande, reviveu alguns dias similares aos de décadas passadas, em se tratando de segurança pública. Nos últimos quatro dias, a sensação de liberdade dos criminosos no bairro certamente aumentou. Mas o trabalho de policiamento ostensivo e preventivo nesta região da cidade não foi espontâneo ou planejado pela Polícia Militar.
As rondas constantes, que ocorrem desde terça-feira (20), foram motivadas por três ataques seguidos. No último deles, uma idosa foi covardemente esfaqueada e, felizmente e milagrosamente, sobreviveu ao atentado. A população do bairro, como era de se esperar, ficou com medo, muito medo.
A Polícia Civil prometeu investigar o agressor, que aparentemente age em série, enquanto a Polícia Militar começou a fazer no bairro o que deveria ser feito todos os dias: o policiamento ostensivo e preventivo. Tudo isso só ocorreu, porém, depois que a imprensa foi ao local, este veículo de comunicação inclusive, para ouvir a população e verificar de perto a situação.
O caso do Jardim Carioca, que por uma coincidência infeliz traz à tona a realidade de insegurança similar à da cidade que dá origem ao bairro, o Rio de Janeiro, também denota uma triste mudança de perfil da Polícia Militar. A instituição, que tem por dever de ofício atuar de forma preventiva, ostensiva e repressiva, infelizmente abandonou a primeira, atua muito raramente na segunda e concentrou seu foco na terceira.
O leitor que tiver menos de 30 anos de idade pode perguntar a algum amigo ou familiar mais experiente se antigamente havia mais policiais nas ruas e se a abordagem era mais amigável. Todos eles dirão que sim.
Nos dias atuais, os poucos policiais que ainda estão nas ruas – vale ressaltar que os quartéis, batalhões e repartições públicas estão cheios – dão preferência à atuação repressiva. Enquanto as rondas são reduzidas, os confrontos com quem pratica os crimes aumentam. E esses confrontos ocorrem não somente por única e exclusiva iniciativa dos criminosos. Se houvesse prevenção e repressão, certamente muitos roubos – que terminam de forma violenta, seja para bandidos, seja para as vítimas ou para os próprios policiais – nem ocorreriam.
Ao dar preferência à repressão em detrimento da prevenção e da ostensividade, a Polícia Militar e outras forças com o mesmo dever assumem ônus de chegarem atrasadas sempre. Nossos avós já diziam que prevenir é melhor do que remediar. Além disso, quem chega atrasado pode cometer injustiças mais facilmente ou não fazer o trabalho com perfeição. Ações planejadas em segurança são sempre mais seguras, mais eficientes e menos violentas. Há menos efeitos colaterais aos que cumprem a lei.
Já citamos aqui um pouco da sabedoria dos nossos antepassados. Talvez fosse o momento de os policiais perguntarem aos seus veteranos como era o contato com a comunidade nos tempos de outrora. Certamente, eles falarão que não existia o clima beligerante, em que o cidadão é tratado com mais desconfiança do que confiança, como é hoje em dia.